Outro assunto que causou revolta na edição atual do Big Brother Brasil foi a exclusão infligida ao ator, dramaturgo e poeta Lucas Penteado. Após desagradar outros participantes do programa, Penteado passou a ser marginalizado por alguns membros da casa. Mesmo após pedir desculpas, ele continuou sendo isolado, chegando ao ponto de ser impedido de fazer as refeições junto com os outros participantes, espelhando uma espécie de cancelamento ao vivo.
"Ele foi eleito para ser o inimigo. Isso é muito comum em movimentos de grupo, onde se elege alguém ou algo que passa a ser combatido. Então, todas as coisas ruins são projetadas nele”, explica o psicólogo clínico Sylvio Schreiner. Ele comenta que, por mais que isso ocorra também em outras circunstâncias sociais, quando o público vê, de forma escancarada, essa marginalização em um programa de grande alcance como o Big Brother, pode ser incentivado a refletir sobre práticas sociais semelhantes.
"É um ponto de partida, porque é aprendendo a falar sobre aquilo que nos incomoda que as coisas podem começar a ser entendidas e mudadas, transformadas”, pontua, alertando também para os perigos da discussão irrefletida. "Aquilo que se inflama demais, não pode ser aprofundado. As pessoas querem simplesmente se livrar, definir o que é certo e o que é errado, e não é assim que precisa funcionar”, conta.
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A socióloga Lina Ferreira também atenta para o alcance do programa. "A capacidade de mobilização que um reality show como o Big Brother Brasil tem não deve ser subestimada”, afirma. "O programa tem mostrado como o cancelamento é uma metodologia que gera injustiças e sofrimentos, em um processo em que o ‘cancelado’ não tem direito a resposta e que a única solução é o seu extermínio daquela comunidade”, diz.
"Mas, além disso, acho que o programa tem mostrado um lado dos ‘cancelados’ e dos ‘canceladores’ poucas vezes conhecidos por nós. Temos visto, então, que as duas figuras são pessoas reais, com belas e tortuosas trajetórias de vida, com famílias e amigos queridos, detentoras de carreiras de sucesso e reputações bem constituídas. Não são monstros, como pintam e são pintados”, explica a socióloga.
Outro problema do cancelamento é que mascara uma falsa sensação de mudança social. "Parece-me que o violento processo de exclusão impulsionado pelos cancelamentos, além de antidemocrático, nos dá uma falsa sensação de resolução do problema”, aponta Ferreira.
Schreiner também aponta para o risco desse extermínio arbitrário de perfis nas redes sociais, quando a medida não leva à transformação. "Mais do que definir o que é certo e o que é errado, é importante discernir aquilo que nos faz crescer, que nos faz expandir como pessoas, dentro de nossas casas, nossas cidades, nossas sociedades, daquilo que no fundo vai criando miséria, não só no sentido econômico e social, mas também em relação à qualidade de vida. É preciso que haja esse diálogo, mas não discursos inflamados”, conclui.
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(Parte 1): BBB 21 escancara disfunções ocultas que demandam soluções urgentes
(Parte 2): Em meio às lutas anti-opressão, militantes também incorrem em erros
(Parte 3): Política do cancelamento: a nova cultura da internet
*Sob supervisão de Fernanda Circhia e Luís Fernando Wiltemburg