É muito comum escutar motoristas reclamando de guardadores de carros, mais conhecidos como flanelinhas, em Londrina. Eles relatam, com frequência, que se sentem extorquidos em relação aos altos valores cobrados, além de outros problemas mais sérios. Até hoje todas as iniciativas para solucionar esse tipo de trabalho, realizado de maneira irregular, não foram efetivas em Londrina.
Conforme a lei federal brasileira nº 6.242, de 23 de setembro de 1975, "o exercício da profissão de guardador e lavador autônomo de veículos automotores, em todo o território nacional, depende de registro na Delegacia Regional do Trabalho Competente". O decreto nº 79.797 regulamentou o exercício dessas profissões em 8 de junho de 1977 e, segundo ele, a concessão do registro somente se dará com a apresentação cinco documentos essenciais (veja aqui). Em Londrina, eles não são registrados e, por isso, atuam irregularmente.
A supervisora de cobrança Anilda Franco de Campos conta que já se sentiu intimidada por flanelinhas. "Toda vez que você vai em algum lugar sempre tem um lá cuidando de carro. Já aconteceu de um até ter me ajudado a segurar uma vaga, mas aí você vai descer do carro e já falam 'é 10zão, paga adiantado'. Mas quando você sai do lugar [quando volta para o carro], você vê que o cara nem está mais lá, no entanto, você paga antes por receio de alguém xingar, brigar ou até fazer alguma coisa com o carro."
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Para a londrinense, a prefeitura ou a Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização (CMTU) deveria acabar com o trabalho irregular dos guardadores de carro. "Eles não estão cuidando de verdade dos carros. A gente fica com medo. A rua é pública, eu já pago impostos, é meu direito poder estacionar em paz." Sobre a possibilidade de acionar a polícia, Anilda tem dúvidas. "A gente não entende se isso é um direito ou não. Isso deveria partir dos órgãos públicos. Nós ficamos impotentes e não sabemos bem o que fazer. Acabamos dando o dinheiro por preocupação, porque não existe segurança."
Projeto de lei
Em Londrina, a tentativa mais recente para solucionar o trabalho irregular de guardador de carro é do vereador Vilson Bittencourt (PSB). O vereador pretende reativar um projeto de lei que proíbe a atividade no molde irregular. Mas o texto contém poucos artigos e não sugere como a prefeitura poderia combater a ocupação indevida dos flanelinhas em vias públicas.
No entanto, e conforme o vereador afirmou em entrevista à reportagem do Portal Bonde, o projeto ainda pode passar por mudanças. "O projeto que eu tenho deve ser bastante alterado, ficando bem próximo da lei em vigor em Ponta Grossa."
Em Ponta Grossa foi sancionada em 2012 a lei nº 11.101, que proíbe a atividade do flanelinha. Conforme o artigo 2º, "cabe somente ao Poder Público, de forma exclusiva, a exploração de estacionamento pago ou a cobrança de qualquer espécie de contribuição, legalmente autorizada, para o estacionamento de veículos nos logradouros públicos". A fiscalização e comunicação à autoridade policial competente (Polícia Militar ou Guarda Municipal) é de responsabilidade dos Agentes de Trânsito da Autarquia Municipal de Trânsito e Transporte (AMTT).
A lei autoriza a prefeitura a retirar das ruas os guardadores pegos em flagrante. O descumprimento pode render prisão de 15 dias a três meses ou multa. "Pude perceber que a legislação de Ponta Grossa não faz nenhuma menção à lei federal. Talvez esse seja o caminho a ser seguido em Londrina", diz Vilson Bittencourt.
O vereador londrinense foi até Ponta Grossa com representantes da CMTU há cerca de dez dias. "Falar que está 100% funcionando seria muito. O pessoal de lá me disse que a lei é uma ferramenta que lhes permite agir de forma eficaz contra este procedimento ilegal, mas se comparar com a situação de Londrina, os avanços foram grandes."
O parlamentar acredita que "há uma solução para o problema do flanelinha", mas reconhece também que "é difícil encontrar uma saída". Bittencourt ainda aguarda posicionamento da Procuradoria Jurídica da Câmara para que as leis federal e municipal não entrem em conflito. "A fiscalização continua sendo o principal entrave. Se conseguirmos aprovar em Londrina, a Guarda Municipal teria atribuição em interceptar esses guardadores irregulares."
No entanto, a tentativa de solucionar o trabalho dos flanelinhas não é novidade. O projeto de lei 44/2017, de autoria do vereador Ailton Nantes (PP), regulamenta o serviço de flanelinha, determinando que os interessados se cadastrem na CMTU. A partir disso, a companhia ficaria responsável por emitir carteiras de identificação, além de definir as ruas nas quais eles poderiam trabalhar junto com os valores.
Apesar do projeto de Nantes ser o mais recente, o de Bittencourt, de fevereiro de 2016, tem preferência porque foi protocolado antes e segue tramitando. Se este último for aprovado, o de Nantes, que está em uma espécie de limbo, corre o risco de cair.
Assistência social
Josiani Nogueira, diretora de Proteção Social Especial da Secretaria Municipal de Assistência Social de Londrina, disse ao Portal Bonde que alguns flanelinhas vivem nas ruas e outros têm casa, família e até filhos.
De acordo com ela, há uma equipe de abordagem social que identifica os flanelinhas que vivem na rua e tentam realizar um vínculo com o Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP), que é de natureza pública e municipal.
Assim, a equipe de abordagem não tenta obrigar a pessoa a sair da rua ou a deixar de ser flanelinha. "Procuramos estimular interesses. Muitas pessoas não falam com a família há anos. Vieram de outros Estados, têm vontade de visitar [familiares] e não podem. Então, tentamos estimular isso nessas pessoas, além de conseguir levá-las ao Centro POP, onde terão lanche, café, banho e contato com as famílias."
Quando os flanelinhas têm casa e família, as equipes de abordagem dão orientações em relação aos locais de trabalho, explica Josiani. "As equipes orientam [o guardador] se o espaço é perigoso ou não, se é próximo de locais de tráfico de drogas e até de roubo."
Para Josiani, a solução seria a implantação de uma política social mais efetiva. "Política que atende morador de rua, adolescentes e crianças em situação de risco", diz. "Sempre falamos que, nesses casos, a política pública de segurança deveria ser a última a ser acionada, mas, infelizmente, em casos mais graves é preciso acionar. Isso acontece justamente por faltar uma política social mais efetiva."
Josiani acrescenta que a regulamentação seria uma boa forma de solucionar os trabalhos dos flanelinhas. A prefeitura poderia fazer um convênio com alguma instituição social, por exemplo. "A Zona Azul recebe por meio da arrecadação do estacionamento. É possível pensar em uma regulamentação para os flanelinhas, não precisa ser para a cidade toda, mas para os pontos-chave de movimentação de pessoas." Para a diretora, a regulamentação poderia até gerar renda e empregos para a cidade. "Deveria ser um tipo de trabalho voltado às áreas sociais, um conjunto com ações."
No mês de agosto, 216 pessoas em situação de rua e adolescentes foram acompanhados pelas equipes de abordagem social. Caso você veja alguém em situação de rua, ligue para o número da abordagem social: (43) 99991-4568.
(Colaborou Rafael Machado)