Na manhã do dia 9 de julho, um sábado, Marcos Valério, o publicitário-lobista-laranja do mensalão, estava uma pilha de nervos. Em Belo Horizonte, sentia-se pressionado por todos os lados e, desesperado, telefonou para o ex-presidente da Câmara, o petista João Paulo Cunha, que estava em Osasco. Falaram-se por celular. "Eu vou estourar tudo", ameaçou Valério, descontrolado. Disse que não agüentava mais a situação e contou que faria a delação premiada - mecanismo pelo qual um réu diz o que sabe em troca de um alívio na pena. "Vocês vão se ferrar. Avisa ao barbudo que tenho bala contra ele", disse Valério, numa chantagista referência ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. João Paulo, que àquela altura se preparava para ir à reunião da cúpula do PT que acabaria chancelando o afastamento de José Genoíno da presidência do partido, entrou em estado de pânico.
Até aquele sábado, Valério tinha garantias de que nem a quebra de seu sigilo no Banco Rural revelaria suas operações. Tudo o que viria a público seriam os altos saques feitos numa agência do Rural em Belo Horizonte, e não se ficaria sabendo que o dinheiro fora efetivamente entregue na agência do Rural em Brasília. A identidade dos verdadeiros favorecidos pelo dinheiro, portanto, ficaria eternamente sob o manto do anonimato. Ele soube, no entanto, que tudo ia aparecer - e ficou desesperado com a idéia de que poderia ser preso. Na ligação para João Paulo, fez exigências abertas para poupar o governo. Queria duas coisas: a garantia de que não seria enjaulado e a chance de obter um dinheiro graúdo, e lícito, para assegurar seu futuro e o da família.
Uma maneira de ganhar esse dinheiro seria intermediando o fim da interminável liquidação do Banco Econômico, instituição que fechou as portas há dez anos. Como corretor da operação junto ao ainda dono do banco, o baiano Ângelo Calmon de Sá, Valério calcula que poderia amealhar uns 200 milhões de reais - soma equivalente à comissão de 20% sobre uma operação que, dependendo da forma como for encaminhada, poderá totalizar até 1 bilhão de reais. Nesse ambiente em que se fala de milhões como se dinheiro caísse do céu, é bom parar e pensar no que significam 200 milhões de reais. Dariam, por exemplo, para comprar, via mensalão, o apoio de uma centena de deputados por quase seis anos.
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Apavorado, o ex-presidente da Câmara avisou o ex-ministro José Dirceu e o ex-tesoureiro Delúbio Soares das ameaças de Valério, ainda na manhã de sábado. "O cara ficou louco, vai explodir tudo", disse. Em seu rol de chantagens, Valério ameaçou, inclusive, citar o nome de empresas que segundo ele teriam doado dinheiro não contabilizado, para ficarmos no jargão oficial, ao PT. Como prova de sua disposição em contar tudo caso não fosse atendido em seus pleitos, Valério ainda disse que tinha munição contra dois ministros recém-empossados: Saraiva Felipe, da Saúde, e Hélio Costa, das Comunicações, ambos do PMDB mineiro. Segundo Valério, os dois teriam usado sua lavanderia de dinheiro em campanhas eleitorais. Consultados por VEJA, os dois ministros negam veementemente a irregularidade.
O empresário Marcos Valério tinha motivos de sobra para seu desespero. A semana que se encerrava naquele sábado tinha sido particularmente difícil. No fim de semana anterior, a reportagem de capa de VEJA revelara que Valério avalizara e até pagara uma parcela de um empréstimo de 2,4 milhões de reais feito pelo PT no BMG. Pela primeira vez, aparecia uma prova material de sua ligação umbilical com o partido, derrubando sua versão de que era apenas amigo de Delúbio Soares.
Em Brasília, o presidente Lula passou a defender o afastamento de toda a cúpula do PT. Silvio Pereira, o secretário-geral, foi o primeiro a cair. No dia seguinte, caiu Delúbio. Valério começou a se preocupar com sua falta de interlocução dentro do PT. Para piorar, o deputado José Borba, então líder do PMDB na Câmara, afirmara que negociava cargos no governo com ele, Valério. O publicitário passou a temer que houvesse um movimento para jogar toda a responsabilidade sobre seus ombros.
Seu mundo estava desabando. Na quarta-feira, depois de depor na CPI, sua imagem tão característica, com sua calva absoluta, aparecia em todos os cantos do país. A CPI quebrara seu sigilo bancário e o de dez de suas empresas, levando seus sócios a culpá-lo fortemente pela falência iminente de seus negócios. Na sexta-feira, os acontecimentos se precipitam ainda mais, o homem da cueca é flagrado com 100.000 dólares, fica patente que José Genoíno deixará a presidência do PT no dia seguinte e que a disposição da nova cúpula do partido seria fazer uma devassa nas contas. Com os nervos à flor da pele, Valério fica atônito. Sua vida pessoal também estava despedaçada. Sua mulher, Renilda, fora duplamente surpreendida - com a profundidade da corrupção e as insinuações de um romance dele com uma ex-secretária.
>> As informações são do UOL e a reportagem é da revista Veja - que começa a circular na tarde desta sexta-feira.