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Bafômetro como exame de rotina na minha empresa, é permitido?

24 out 2014 às 10:55
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Há apenas alguns anos, ficou famosa – até mesmo nos meios de comunicação em massa – a discussão jurídica acerca do dever, ou não, de se realizar teste de bafômetro quando o motorista for abordado pelos oficiais de trânsito ou polícia rodoviária. Eram os tempos da "lei seca", e muitas matérias foram lançadas nos jornais e na televisão debatendo sobre o tema.

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Foi então que a notória tese do "ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo", advinda do direito estadunidense, passou a figurar no imaginário coletivo. E hoje, todo cidadão sabe que é legítimo se recusar a fazer o teste quando solicitado pela autoridade policial, cabendo à ela se utilizar de outros meios de prova para comprovar a embriaguez iminente.

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O mesmo, felizmente, não se aplica às empresas que desejem estabelecer uma rotina de testes etílicos em seus empregados. Obviamente, o empregador não pode forçar o seu empregado a realizar o teste, mas sem dúvida há um dever do empregado de realizá-lo.

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É que no âmbito do Direito do Trabalho, e ao contrário da hipótese do crime de trânsito, estamos tratando de relações privadas entre um empresário e seus trabalhadores, onde há grande liberdade para se deliberar sobre a contratação ou demissão de alguém de acordo com seu comportamento social. Portanto, eventual recusa do empregado em realizar o exame autoriza, sim, a sua demissão sumária por justa causa.


Em verdade, a realização de exames médicos é mais do que possível; é recomendável. Enquanto trabalha, o empregado e o empregador são a mesma pessoa perante terceiros. O patrão é efetivamente responsável por todos os atos do empregado durante a realização de seus serviços. Se o trabalhador está embriagado ou não, isso pouco importa para fins de reparação de danos a terceiro.

Ou seja, no contexto moderno, a empresa não só possui responsabilidade perante si mesma e seus trabalhadores, mas também perante a sociedade em geral, seja em qual campo estivermos tratando: questões civis, ambientais, econômicas, etc.

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Isso se aplica especialmente aos motoristas profissionais. O Brasil é o 4º país no mundo em número de mortes em acidente de trânsito . E os caminhões são um dos maiores responsáveis por esse triste dado, notadamente por dois motivos. A uma, porque a logística brasileira se baseia primordialmente na malha rodoviária. A duas, porque é elevadíssimo o número de motoristas profissionais que dirigem embriagados ou sob o efeito de entorpecentes.


Atenta a tais particularidades de nosso país, a Justiça brasileira, após a provocação de trabalhadores, autorizou a realização do teste etílico em empregados das companhias, seja na sua admissão ou como exame de rotina. O grande precedente a autorizar a prática adveio do Tribunal Superior do Trabalho , Corte máxima em julgamentos sobre essa matéria, já no ano de 2008.

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Para corroborar o entendimento, e mais uma vez retornando ao exemplo clássico dos motoristas, veio a Lei nº 12.619/2012 a acrescentar o art. 235-B à Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). O dispositivo em questão estabelece os deveres dos motoristas profissionais, sendo que, por meio dessa nova lei, devem eles "submeter-se a teste e a programa de controle de uso de droga e de bebida alcoólica, instituído pelo empregador, com ampla ciência do empregado" (inciso VII).


Atente-se à redação do Parágrafo Único do artigo dessa lei. Segundo ele, "a inobservância do disposto no inciso VI e a recusa do empregado em submeter-se ao teste e ao programa de controle de uso de droga e de bebida alcoólica previstos no inciso VII serão consideradas infração disciplinar, passível de penalização nos termos da lei". Ora, uma das penalizações possíveis é, justamente, a demissão por justa causa.

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Há limitações, todavia, para a aplicação do teste de bafômetro. Todas pautadas em alguns princípios queridos ao Direito do Trabalho, como a informação, publicidade e proteção ao empregado.


A primeira delas reside em qual é a real necessidade de se aplicar o exame de acordo com a natureza dos serviços desempenhados pelo empregado. Isso porque, por ser um exame invasivo (no sentido de se coletar material biológico de outrem), deve haver uma justificativa plausível para seu uso, isto é, o trabalho realizado deve conter algum risco iminente à empresa, à segurança dos empregados e/ou à coletividade, que proíba o trabalho sob efeitos de álcool.

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É o caso, claro, dos motoristas profissionais, até mesmo como autoriza a própria CLT. Não é o caso da maioria dos trabalhadores regulares, como em serviços de escritório, por exemplo. Afinal, uma pequena alteração no resultado para eles (geralmente resultado de alguns copos de cerveja na noite anterior) jamais representaria qualquer risco à empresa.


Outro importante aspecto é a vedação à discricionariedade. Caso se exija a realização do bafômetro, o exame deve ser feito de forma generalizada, isto é, de forma que todos os trabalhadores da parte operacional, desempenhando as mesmas funções, sejam submetidos igualmente à realização dos exames de rotina.

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Não se pode "escolher a dedo" determinado empregado porque se suspeita que ele esteja ingerindo álcool no trabalho. Mesmo que se aponte o resultado esperado e se demita o trabalhador, essa demissão será considerada discriminatória, podendo, portanto, ser revertida na Justiça do Trabalho em detrimento do empregador.


Esse segundo aspecto a ser observado leva automaticamente à terceira condição para a prática legítima dos exames de rotina: a publicidade. Como diz a CLT em seu artigo acima citado, a "ampla ciência do empregado" é requisito indispensável para que haja um dever do motorista de se submeter obrigatoriamente ao exame.


O teste de bafômetro deve ser estabelecido como uma política da empresa, portanto. De preferência, que sejam fixadas datas específicas nas semanas para a sua realização. A criação de uma portaria interna, a divulgação da notícia pessoalmente ou por rede de "emails", sempre se utilizando de um tom ameno e imparcial nas solicitações, são também medidas altamente recomendáveis.


Último ponto a ser observado pela empresa é a sigilosidade dos resultados. Por mais que efetivamente seja constatado que o motorista estava sob efeitos de álcool, a divulgação dos resultados para outros pode acarretar dano moral em favor do empregado por difamação e lesão à sua honra objetiva. Pouco importa que o fato seja verdadeiro, é o simples espalhar da notícia que gera o dano. O benefício pela demissão por justa causa, nesse caso, poderia se reverter em prejuízo por uma indenização gigantesca contra a empresa.


Observadas essas advertências, não haverá obstáculo algum para a realização do exame nos motoristas. E não só: caso algum deles seja flagrado com resultados inadmissíveis ou haja recusa na realização do exame, fica autorizada a demissão por justa causa. O Tribunal Superior do Trabalho, além daquele julgado paradigma já citado, vem cada vez mais sedimentando essa posição em decisões recentes.


Em julgamento de agosto de 2014, no processo AIRR-1635-93.2011.5.09.0021, asseverou que "constatada a embriaguez em serviço, ainda que por uma única vez, é motivo suficiente para a rescisão contratual, por justa causa" .


É, portanto, autorizada pela lei e jurisprudência a prática rotineira de exames etílicos em seus empregados, desde que observadas as condições acima listadas. Sugere-se, assim, um debate específico entre os sócios, administradores e gerência, para se delinear precisamente a política interna que a empresa quer adotar.


De maneira geral, a discrição, a veiculação pública da política e o tom ameno nas conversas com os empregados são princípios que, se adotados, não só facilitam a cooperação da equipe de motoristas com a nova política adotada, mas também previnem futura e eventual responsabilidade da empresa por danos a terceiros.

Texto de autoria do advogado Lucas Teixeira de Rezende, sócio do escritório Nobre & Cruvinel - Sociedade de Advogados.


Acesse: www.nobrecruvinel.com


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