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Trafegar é Preciso por Luiz Renato Roble*

10 jul 2003 às 10:59

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É de manhãzinha e está saindo de carro com o motor frio. Tenta uma vez, tenta outra e, finalmente, na terceira tentativa ele pega. Na subida, o carro geme, sofre um bocado, mas acaba subindo. Pensa, engraçado, há pouco era um grande lançamento da indústria automotiva globalizada, agora, sinceramente, mais parece uma carroça.

Já no primeiro sinal, um flanelinha oferece seu prestimoso trabalho. Agradece com a cabeça e clica no botão subindo a janela rapidamente. Quem garante que ele não desejava limpar bem mais do que o pára-brisa? O isolamento acústico do vidro proporciona um certo alívio, enquanto a transparência permite que olhe a cidade à sua volta. Repara como está poluída. Como é possível tanta propaganda por metro quadrado?

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No segundo farol, uma mocinha uniformizada mascando chicles oferece um panfleto recém-impresso cheirando a óleo diesel. Como ela é bestial, aceita o folheto, lê e só depois é que se toca de que não precisa comprar um apartamento e não consegue entender por que se levantam tantas construções sem estilo.

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No próximo semáforo é a vez de um trombadinha. Sem ser convidado, tenta meter a cabeça pela janela querendo levar um trocado. É rápido, pisa no acelerador, e o trombadinha torna-se passado. No próximo sinal, farol, semáforo ou sinaleiro, escolha o que lhe for mais familiar, o que aparece? Um comerciante do mercado informal oferece uma grande promoção, compra duas laranjadas quentes e ganha uma morna! E La Nave Vá!

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Chega no escritório. No automático, liga o computador. Tenta entrar num mundo global, mais moderno, mais evoluído, mas a conexão está lenta. Tenta uma segunda vez. Deve ser o horário. Na terceira tentativa, finalmente, consegue acessar. Ao receber seus e-mails, o computador range, sofre, mas acaba finalizando. Pensa, há pouco tempo era um modelo tão rápido, agora, mais parece um XT8086.


Na sua caixa postal, tromba com um e-mail de alta periculosidade, o terror das listas de discussão, procurado mais morto do que vivo: o spam. Sem ser convidado, ele se mete em sua caixa de entrada, oferecendo um novo vírus. É rápido no gatilho, deleta, exclui e o tal spamer já é passado.

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Entra na Internet e começa a navegar pelas ondas da Web. Já no primeiro site, como mágica, uma janela apresenta ofertas imperdíveis, clica e vapt, ela desaparece rapidinho. Olhando o site à sua frente, começa a reparar como é poluído. Como é possível tanta propaganda por centímetro quadrado?


Num outro site, uma sensual top model cibernética oferece uma assinatura, ela é um avião, clica em "sim" e só depois é que percebe que não precisava assinar mais um jornal eletrônico. E justamente de um site assim tão sem estilo.

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No próximo site, website, home page ou sítio - escolha o que lhe for mais familiar -, um banner pulando alucinadamente oferece uma grande promoção: compre duas meias calças e ganhe uma meia taça! E La Nave Vá!


Estar na Internet está mais para trafegar do que para navegar. Estão presentes os engarrafamentos, que nos atordoam pela demora na transmissão de dados, lombadas eletrônicas que registram nossos passos pela rede, avenidas mal sinalizadas, que nos fazem rodar em círculos por sistemas de busca limitados, ruas sem saídas que nos deixam perdidos em sites mal criados, mal desenvolvidos, mal estruturados e confusos, com placas sinalizadoras mal posicionadas, que nos impedem de ver aquilo que gostaríamos de estar vendo e que clicamos, clicamos, mas acabam sempre voltando a aparecer nos cruzamentos.

O trânsito virtual está tão caótico que ninguém estranhará quando estivermos navegando, ou melhor, trafegando de acordo com um rodízio preestabelecido: dias pares, telefones com final ímpar, e dias ímpares para telefones com final par.


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