Um bravo resgate das tão esquecidas lendas paranaenses tem sido a missão da artista plástica Cláudia de Lara no último ano. Um resultado parcial de seu difícil trabalho poderá ser conferido em Curitiba a partir de sábado, na mostra "Paiquerê", que permanecerá em exposição durante duas semanas no Café Capella.
São dez quadros em óleo sobre tela, alguns adornados com penas. Cada um deles retrata uma lenda indígena do estado e todos virão acompanhados por textos explicativos.
Os quadros registram lendas como a do "Gigante Adormecido", da Serra do Mar; a do "Itacunhatã", do Morro de Guaratuba; a das "Encantadas", da Ilha do Mel; das "Cataratas", de Foz do Iguaçu; e a "Lenda do Fogo", dos Campos Gerais. "Essa é a minha contribuição mínima para que estas lendas não se percam", afirma com modéstia.
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O que mais marcou Cláudia em seu árduo trabalho de pesquisa foi a absoluta ausência de uma literatura específica e a tristeza e o desânimo dos poucos pesquisadores no assunto. Ela se refere a especialistas como os professores Inami Custódio Pinto e Roselys Vellozo Roberjan, que estariam pouco otimistas com a continuidade do trabalho iniciado por eles. "Não há pessoas jovens se interessando por isso", comenta Cláudia.
Outra observação sua foi a de que os artistas plásticos contemporâneos pararam de pesquisar importantes assuntos, como as lendas, deixando de lado os valores culturais do Paraná. Ela diz ainda que os próprios paranaenses, incluindo os cablocos do estado, têm pouco ou nenhum conhecimento sobre tais lendas. "Quando eu comecei o trabalho fiquei encantada e me senti na obrigação de dar continuidade", diz.
Sua pesquisa aponta que as lendas paranaenses têm três origens distintas: indígena, portuguesa e africana. A opção por iniciar o trabalho pelas indígenas foi pelo principal motivo de que as outras são ainda mais difíceis de se obter informações. "Sobre as lendas africanas não há absolutamente nada", reclama.
O enorme preconceito em relação aos primeiros habitantes locais foi fortemente sentido pela artista durante as suas pesquisas. Ela compara à cultura e memória nordestinas que, segundo ela, "estão super vivas" e confessa que não consegue entender o descaso no Paraná. "Não que nossos nativos tenham sido menos criativos, mas nós não soubemos conservar a cultura popular", denuncia.
Além da pesquisa sobre as lendas, a artista está com outros dois novos projetos de resgate, nos quais já começou a trabalhar. Um é sobre as danças folclóricas paranaenses e o outro é sobre as autênticas brincadeiras das crianças paranaenses.
A maioria destas brincadeiras, segundo Cláudia, têm origem européia. "Percorrendo algumas escolas do estado já pude perceber que isto tudo ainda está muito vivo, as crianças ainda brincam muito", constata. Ela avisa que quando todas as pesquisas estiverem concluídas, deverá lançar uma publicação a respeito.
Curitibana, Cláudia iniciou seus estudos em artes plásticas há 17 anos. Desde 1990, tem apresentado suas obras com frequência em exposições coletivas e individuais. Além de produzir belas telas, a artista atua em outras frentes de artes visuais, como cenografia, figurino e painéis decorativos.
A Lenda da Serra do Mar
Conta a lenda que, em tempos remotos, de uma tribo que vivia à beira-mar, os Tambaquibas, um índio chamado Itá-Guaçu partiu em busca de terras desconhecidas, rumo ao longe onde o sol desaparece. Partiu sozinho, destemido, abrindo caminho na densa mata. Houvera prometido trazer douradas flores dos ipês, para enfeitar os cabelos negros de sua amada, Imira I"ra. O velho pajé da tribo, Paraná-Açu, advertiu Itá-Guaçu dos perigos que o esperavam para além das praias, mata adentro, onde seus amuletos e a força de sua pajelança seriam inúteis, neutralizados por Anhangá Andirá, aliado de Curupira, que não iria aceitar a invasão em seus domínios.
Itá-Guaçu nunca mais retornou. Um raio o atingiu e o transformou em itá-oca, uma muralha de pedra, um "gigante adormecido" a delimitar aquelas terras desconhecidas.
Imira I`ra chorou muito. Tornou-se triste, oprimida pela dor da saudade. Até que um dia, não suportando mais a ausência do amado, deixou-se picar por uma terrível aranha venenosa. Feneceu com os lábios em súplica e os olhos tentando vencer a distância que a separava de Itá-Guaçu. Depois disso, o velho pajé a transformou em Coema Pirá Piranga - aurora. Assim, todos os dias ela vem orvalhar a mata com suas lágrimas e afagar a cabeleira verde de Itá-Guaçu, na esperança de um dia despertá-lo.
Serviço: A exposição "Paiquerê" da artista plástica Cláudia de Lara será aberta no sábado, às 20 horas, no Café Capella (Rua Desembargador Westephalen, 2007, sala 44, em Curitiba). A mostra poderá ser vista até o dia 1º de dezembro. Maiores informações pelo fone 41-333-4535.