O Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar, nesta quarta-feira (23), um recurso que pode definir a aplicação ou não da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/10) às eleições de 2010. O caso em questão envolve o indeferimento de registro da candidatura de Leonídio Bouças, do PMDB, à Assembleia Legislativa de Minas Gerais. A decisão tomada pelo TRE-MG, e mais tarde ratificada pelo TSE, teve como base um dos critérios de inelegibilidade previstos na Lei da Ficha Limpa: suspensão dos direitos políticos por improbidade administrativa.
O recurso de Leonídio Bouças, primeiro item da pauta do Plenário do STF desta quarta, será o terceiro relacionado à Lei da Ficha Limpa a ser julgado pelos ministros. Os dois outros casos, envolvendo Joaquim Roriz (PSC-DF), candidato ao governo do Distrito Federal, e Jader Barbalho (PMDB-PA), candidato ao Senado, tratavam do indeferimento de registro com base em outro item da lei, o que torna inelegíveis políticos que renunciaram a cargo para escapar de processo de cassação.
O recurso de Roriz acabou extinto em 29 de setembro passado, por perda de objeto, quando ele desistiu de concorrer ao cargo de governador. Cinco dias antes, após cerca de 11 horas de discussão, houve empate em 5 a 5 no julgamento. Um impasse quanto ao critério de desempate a ser aplicado levou à suspensão da sessão.
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Dessa forma, o primeiro caso a ser de fato decidido pelo Supremo foi o de Jader Barbalho. Em outra longa sessão, no dia 27 de outubro, foi registrado novo empate em 5 a 5. Porém, dessa vez, os ministros aplicaram o regimento da Casa para manter a decisão do TSE, que tinha sido pelo indeferimento do registro. Entretanto, o presidente da corte, ministro Cezar Peluso, ressaltou que a decisão valia apenas para os casos de renúncia para fugir de cassação.
Em ambos os casos, o empate foi possível porque havia uma cadeira vaga no Supremo, oriunda da aposentadoria do ministro Eros Grau, em agosto. No julgamento desta quarta, porém, a composição da corte estará completa, com a presença do ministro Luiz Fux, que tomou posse no último dia 3 de março.
Irretroatividade e anualidade
Os dois pontos que despertaram maior polêmica nos julgamentos dos recursos de Roriz e Jader foram os princípios da irretroatividade e da anualidade eleitoral. Os opositores da aplicação da lei já às eleições de 2010 argumentam que as restrições não podem abranger fatos ocorridos antes de sua publicação, em 4 de junho de 2010. Também alegam que a Ficha Limpa só produziria efeitos um ano depois de sua publicação, ou seja, em eleições realizadas a partir de 2011.
Por sua vez, os defensores da aplicação da lei às eleições de 2010 defendem que a inelegibilidade não é pena e que, portanto, não valeria o princípio da irretroatividade consagrado na lei penal. Acrescentam que o princípio da anualidade eleitoral diz respeito a alterações no processo eleitoral, o que não ocorreria no caso da Ficha Limpa, que apenas criaria novos requisitos de elegibilidade.
Nos dois julgamentos já realizados, votaram a favor da aplicação imediata da Ficha Limpa os ministros Carlos Ayres Britto, Cármen Lúcia, Ellen Gracie, Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski. Em sentido contrário, votaram os ministros Celso de Mello, Cezar Peluso, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio.
Como não se espera que esses ministros mudem de posição, provavelmente caberá a Luiz Fux definir a questão. Em declarações dadas ainda antes de tomar posse no STF, Fux elogiou a lei, por "conspirar em favor da moralidade administrativa". No entanto, ele ressaltou que não poderia ser manifestar sobre o caso concreto e que, para tomar uma decisão, teria de ler os autos e analisar os votos anteriores dos colegas.
O TSE já enviou ao Supremo mais de 30 recursos de candidatos tornados inelegíveis com base na Lei da Ficha Limpa. Quatro candidatos ao Senado obtiveram, em outubro, votos suficientes para garantir uma vaga na Casa, mas acabaram sem registro, nos termos da Ficha Limpa. Além de Jader Barbalho, ficaram nessa situação Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), João Capiberibe (PSB-AP) e Marcelo Miranda (PMDB-TO).