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MÃOS (esboços de uma nova história)

08 out 2014 às 16:10
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Izabel olhou o dorso das mãos e murmurou: "As mãos dizem mais sobre nossa velhice que o rosto." Olhou mais uma vez, atentou para os detalhes, para os sulcos profundos, dedos nodosos, a textura da pele que parecia de plástico, tão fina, tão frágil, com manchas arroxeadas aqui e ali. Perguntou se a mãos da mãe ficariam iguais à dela se não tivesse morrido tão jovem. Depois, olhou pela janela do casarão e viu as paisagens de uma vida inteira. A figueira próxima ao terreiro, árvores de frutas, a mureta de pedra contornando a casa. Estava assim, distraída, quando ouviu alguém à porta do quarto perguntar se ela queria uma sopa. Disse que não.

Já fazia alguns meses que ela se recolhia a determinada hora. Não comentava com ninguém o quanto pensava na mãe que não chegou a conhecer. Subia até o segundo andar do casarão, olhava o rio e pensava na vida. Na vida pretérita. Não na que de fato viveu. Na vida que poderia ter sido se a mãe não tivesse morrido ao dar a luz a ela. Se a mãe também não tivesse ficado órfã tão cedo, se os irmãos da mãe não tivessem se dispersado no mundo. Teria conhecido tios, avós maternos, pedaços da outra metade que desapareceu. Izabel se fez num único pilar. Teve que se virar e se equilibrar a vida toda com o que aprendeu dos Dantas. Ser Izabel Dantas.
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