Protestantes de diversas tendências criticaram o documento do Vaticano publicado na terça-feira (10) que define a Igreja Católica como "a única e verdadeira" igreja universal de Cristo.
Líderes na Itália consideram a declaração assinada pela Congregação para a Doutrinda da Fé – entidade do Vaticano responsável por promover e tutelar a doutrina da fé e moral no mundo católico – ofensiva ao afirmar que os protestantes não são "igrejas", mas simples "comunidades eclesiais", por não ter o sacerdócio ministerial e não "conservar integralmente a substância do ministério eucarístico".
"Esta declaração representa um drástico golpe no caminho do diálogo ecumênico", disse à BBC Brasil o pastor Domenico Maselli, presidente da Federação das Igrejas Evangélicas na Itália. "Nunca o Vaticano foi tão claro como agora, dizendo que a única maneira de encontrar a unidade é entrando na Igreja Católica".
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O decano da Igreja Evangélica Luterana Holgel Milkau afirma que o documento oficial da Santa Sé é presunçoso e só traz desilusão. "Daqui para frente, devemos nos perguntar de que maneira podemos ver a Igreja Católica como um parceiro interessado em seguir com o discurso ecumênico", assinalou. "O documento demonstra a falta de sensibilidade da Cúria Romana com o diálogo. Mas somos pacientes e prontos para sofrer mais esta desilusão".
Na avaliação do vaticanista Marco Politi, julho será lembrado como o mês que colocou o pontificado de Bento 16 na linha restauradora no que diz respeito às dinâmicas do Concílio Vaticano 2º – reunião de bispos e cardeais realizada entre 1962 e 1965, que adotou mudanças como a realização das missas nos idiomas modernos e afirmou o respeito aos não-católicos.
'Retrocesso'
"Este documento e o da volta da missa em latim representam um retrocesso para os católicos. Mas, acreditamos que não é o momento de abandonar aqueles bispos e padres que acreditaram no Concílio e na possibilidade de caminhar junto com os outros cristãos", afirmou o pastor Maselli, garantindo que continuará participando dos encontros ecumênicos. "Se nos tornarmos fechados, não podemos ajudar aqueles que ainda permanecem na Igreja Católica e são abertos ao diálogo."
Decepcionado com a declaração do Vaticano, o secretário da Aliança Reformada Mundial, pastor Setri Nyomi, enviou uma carta ao cardeal Walter Kasper, presidente do Pontifício para a Unidade dos Cristãos, pedindo maiores esclarecimentos sobre a seriedade da Igreja Católica diante dos diálogos com as outras igrejas cristãs.
"Estamos desconcertados pela apresentação do documento neste momento histórico para as igrejas cristãs", disse Nyomi, em nome de 200 igrejas protestantes.
"Agradecemos a Deus porque o chamado para fazer parte da Igreja de Jesus Cristo não depende da interpretação do Vaticano, mas é um dom de Deus. Rezamos para que chegue o dia em que a Igreja Católica avance para além das suas pretensões exclusivistas e que possamos levar adiante a causa da unidade cristã".
Junto aos protestantes, as igrejas ortodoxas também se uniram no protesto contra o Vaticano.
Segundo o secretário do Discatério da Igreja Ortodoxa de Moscou, padre Igor Viszhanov, é impossível concordar com uma "posição ultrapassada da Igreja Católica, a mesma que provocou o cisma ortodoxo em 1054".
Em declaração ao jornal italiano La Repubblica, o bispo ortodoxo Abdel Massih Bassit disse que a declaração vaticana não ajuda o diálogo. Ele pediu ao papa Bento 16 que "se levante do coma" em que se encontra.
Para o historiador do cristianismo Alberto Melloni, o documento do Vaticano "é um golpe à credibilidade ecumênica da Igreja Católica". Ele criticou o papa Bento 16. "Precisamos entender que mensagem ele traz com estes dois documentos. Se a Igreja Católica estava de férias ou se estava ocupada nos últimos 40 anos", disse o historiador à BBC Brasil.