O relatório final da sindicância que investigou a venda irregular de passagens na Câmara mostra que os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes e Eros Grau foram vítimas do esquema que ficou conhecido como ''máfia das passagens''. Os dois viajaram com passagens retiradas das cotas dos deputados Fernando de Fabinho (DEM-BA), Paulo Roberto (PTB-RS) e Fernando Coruja (PPS-SC).
O presidente do STF e sua mulher, Guiomar, compraram com dinheiro próprio numa agência de turismo as passagens aéreas do trecho São Paulo-Nova York-São Paulo. Porém, os tíquetes foram retirados pela agência de viagem das cotas dos deputados Paulo Roberto e Fernando Coruja. O ministro Eros Grau viajou de São Paulo para o Rio de Janeiro e posteriormente para Brasília com passagens pagas pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) para ministrar a aula inaugural do primeiro semestre letivo de 2008. A passagem foi devidamente paga pela instituição de ensino, mas o bilhete na verdade pertencia à cota do deputado Fernando de Fabinho.
Sindicância da Câmara que apurou a irregularidade revelou que as agências falsificavam os bilhetes, suprimindo as informações sobre a forma de pagamento, para que os ministros não desconfiassem da origem das passagens. ''Os trechos de viagem destacados acima foram pagos com MCOs (crédito em favor de um cliente) de parlamentares, mas o bilhete encaminhado às autoridades judiciárias, excelentíssimos ministros Gilmar Mendes e Eros Grau, foi adulterado para fazê-los crerem que o custeio havia sido feito com recursos de outra natureza'', concluiu o relatório.
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As apurações e depoimentos ouvidos pela comissão mostraram que os assessores encarregados de requisitar as passagens para os deputados negociavam a venda das cotas de passagens para as agências Polo Turismo, Mania Tour e Capri. Uma ex-servidora da Câmara - Rosimere Gomes da Silva - confirmou em depoimento à comissão de sindicância que desde 2007 vendia créditos da cota parlamentar, sem mencionar a que deputado se referia.
Diante desses fatos, a comissão sugeriu a instauração de processo administrativo disciplinar para avaliar a conduta desses servidores. O resultado da investigação já foi encaminhado ao Corregedor da Câmara, deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA). No total, 44 processos disciplinares foram abertos. O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), proibiu a divulgação do relatório da comissão de sindicância, alegando questões jurídicas. Pessoas que tiveram acesso ao documento, no entanto, afirmam que 39 gabinetes estão envolvidos na venda de passagens.
A comissão, formada por três servidores do quadro da Câmara, não tinha poder para investigar os parlamentares, mas o documento apresenta indícios fortes do envolvimento de cerca de cinco deputados no comércio das passagens, ainda de acordo com os que leram o relatório. Os parlamentares serão investigados pela corregedoria e poderão responder a processo de perda de mandato por falta de decoro parlamentar no Conselho de Ética da Casa. Com base no relatório, o corregedor poderá optar por criar uma nova comissão para analisar o grau de participação de deputados na ''máfia das passagens''.
A comissão chegou a cinco operadores do esquema nas agências de turismo, segundo revelaram os que tiveram acesso ao documento. O resultado da investigação foi encaminhado ao Ministério Público Federal (MPF).