Aceito pela OMS – Organização Mundial de Saúde, o "conceito de envelhecimento" já nos chama a atenção: "... o envelhecimento reduz a capacidade de adaptação às sobrecargas funcionais". Ou seja, em um trauma ou queda o risco de fraturas é maior; a resposta a uma infecção imunológica é inadequada; durante um quadro de anemia moderada já pode ocorrer uma descompensação cardíaca; e em caso de internamentos hospitalares mais prolongados podem ocorrer confusão mental e alteração de memória recente. Esses são apenas alguns dos exemplos de desadaptações agudas que podem ocorrer na terceira idade.
Porém, o que mais preocupa a nós, médicos, que trabalhamos com idosos, é a desadaptação crônica a que esses gerontos estão suscetíveis na sociedade atual, incapazes de se adaptarem ao mundo moderno, principalmente se imaginarmos que, no Brasil, a população jovem deve aumentar até 2025 cerca de 3 a 3,5% e a de idosos cerca de 100 a 150%, trazendo o caos ao sistema de saúde, previdência social e, principalmente, às famílias desses idosos "desadaptados".
O Brasil está entre os 10 países com maior número de pessoas acima dos 60 anos de idade. Hoje temos 17,6 milhões de brasileiros nessa faixa etária, ou seja, 9,7% da população atual está vivendo mais. Porém, não estamos conseguindo manter a qualidade de vida desses idosos. Apenas 20% deles, com mais de 75 anos, não apresentam nenhuma incapacidade para atividades diárias, como se vestir, banhar-se, realizar suas necessidades fisiológicas, preparar seus alimentos, entre outras. Não estamos nos referindo a aptidões esportivas, capacidade de manter o trabalho ou lazer, e sim a perda da independência e da capacidade de viverem sozinhos, sem auxílio de outras pessoas.
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Vale lembrar que a desadaptação tem, no processo natural de envelhecimento, um peso muito pequeno, e que os grandes responsáveis são as doenças crônicas, como por exemplo, a osteoporose, aterosclerose, diabetes, hipertensão arterial sistêmica, tabagismo e suas complicações pulmonares, obesidade abdominal e as demências, entre elas, a doença de Alzheimer.
Essas doenças crônicas começam a partir da terceira década de vida, fazendo com que estas pessoas não entrem na rota da senescência (envelhecimento fisiológico), mas sim na rota da senilidade (envelhecimento patológico).
Um dos problemas é que muitas dessas enfermidades não matam ou atingem fases mais avançadas, por isso não recebem o devido cuidado, não são valorizados pelos portadores e, às vezes, nem pelos seus médicos, acarretando graves incapacidades na terceira idade e levando a desadaptação. Com a evolução das drogas antivirais, os portadores de HIV irão apresentar menor perda funcional que os portadores de doenças advindas do tabagismo, principalmente devido às novas técnicas de tratamento das doenças cardiovasculares, podendo sobreviver, mas com grandes incapacidades e sofrimento para suas atividades de vida diária.
Dessa forma, fica claro que as mudanças de hábitos se fazem necessárias já na terceira década de vida. O tratamento eficaz baseado em evidências científicas das doenças crônicas, mesmo em suas fases iniciais, altera totalmente o curso natural da doença. Estudos médicos têm mostrado que um octogenário ativo apresenta a mesma funcionalidade de um sexagenário inativo, assim como o tempo que uma pessoa passa com sua doença crônica descompensada aumentará sua desadaptação ao envelhecer.
Esses dados nos mostram a importância da Medicina Preventiva, hoje baseada em evidências consolidadas cientificamente e que alteram a história natural das doenças crônicas, com alguns dados que se seguem:
1) Necessidade de reduzirmos a ingesta de gorduras saturadas e gorduras trans, assim como carboidratos simples, aumentando a ingesta de gorduras poliinsaturadas, vitaminas, minerais com ação antioxidante (varredores de radicais livres), e cuidados para não reduzirmos demasiadamente as proteínas animais, fator que acelera a sarcopenia (perda de força e massa muscular relacionada à idade) e a osteoporose.
2) Eliminação do hábito do tabagismo, sem dúvida a droga mais responsável por graves desadaptações e, mais que isso, grande sofrimento respiratório nos sobreviventes que atingirem a terceira idade.
3) Prática da musculação a partir dos 30 anos, única forma de trabalharmos as fibras brancas musculares, fibras responsáveis pela força – já que os exercícios aeróbios trabalham principalmente fibras vermelhas – responsáveis pela resistência, evitando assim a sarcopenia e mantendo a força que é a aptidão mais importante para as atividades de vida diária, como levantar de um vaso sanitário ou de um sofá, subir escadas e rampas, evitar quedas, carregar sacolas com compras ou ter o prazer de, aos 80 anos, levantar o neto do berço para poder abraçá-lo e beijá-lo, além de ser o único exercício comprovadamente eficaz na prevenção do tratamento da osteoporose.
4) Manutenção da atividade, trabalhando na profissão pelo maior tempo possível. Vários estudos de gerontologia têm demonstrado maior sobrevida dos idosos que trabalham, além da importância que a inserção social representa na vida dos idosos.
5) Manutenção dos relacionamentos familiares estáveis e saudáveis, também relacionados com a longevidade e a qualidade de vida.
6) Combate à obesidade visceral (abdominal) mantendo a circunferência do abdômen menor que 88 cm nas mulheres e 102 cm nos homens, pois isso duplica o risco cardiovascular.
7) A pressão arterial, independente da idade ou sexo, não pode exceder 130 x 85 mmHg e esses níveis devem ser atingidos e mantidos mesmo em hipertensos que necessitem uso de drogas antihipertensivas, lembrando que um estudo feito no ambulatório de hipertensão arterial sistêmica da USP demonstrou que apenas 25% dos hipertensos mantém-se controlados.
8) Os valores de colesterol LDL têm de permanecer abaixo de 100 mg/dl, HDL colesterol, acima de 40 em homens e 50 em mulheres; e triglicerídeos abaixo de 150 mg/dl, com glicemia baixa. Quaisquer níveis acima disso representam aumento do risco cardiovascular, principalmente se associados a outros fatores de risco como estresse, depressão, sedentarismo, obesidade, tabagismo e histórico familiar.
9) Realização de exames médicos periódicos a partir dos 30 anos, de preferência com um clínico geral de confiança e que possa lhe seguir ao longo da vida, pois Medicina é ciência que exige maior contato interpessoal. Principalmente os idosos formam uma população extremamente heterogênea. Somente um médico que conheça muito bem seu organismo saberá como, quando e até onde a terapêutica trará benefícios ao paciente.
10) Atenção às doenças que afetaram principalmente pais e irmãos (parentes de primeiro grau), pois muitas doenças têm caráter hereditário e determinados hábitos de vida ou medicações podem evitá-las. Quando isso não for possível, o diagnóstico precoce pode ser sinônimo de cura e menor incidência de complicações.
11) Atenção, a partir dos 50 anos, à sua memória e de seus entes queridos, pois das pessoas com declínio cognitivo leve, de 12 a 15% delas desenvolverão Doença de Alzheimer. Os estudos mostram que estamos diagnosticando essa doença de 3 a 5 anos após o seu início, o que interfere diretamente na resposta ao tratamento.
12) A genética é responsável por 20 a 30% de nossa expectativa de vida. O restante é por nossa responsabilidade e, se realmente nos amamos e amamos nosso cônjuge e filhos, temos que atuar ativamente para envelhecermos com qualidade de vida e não nos tornarmos desadaptados, com todos os transtornos afetivos e econômicos que esse quadro acarretará para nossas vidas.
Dr. Antonio Augusto de Arruda Silveira Junior
Especialista em Clínica Médica e Cardiologia e Pós-Graduado em Geriatria e Exercícios Físicos no Envelhecimento pela Faculdade de Medicina da USP. Médico responsável pelo Instituto Lyon de Curitiba (fone: 41 – 3242-3292).Autor dos livros "Pare de Envelhecer Agora – Nós não adoecemos porque estamos velhos, e sim, ficamos velhos porque estamos doentes" e "Musculação Aplicada ao Envelhecimento – O bem-estar não tem idade".