A campanha Pé na Faixa, lançada na semana passada por órgãos de trânsito e encabeçada pela prefeitura de Londrina, cuja promessa é durar enquanto os motoristas não mudarem comportamento, é uma forma de reduzir a falta de respeito ao pedestre e a violência no trânsito, mas não a única e também não a mais importante.
O chefe do Executivo deve abraçar uma política eficaz de trânsito que não passa apenas pela educação e conscientização, mas também por uma efetiva fiscalização e punição dos infratores. Assim avaliou o advogado e psicólogo Luís Riogi Miúra, que foi diretor de trânsito em cidades cujo respeito às regras de trânsito – especialmente à faixa – são perceptíveis até hoje.
No governo de Cristóvão Buarque (entre 1995 e 98), Miúra, que hoje mora na capital federal, implantou "com total apoio do governador" a campanha Paz no Trânsito no Distrito Federal. Hoje, quem vai a Brasília se admira com o respeito dos motoristas: basta pôr o pé na faixa e todo o trânsito para em respeito ao Código de Trânsito Brasileiro (CTB), que prevê preferência para o pedestre, que coloca a vida humana em primeiro lugar. Miúra também ocupou o mesmo cargo em Maringá, entre 2005/2006, onde conseguiu fazer algumas mudanças.
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"O prefeito, o governador, o presidente da República – os líderes – devem apoiar integralmente políticas mais rígidas de trânsito, porque a legislação brasileira há mais de 30 anos já prevê o respeito ao pedestre. Não sabe quem não quer", disse Miúra, referindo-se ao Decreto 62.127/1968, que regulamentou o primeiro CTB (Lei 5.108/1966). Em 1998, passou a valer o novo Código.
Mas o que se vê, na avaliação de Miúra, é uma espécie de "prevaricação" do poder público em todos os níveis e em praticamente todas as localidades brasileiras. "Estudos feitos no Brasil demonstram que apenas uma multa é aplicada a cada 10 mil infrações cometidas", contou. Se o número lhe parece imenso, pense em você próprio dirigindo e em quantas infrações comete quando está dentro de seu veículo.
Mas, qual a razão de tanto desrespeito às leis de trânsito? Para Miúra, esse excesso se deve justamente à quase certeza de que quem comete uma infração não será punido. "Os políticos, com algumas exceções, estão comprometidos com outros interesses e acabam deixando de cumprir seu papel que é fiscalizar. Aplicar multas é considerada uma medida impopular e a maioria só pensa na reeleição", avaliou. "Não sei qual a situação política de Londrina, mas só haverá mudanças se o prefeito abraçar esta causa, se não ceder a pressões".
O especialista em trânsito defende inclusive que o Ministério Público exija que o poder público cumpra a lei. "É função constitucional dos promotores zelar pelo cumprimento das leis: deveriam mover ações para que os chefes dos Executivos efetivamente fiscalizassem e multassem os infratores", sugeriu. "Uma verdadeira mudança só ocorre quando os interesses do prefeito, das autoridades e da população são os mesmos e, no caso do trânsito, todos têm que querer menos violência, mais respeito".
Inversão
Ao lado da falta de fiscalização e da falta de punição, está a cultura brasileira, que inverteu completamente o senso de respeito e de proporção no trânsito. "O que a gente percebe é o predomínio total do automóvel sobre qualquer outro valor. O motorista no automóvel sempre acha que o direito é dele. Mas o direito, em trânsito, é sempre do mais fraco, do mais leve, do menor", ensinou Miúra.
Sobre quem reclama do comportamento dos pedestres, o especialista disse que "o fato de um pedestre ou ciclista ou motociclista estar trafegando pelo lugar errado não dá o direito ao motorista de atropelá-lo, aleijá-lo, matá-lo".
A inversão de valor é tamanha que quem dirige corretamente acaba se sentindo um "pária" no trânsito. Quem já passou por isso, sabe como é. Mas Miúra descreve muito bem a situação: "Quem dirige certo, no limite da velocidade e respeitando a faixa, por exemplo, acaba sendo xingado pelos outros motoristas. Então, você vai reclamar para quem? Vai denunciar o infrator para quem? Se ligar para o órgão de trânsito, vão dizer que não têm gente, não tem condições, enfim, que o problema é seu. Então, até quem dirige certo, acaba sendo induzido a uma conduta errada".