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Ator paranaense brilha em São Paulo

Zeca Corrêa Leite - Folha do Paraná
25 set 2001 às 12:31

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Todas as noites, de quarta a domingo, os 1,6 mil lugares do Teatro Abril, em São Paulo, são ocupados por uma platéia que se emociona do riso à lágrima, com a trajetória de Jean Valjean, um homem cuja vida é marcada a partir do instante em que rouba um pão para alimentar uma criança. "Les Miserables", um dos musicais mais populares dos últimos tempos, tem no papel principal um ator curitibano, Marcos Tumura.
Aos 33 anos de idade e 15 de carreira, Tumura comemora a excelente fase que está vivendo, mas não se deixa inebriar pelo sucesso. "A vida do ator brasileiro é um gráfico de altos e baixos", diz. Ele sabe do que está falando – depois de passar pelo corpo de baile do Teatro Guaíra e Studio D, foi tentar a sorte no Rio de Janeiro. Assim como recebeu aplausos, também enfrentou o desemprego, o atraso no aluguel e todas as consequencias vindas com a falta de dinheiro.
As dificuldades não o deixaram amargo, assim como o sucesso não o afasta da simplicidade. "Não sou deslumbrado", confessa. Artista versátil, conseguiu o papel de protagonista em "Les Miserables" por ser não só um cantor de grandes possibilidades vocais, como também sabe representar e dançar.
A dança, aliás, era o seu objetivo artístico e chegou a trabalhar com Cláudia Raia nas diversas montagens produzidas por ela. Também atuou em "Splish-Splash", de Wolf Maya, entre outras participações. Porém, um acidente de percurso alterou a direção de sua história: em 1996 participava de um espetáculo quando rompeu o ligamento, menisco e cartilagem. Foi parar na mesa de cirurgia e levou quase dois anos se restabelecendo.
Hoje, se quiser, Marcos Tumura até pode se dar ao luxo de dançar, mas no retorno aos palcos ele determinou a si mesmo que seu destino seria outro – iria investir no canto e na representação. Foi o que aconteceu. Aprovado num teste, integrou o elenco do bem sucedido "Rent", espetáculo produzido pela Cia. Interamericana de Entretenimento (CIE), mesma empresa que investiu R$ 3,5 milhões na montagem de "Les Miserables".
"'Rent' não tinha nada de dança. Dali fui fazer 'Aí Vem o Dilúvio', novamente como ator e cantor. Depois dei sorte em passar para o 'Les Miserables'", simplifica. Na comédia do dilúvio o ator também defendeu o papel principal do espetáculo. A diferença de um para outro está na dramaticidade. "Deixei de ser marcadamente comediante para representar um personagem mais denso".
Jean Valjean não chega a ser uma pessoa triste, mas determinada, na visão do artista. "Ele sabe exatamente o que quer. Até sua morte é muito bonita – ele vai em paz porque já cumpriu sua missão na terra", entende Tumura, que em três horas e quinze minutos de encenação, passa de jovem a ancião.
Para o ator seu personagem é um homem obstinado, que não aceita as imposições da maneira como elas chegam. Condenado a cinco anos de prisão por ter roubado um pão, Valjean vê essa pena crescer para 19 anos devido às diversas tentativas de fuga. "Ele não pensa muito, é uma pessoa de decisão".
Na pele do cidadão francês Marcos Tumura assume inteiramente uma personalidade que não é sua. "Sou muito bagunceiro", revela. Mas concorda que algumas de suas características estão na alma desse homem criado por Victor Hugo.
Ele afirma que a direção deixou-o à vontade para criar o personagem: "Não me deram uma forma onde eu tivesse que me encaixar, do tipo 'é assim'. Recebi características gerais dele, mas a maneira de agir fui eu que descobri. Com certeza tem muitas coisas minhas em sua forma de agir".
Assim como existe um território teatral à sua frente, Tumura também tem possibilidades de seguir a carreira como cantor. Ele conta:
– Já pensei nisso, tenho até um CD demo gravado uns cinco anos atrás, que resolvi tirar da gaveta e botar na roda. É um demo metido, tem encarte, foto, mas só cinco músicas. Acho que estão meio antigas pelo que a gente está vivendo agora. É completamente diferente do que estou fazendo no momento: uma grande bagunça meio pop, meio Ed Motta misturada com Jota Quest. É super agradável de ouvir, mas não lançaria nada parecido.
Se viesse a gravar, o que gravaria? "Gosto muito de música brasileira, em minha casa tenho poucos discos em outros idiomas", responde. "Gosto muito de Zizi Possi, de Nana Caymmi, das composições de Djavan, Chico Buarque, Ana Carolina. Minha influência é muito de MPB".
Marcos Tumura é um apaixonado por musicais e quer continuar trabalhando "até onde der", sem se preocupar onde situa o fim da caminhada. Gravar CD está em seus projetos, o teatro é fascinante, mas quando o assunto é televisão, responde evasivo: "Não sei... Se rolar é legal, mas teatro é mais intenso". Quando morou no Rio participou durante dois anos do programa de Chico Anysio, como um dos alunos do professor de teatro Alberto Roberto. "Sinceramente, nunca me empenhei muito, porque acho teatro muito mais bacana".
Quem o vê falando de seu trabalho em "Les Miserables" dificilmente imagina que ali está um artista que venceu 2.400 profissionais de todo o Brasil que deveriam ter capacidade de representar, cantar e dançar. O diretor Ken Caswell foi enfático: "Precisávamos de atores versáteis, já que alguns representam até nove papéis. As vozes tinham que ser extraordinárias e achamos tudo isso aqui".
Tumura sabe apenas que é tenor. Isso, porque disseram a ele, pois jamais fez aulas de canto. Por insistência dos amigos procurou a conceituada professora Vera do Canto e Mello, em São Paulo. Depois de ouvi-lo a mestra foi franca: "Você criou uma técnica sua e não precisa aprender nada. Vou ensiná-lo a respirar e umas coisas básicas".
Pois bem, nessa época ele estava estrelando o "Dilúvio", e quase enlouqueceu em cena tentando acertar a respiração com o canto. No próximo encontro com Vera, ouviu dela a frase definitiva: "Vai para sua casa, não tenho que ensinar nada". A atitude da professora transformou-se em genuína admiração do ator/cantor. "É uma grande profissional da área que teve o discernimento de saber que poderia estragar aquilo que eu consegui intuitivamente durante anos".
A dança é uma das explicações que ele encontra para se dar bem na música. Sem ler uma nota de partitura, Tumura tem o ouvido treinado para os tons. Nos ensaios do "Les Miserables" o diretor passava a música duas vezes e na terceira "eu estava cantando. Meus colegas ficavam impressionados, perguntavam como fazia isso, mas nem eu sei. O que sei é que como bailarino a gente aprende a ouvir o que a música está pedindo".
Há alguns dias, Marcos entrou em cena com uma incômoda faringite, mas deu conta do recado. "Fiz um Valjean mais brando, saiu outra história. De todos os espetáculos, foi um dos melhores", considerou mais tarde. Para ele, esse é um instinto de proteção nascido com a dança. "Você não pode ultrapassar o seu limite de alongamento, senão terá uma distensão. Então acho que tenho a mesma coisa intuitivamente com as cordas vocais. São músculos também", explica.
Os aplausos que ecoam todas as noites no amplo espaço que um dia abrigou o Teatro Paramount são a resposta a essa dedicação, mas insuficientes para fazer de Marcos Tumura uma estrela. "Todos os dias agradeço e peço a Deus para continuar como sou. Não me deslumbro, não. Já tive em posições legais e fui ao fundo do poço mais de uma vez".
Depois de protagonizar dois espetáculos seguidos, sendo "Les Miserables" uma montagem grandiosa, alguns diretores sopraram no ouvido de Tumura que no próximo musical – "A Bela e a Fera" – se não conquistar o papel principal, simplesmente não poderá entrar no elenco. "Respondi a eles que tenho que trabalhar, nem que seja para fazer o coro. Sou um forte concorrente, mas tem muita gente boa aparecendo, o que é bem legal", conclui.
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