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História

Há 101 anos, Santos Dumont contornava a torre Eiffel

Ana Setti - Folha de Londrina
20 out 2002 às 16:18

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Em 19 de outubro de 1901, o brasileiro voava em torno da torre Eiffel com seu dirigível número 6 - Arquivo Bonde
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Há exatos 101 anos, no dia de 19 de outubro de 1901, o brasileiro Alberto Santos Dumont encantava Paris, arrancando suspiros de uma extasiada multidão, ao contornar a Torre Eiffel no dirigível nº6 e retornar à sede do Aeroclube, em Saint Cloud, em meia hora. O que ele conseguira depois de muitas experiências e até mesmo de acidentes - como o que ocorrera com o balão anterior, que caíra e batera no telhado do Hotel Trocadero, deixando-o pendurado pelas cordas, de onde acabou sendo resgatado pelos bombeiros de Paris - fora dar dirigibilidade aos balões. Essa conquista em relação a um engenho mais leve do que o ar, que podia, enfim, ser manobrado à vontade, respondendo aos desejos de quem o guiasse, representou um avanço e tanto, num mundo que ainda estava fortemente arraigado à terra e olhava os céus com respeito e temor.

Até chegar a esse momento histórico, que antecedeu em cinco anos outro feito ainda mais representativo - o de levar ao espaço um aparelho mais pesado do que o ar -, devido também à genialidade criativa de Santos Dumont, outros brasileiros contribuíram para que a lenda de Ícaro se concretizasse. Entre eles, o ''padre voador'' e sua ''passarola'', como ficaram conhecidos o jesuíta Bartolomeu Lourenço de Gusmão e seu aeróstato, o primeiro balão - um engenho mais leve do que o ar - a ganhar os céus do mundo. A auspiciosa novidade aconteceu em Lisboa, onde o sacerdote da Companhia de Jesus, que chegou a ser capelão da Casa Real, nos tempos de Dom João V, viveu e fez suas experiências. Contam os estudiosos que a curiosidade de Gusmão pelo assunto foi despertada quando, ao observar uma pequena bola de sabão passar sobre um foco calorífico, viu-a ser impelida às alturas, como se alguém a tivesse empurrado. Deduzira, então, que o ar ambiente, quando aquecido, tornava-se mais leve, constituindo-se, assim, em uma força ascensional irresistível. A primeira apresentação oficial de seu engenho - também chamado de ''balão de São João'' - ocorreu diante do rei, em 1709. Mas são imprecisas e contraditórias as informações a respeito do aspecto de seu aeróstato e dos resultados que obteve. Dizem alguns que consistia em uma esfera de papel pardo grosso, cheio de ar quente, produzido pelo ''fogo material contido numa tijela de barro, incrustada na base de um tabuleiro de madeira encerada'' e que subira a uma altura de 4,60m antes de se queimar. Outros referem-se a uma armação de vime coberta de papel, que teria subido a uma altura de sessenta metros, a mesma da torre de Lisboa.

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De qualquer forma, como é comum em experiências com balão, o fim era um pequeno incêndio. Por isso, Gusmão foi ridicularizado pelos que acreditavam ser ele ''sócio do diabo''. E como costuma acontecer às pessoas que se notabilizam por estarem à frente de seu tempo, esse santista, nascido em dezembro de 1685, precisou fugir, para evitar a Inquisição, que o acusava de simpatizar com cristãos-novos perseguidos pelo Santo Ofício. Acabou adoecendo e morrendo em Toledo, na Espanha, com apenas 39 anos de idade.

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Pouco antes da conquista de Santos Dumont, outro brasileiro, o paraense Júlio César Ribeiro de Souza, que também andava ocupado com a questão da dirigibilidade, inventou, em 1881, o balão fusiforme dissimétrico, com a proa mais bojuda do que a extremidade posterior ou popa. Descobria, assim, a forma aerodinâmica que deveriam ter todas as aeronaves do futuro, idealizando também os lemes de profundidade ou profundores dos aviões de hoje.

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Jornalista e poeta, nascido em 1843, Júlio César cursou a Escola Militar do Rio de Janeiro e alistou-se como voluntário na Guerra do Paraguai, em 1868, interessando-se pela ciência aeronáutica somente a partir de 1875. E, quem diria, começou seus estudos com urubus, que procurava domesticar, com o objetivo de usá-los como modelos para aves de madeira de buriti, às quais adicionava asas e caudas feitas de tecido de algodão esticados por varas de bambu.


Mas os brasileiros também engrossaram a lista de ''mártires da tecnologia aeronáutica'', como foi o caso de Augusto Severo, nascido na cidade de Macaíba, Rio Grande do Norte, em 1864. Como homem de ciência pesquisou, primeiramente, o ''moto-contínuo'', abandonando-o depois para estudar o''mais pesado que o ar''. Apaixonado por esse ideal, reuniu todos os meios financeiros disponíveis, incluindo a ajuda de amigos e parentes, e partiu para Paris, em 1902, onde construiu o balão ''PAX'', de 30 metros.


No dia 12 de maio de 1902, no parque Vaugirad, enquanto fazia manobras com o seu balão, a aproximadamente 400 metros de altura, realizando círculos fechados e apresentando figuras em forma de oito, houve um incêndio, seguido de uma explosão, que matou Severo e seu mecânico, o francês George Sachet. Restaram as homenagens: uma ''rue'', em Paris, chamada Augusto Severo e, em Natal, capital potiguar, o Aeroporto Internacional Augusto Severo.

Não se pode, portanto, falar em história da aeronáutica sem citar os brasileiros que, em maior ou menor grau, contribuíram com estudos, pesquisas, criatividade e até com a própria vida para que o homem, enfim, conseguisse voar. De acordo com José Kloc, presidente da Associação Brasileira dos Inventores e da Propriedade Industrial do Paraná (ABRIPI/PR), que está escrevendo um livro sobre Santos Dumont, ''O Brasil é pioneiro nos céus, desde a conquista do mais leve que o ar até o mais pesado, mas pouca gente sabe ou valoriza isso''. Por isso, a importância de resgatar a história. ''Se não preservarmos nossa história'', comenta, ''não há futuro''.


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