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Entrevista

"O futuro do Brasil não pode ser condenado à cadeia"

Mariana Franco Ramos – Redação Bonde
20 mai 2013 às 15:33

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Ariel de Castro Alves diz que, ao invés de mudar a lei, deveríamos cumpri-la -
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Assassinatos como os do estudante Victor Hugo Depmann, 19, em São Paulo, e do comerciante José Luiz de Souza, 53, em Londrina, ambos cometidos por menores de idade, reacenderam em 2013 o debate em torno da redução da maioridade penal e do aumento de tempo de internação para adolescentes em conflito com a lei.

Na opinião do advogado Ariel de Castro Alves, especialista em segurança pública pela PUC-SP, porém, a medida em nada contribuiria para diminuir a criminalidade. Um dos fundadores da Comissão Especial da Criança e do Adolescente do Conselho Federal da OAB, ele afirma que os jovens são, na verdade, mais vítimas do que autores de violência. E diz que a prevenção, por meio da implementação de políticas sociais, custaria muito menos que a repressão.

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Bonde - Sempre que um crime grave é cometido por um adolescente, a sociedade clama por medidas mais drásticas de repressão, como a redução da maioridade penal. Seriam os jovens vítimas ou agentes de violência?
As crianças e os adolescentes são mais vítimas do que autores de crimes. Em média, nove mil pessoas entre zero e 19 anos são assassinadas por ano, conforme o Mapa da violência. São 22 assassinatos por dia nessa faixa etária. Em 2012, foram 120 mil denúncias de abusos contra crianças e adolescentes feitas no Disque 100 (serviço da Presidência da República que recebe ocorrências de violações aos direitos humanos). Infelizmente, muitas vezes o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) só é lembrado quando os adolescentes se envolvem em algum crime. Poucos lembram da lei quando faltam vagas em creches e escolas, quando faltam cursos profissionalizantes ou tratamento de saúde, entre outras situações.

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Os adolescentes já são responsabilizados, mas com medidas socioeducativas. Eles não ficam impunes; vão cumprir penalidades que visam mais à ressocialização e à reeducação do que à punição. E, inclusive, ficam privados de liberdade quando cometem crimes com violência ou grave ameaça. A diferença é que, ao invés de ficarem "enjaulados" e ociosos, como os presos comuns, eles precisam ter atendimento psicológico, social, médico e atividades escolares, profissionalizantes, culturais, esportivas e de lazer. Nem sempre as instituições cumprem a lei, mas quando cumprem, os resultados são positivos e os jovens saem com novas perspectivas de vida. Ao invés de mudar a lei, temos que cumpri-la.

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Bonde - O que o senhor acha de propostas como a do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), que prevê o aumento do tempo máximo de internação de três para oito anos?
Essas propostas já foram feitas pelo governador em 2003, em 2005 e em 2012, após crimes que geraram clamor popular, mas só ficaram nos discursos. Existe muita demagogia e oportunismo em torno dessas discussões. Toda lei pode ser reavaliada a qualquer tempo, mas sempre é preocupante que legislações sejam impulsionadas pela emoção e pela revolta.


Cabe ao Congresso criar uma comissão especial, formada por especialistas na área da infância e juventude, para realizar essa revisão sobre o tempo de internação.  Entendo, pessoalmente, ser uma discussão pertinente, mas que deve ser multidisciplinar. Porém, oito anos de internação pode também ser considerado inconstitucional, porque a Constituição Federal prevê a "brevidade" da medida de internação.

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Bonde - E o que significaria, na prática, reduzir a idade penal para 16, 14 ou até 12 anos?
A redução da maioridade penal é medida enganosa. Só vai gerar mais crimes e violência. Teremos criminosos profissionais, formados nas cadeias, dentro de um sistema prisional arcaico e falido, cada vez mais precoces.


Aumentaria a violência, já que a reincidência no sistema prisional brasileiro, conforme dados oficiais do Ministério da Justiça, é de 60%. No sistema de internação de adolescentes, por mais crítico que seja, estima-se a reincidência em 30%. A Fundação Casa de São Paulo tem apresentado índices de 13%, mas (eles) não levam em conta os jovens que completam 18 e vão para as cadeias pela prática de novos crimes.

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Nas prisões brasileiras, temos 550 mil presos para 300 mil vagas. Além da superlotação, da presença de facções criminosas, falta atendimento de saúde, de escolarização, trabalho e assistência jurídica.


Entendo que se trata de medida ilusória, já que o que inibe o criminoso não é o tamanho da pena e sim a certeza de punição. No Brasil existe a certeza de impunidade; apenas 8% dos homicídios são esclarecidos. Precisamos de reestruturação das policias brasileiras e melhoria na atuação e estruturação do Judiciário.

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Bonde - A maioria das infrações graves cometidas por adolescentes, ao menos no Paraná, está relacionada ao tráfico de drogas. Como prevenir e combater esse problema?
Os governos devem cumprir o princípio da prioridade absoluta, através dos orçamentos e da criação de programas e serviços especializados de atendimento a crianças e adolescentes, próprios ou em parcerias com entidades. Programas de atendimento às famílias; enfrentamento ao abuso e exploração; erradicação do trabalho infantil; atendimento de drogadição; atendimento às vítimas de maus-tratos e violência; convivência familiar e comunitária e medidas socioeducativas (que garantam) oportunidades e inclusão.


Não é o jovem que é violento, e sim a família, a sociedade e o Estado. O último é responsável pela omissão nas políticas públicas básicas e na recuperação dos que já cometeram crimes.

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Bonde - E em relação aos outros países... O Brasil está mesmo na contramão do que discute a comunidade internacional, que tende a diminuir a severidade das respostas penais? Há quadros comparativos circulando nas redes sociais mostrando que a idade penal é de 10, 12, 8 anos em países desenvolvidos.
Na verdade, a maioria dos países adota como responsabilidade penal a idade de 18 anos, até porque reconhece a Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança, que prevê atendimento completamente diferenciado a crianças e adolescentes (zero a 18 anos) em relação aos adultos, quando do envolvimento em crimes. Porém, a idade de responsabilidade penal juvenil no Brasil é 12 anos. As informações que circulam são distorcidas.



Bonde - Que medidas devem ser implementadas para que os diretos previstos pela Convenção e pelo ECA sejam de fato assegurados?
O Estatuto gerou muitos avanços nos últimos anos em relação ao atendimento às crianças, mas, no atendimento aos adolescentes, o poder público deixa muito a desejar, principalmente nas áreas de educação, saúde e profissionalização. A prevenção, através de políticas sociais, custa muito menos que a repressão. O futuro do Brasil não pode ser condenado à cadeia.

Temos sim que prevenir: incluir e garantir oportunidades à juventude. Se o adolescente procura a escola, o serviço de atendimento para dependentes de drogas, trabalho e profissionalização e não encontra vaga, ele vai para o crime. O crime só inclui quando o Estado exclui.


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