Londrina

Londrina: vereador eleito é denunciado criminalmente por incitar discriminação religiosa

16 dez 2016 às 11:18

O promotor Paulo Cesar Vieira Tavares, da Promotoria de Justiça de Direitos Constitucionais de Londrina, ofereceu denúncia à Justiça, na última quinta-feira (15), contra cinco pessoas que teriam cometido crimes de discriminação religiosa e injúria racial. Entre os denunciados está o vereador eleito Filipe Barros (PRB), que em janeiro assume uma das 19 cadeiras da Câmara Municipal de Londrina (CML). Ele será diplomado nesta sexta-feira (16).

No dia 5 de setembro deste ano, Barros publicou em sua página pessoal no Facebook um vídeo de trecho de uma peça teatral encenada pela companhia Boi Voador, da Vila Cultural Flapt, cuja narrativa apresentava uma história ligada às religiões de matriz africana. "Na semana da Pátria, a programação para crianças foi: MACUMBA EM FRENTE À PREFEITURA. Se fosse um Culto ou uma Missa, essas mesmas pessoas estariam agora gritando que o Estado é laico. Os pais estavam sabendo? Qual a relação disso com o Dia da Independência do Brasil?", escreveu.


Reprodução/Facebook


Ainda em seu comentário sobre a encenação, o então candidato a vereador creditou as imagens a Douglas Roberto Soares, que também utilizou sua página pessoal na rede social para tecer comentários preconceituosos contra a manifestação cultural. A página de campanha compartilhou a publicação de Barros. Soares foi igualmente denunciado pelo Ministério Público (MP).


Reprodução/Facebook


"Eles [Barros e Soares] utilizaram suas páginas para publicar dizeres ofensivos às religiões de matriz africana, sobretudo ao relacionar estas manifestações religiosas ao termo pejorativo 'macumba', que vincula estas religiões ao mal, à feitiçaria. Desta forma, além de demonstrar intolerância religiosa, eles também incitaram ódio e violência contra os praticantes destas manifestações", explicou Tavares em entrevista concedida ao Portal Bonde na manhã desta sexta-feira (16).


O promotor lembra que tanto Barros quanto Soares infringiram o artigo 20 da Lei do Crime Racial (7.716/89), com o agravante de terem dado publicidade aos seus atos de discriminação religiosa. "Barros foi mais explícito ao evocar o termo 'macumba', mas Douglas foi igualmente preconceituoso ao questionar se os pais das crianças que assistiam à peça estavam sabendo da realização da atividade. Esse questionamento pressupõe que as religiões de matriz africana sejam algo errado, proibido ou perigoso, portanto necessitando, na opinião dele, de autorização dos responsáveis das crianças. No caso de Barros, ele ainda questiona o fato de a apresentação ter sido feita na Semana da Pátria, desconsiderando completamente a importância da cultura negra para a formação do País", ressalta Tavares. Em caso de eventual condenação, a pena prevista pela lei 7.716/89 é de dois a cinco anos de prisão, além de multa.


Ouvido pela reportagem, Filipe Barros afirmou ainda não estar sabendo da denúncia e, em sua defesa, evocou o artigo 12 do pacto de San José da Costa Rica, que trata de diversos pontos dos direitos humanos. "Eu estou tranquilo, meu Facebook é público e naquela ocasião eu escrevia embasado neste artigo, que afirma que a educação religiosa compete aos pais e não ao Estado. Esta é a minha bandeira e não se trata de uma questão moral, mas, sim, legal", afirmou.


Douglas Roberto Soares também foi procurado pelo Bonde e disse que irá aguardar o desfecho deste "mal-entendido" para se pronunciar. Ele declarou, ainda, respeitar o trabalho do Ministério Público e as pessoas envolvidas na apresentação.


Veja o vídeo:



Três denúncias apresentadas pelo MP-PR


Intolerância religiosa


Na primeira denúncia, o MP-PR relata que dois homens, incluindo um eleito vereador agora em 2016, publicaram em seus perfis na rede social Facebook críticas à exibição de uma peça teatral sobre a história do povo africano a alunos da rede municipal. Nos comentários feitos na internet, os dois utilizam termos que denotam discriminação e preconceito, provocando intolerância e incitando a violência contra pessoas da raça negra e de religiões de matriz africana, como candomblé e umbanda, ao associarem a peça ao termo "macumba", expressão de cunho pejorativo.


'Guerra contra a macumba'


O segundo caso denunciado pelo MP se refere a dois pastores evangélicos que afixaram, em outubro deste ano, uma faixa na fachada da igreja na qual atuam que incitava a violência contra pessoas adeptas a religiões de matriz africana e convocava os fiéis a uma "guerra contra a macumba". Eles poderão ser igualmente processados pela Lei do Crime Racial.


Fanatismo


Em sua denúncia, o promotor cita como exemplo das violentas consequências do discurso de ódio, presente nos dois casos, o brutal assassinato da líder negra e candomblecista Vilma Santos de Oliveira, a Yá Mukumby, de 63 anos, sua mãe, Allial de Oliveira dos Santos, de 86, e de sua neta, Olivia Santos Oliveira, de 10. As três foram mortas a facadas em agosto de 2013, dentro da casa em que moravam, pelo vizinho Diego Ramos Quirino, de 30. As investigações do triplo homicídio apontaram que o assassino cometeu os crimes por motivo torpe, impelido por fanatismo religioso cristão e intolerância religiosa.


Racismo


A terceira denúncia trata de uma professora de técnica de enfermagem que ofendeu, em novembro de 2015, uma aluna dizendo que, por ser negra, ela não teria "perfil e biotipo" adequados ao curso. A professora foi denunciada por injúria racial (art. 140, p. 3º, do Código Penal), crime passível de até três anos de reclusão e multa.


Processos relacionados ao vereador eleito Filipe Barros


Nascido em 29 de maio de 1991 em Londrina, Filipe Barros Baptista de Toledo Ribeiro é advogado e foi sétimo candidato mais votado para vereador nas últimas eleições municipais, com 4.227 votos. Ele concorreu pela coligação Juntos para Mudar, que engloba os partidos PRB e PDT.


Há dois processos contra o vereador eleito Filipe Barros arquivados no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PR).


No dia 27 de outubro deste ano, o Ministério Público Eleitoral (MPE), em Londrina, instaurou investigação contra o vereador eleito, por suposta compra de votos durante as eleições, referente a um evento realizado nos dias 25 e 26 de setembro, na avenida Harry Prochet, zona sul de Londrina.


A possível "captação ilícita de sufrágio" teria ocorrido no evento conhecido com "Quarta-reaça", com a presença do candidato, onde havia, inclusive, Food Trucks "com o suposto oferecimento e entrega de alimentos aos eleitores, em frente ao QG do então candidato, com o intuito de obter-lhes voto", escreveu a promotora eleitoral designada para o caso, Sonia Regina de Melo Rosa, na abertura do procedimento.


No entanto, este processo, que foi investigado da 41ª Zona Eleitoral, foi arquivado em dezembro de 2016. (Colaborou Fernanda Circhia)

(atualizada às 16h30)


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