Congressistas ligados ao governo Lula (PT) comandam as três comissões do Congresso Nacional com mais verbas de emendas. Os colegiados concentram R$ 10,6 bilhões, cifra que representa cerca de 70% do recurso (R$ 15,5 bilhões) reservado para esse tipo de indicação em 2024.
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As emendas de comissão entraram na mira do STF (Supremo Tribunal Federal) por esconder qual deputado ou senador indicou o dinheiro, pois os pedidos são feitos formalmente apenas pelo presidente do colegiado.
As emendas são uma forma pela qual deputados e senadores conseguem enviar dinheiro para obras e projetos em suas bases eleitorais e, com isso, ampliar seu capital político. A prioridade do Congresso tem sido atender seus redutos eleitorais, e não as localidades de maior demanda no país.
Presidente da Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo, o senador Marcelo Castro (MDB-PI) pode assinar R$ 3,2 bilhões em emendas neste ano. Ele afirmou que "todo mundo" no Senado decide sobre o recurso e nega falta de transparência.
O senador, porém, disse não ser possível apontar qual congressista ou grupo político emplacou a maior parte das emendas no órgão que preside, o segundo com mais verba no Legislativo.
"O parlamentar pode sugerir, pode apresentar a emenda, mas a emenda é da comissão. A emenda é coletiva, não é individualizada", afirmou Castro.
As verbas das comissões estão entre os alvos das decisões recentes do ministro Flávio Dino, do Supremo, que travaram a execução das emendas. No começo de agosto, ele determinou que esse recurso só deve ser pago "mediante prévia e total transparência e rastreabilidade".
Dino também cobrou informações do Executivo e Congresso sobre como e por quem as emendas dos foram indicadas. Nesta sexta-feira, o STF decidiu, de forma unânime, manter a decisão do ministro.
Neste ano, 25 colegiados da Câmara e do Senado têm recursos de emendas.
Como a Folha revelou, uma aliada do presidente Arthur Lira (PP-AL), que é assessora do PP, chega a enviar listas prontas de emendas que são apenas assinadas pelo presidente da Comissão de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional da Câmara e enviadas aos ministérios.
Questionado se as emendas são ditadas pela cúpula do Congresso, o senador Marcelo Castro repetiu que a verba é amplamente debatida.
"Não vou citar nomes. O que eu posso dizer é que todos participam da elaboração [das emendas]. Se tiver alguma exceção, é apenas exceção à regra. Mas o Senado participa, a comissão participa, o presidente participa, todo mundo participa. É claro e todo mundo sabe disso", disse o senador.
O deputado Dr. Francisco (PT-PI) comanda a Comissão de Saúde da Câmara, colegiado com mais emendas (R$ 6 bilhões) para distribuir.
Em março, ele disse que não via problema em divulgar os autores das emendas. "Do mesmo jeito que a emenda individual tem lá a nossa indicação, se a emenda de comissão alguém está indicando, eu não vejo problema", afirmou.
Mas Francisco recuou e mantém sob sigilo os verdadeiros padrinhos das emendas que ele mesmo assina.
No Senado, a comissão que faz indicações ao Ministério da Saúde é comandada por Humberto Costa (PT-PE). Ele foi crítico às chamadas emendas do relator no governo Jair Bolsonaro (PL), mas agora é quem formalmente encaminhou cerca de R$ 1,2 bilhão em indicações que também não revelam o real padrinho da verba.
Procurado, o senador não informou de que forma são distribuídas as emendas da comissão que preside e quais grupos políticos foram atendidos pelo dinheiro.
Ele disse "esperar que todo esse processo [no Supremo] redunde na absoluta transparência de que necessita a destinação de emendas, que é o que defende e sempre defendeu".
"Para o senador, esse é um processo em que Legislativo e Judiciário podem contribuir um com o outro, sem invasão de competência à seara alheia, com respeito à Constituição e, sobretudo, em atenção à boa e clara aplicação dos recursos públicos", afirmou ainda o gabinete de Humberto.
O presidente Lula tem feito críticas aos altos valores das emendas, ainda que aliados estejam à frente das comissões mais ricas do Congresso. O PT também se uniu ao centrão para contestar travas impostas pelo Supremo às indicações com baixa transparência.
"Se o cidadão tem o direito de ter uma emenda de R$ 30 milhões, de R$ 40 milhões, de R$ 50 milhões, diz que tem comissão, que o presidente da comissão tem direito a R$ 300 milhões, R$ 400 milhões. Isso pode tornar a pessoa viciada e não querer abrir mão disso", afirmou Lula nesta sexta-feira (16).
O senador Marcelo Castro defende o volume de recursos na mão do Congresso. Ele disse que as emendas só eram pagas aos aliados do governo, quando o Executivo ainda não era obrigado a executar as indicações do Congresso. "Eu acho que existe um equilíbrio maior de forças."
As indicações parlamentares somam quase R$ 52 bilhões em 2024. Essas emendas drenam cerca de 20% do gasto discricionário do governo, ou seja, a verba livre para aplicar em obras, custeio da máquina pública e outros programas.
As emendas individuais (R$ 25,1 bilhões) e de bacadas estaduais (R$ 8,5 bilhões) são impositivas -o governo é obrigado a executar o recurso.
Já a fatia definida pelas comissões não é obrigatória, mas existe um acordo político para o Executivo seguir as indicações feitas pelo Congresso.
Após o fim das emendas de relator, o Congresso turbinou a verba das indicações de comissões temáticas do Congresso. Há R$ 15,5 bilhões reservados para este tipo de emenda em 2024, enquanto a cifra alcançava cerca de R$ 600 milhões em 2020.