O Museu da Gravura de Curitiba inaugura nesta quinta-feira (16), às 19h, a exposição "Picasso", que reúne gravuras e cerâmicas do artista espanhol considerado uma das principais referências universais da Arte Moderna. As obras integram o acervo do artista curitibano Poty Lazzarotto, que os legou em testamento ao acervo da Fundação Cultural de Curitiba. São duas gravuras nas técnicas de água forte e água tinta, denominadas "Sonho e Mentira de Franco I e II", e duas cerâmicas cujas características remetem à escultura. A mostra poderá ser apreciada até o dia 08 de setembro.
As gravuras "Sonho e Mentira de Franco I e II", datadas de 08 de janeiro de 1937, integram a fase da obra de Picasso que culminou com o mural de Guernica, iniciado em maio daquele mesmo ano. Os trabalhos em cerâmica - técnica descoberta por Picasso nas duas últimas décadas de sua vida - mostram o artista livre, desvinculado de compromissos até com a própria obra. A proposta da curadora da mostra, professora Cassiana Lícia de Lacerda, é fazer um contraponto entre o Picasso tenso e surreal da guerra, com o Picasso livre e sempre consciente de que "a vida sem amor é inconcebível".
A mostra conta também com a exibição do vídeo "O Mistério de Picasso", sobre o ensaio artístico do cineasta Henri George Clouzot, e na abertura do evento, o professor Fernando Bini profere palestra sobre Picasso.
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Fase da guerra
As gravuras "Sonho e mentira de Franco I e II" (Sueño y mentira de Franco I y II) são acompanhadas do texto original escrito pelo artista para traduzir a força das imagens que satirizam o ditador espanhol Francisco Franco. As duas obras, compostas de 18 imagens, inauguram a chamada "fase da guerra" na obra de Picasso, desencadeada com o início da Guerra Civil espanhola, mais especificamente pelo choque provocado quando Madrid é bombardeada, em novembro de 1936.
Em 8 de janeiro de 1937, época em que vivia em Paris e fazia parte do círculo de artistas e escritores, junto com os poetas Éluard e Aragon, Picasso iniciou este conjunto de gravuras. O artista não podia ficar indiferente com o que se passava em seu país natal e atendeu ao texto "A Vitória de Guernica", que o poeta francês Paul Éluard publicou no jornal L´Humanité, com a convocação: "chegou o momento em que todos os poetas têm o direito e o dever de declarar que estão profundamente envolvidos na vida de outros homens e na vida comunitária".
Nas gravuras misturam-se a linguagem gerada pela indignação com a guerra e a crítica ao ditador, que leva seu sonho de grandeza às últimas conseqüências. Seu autoritarismo transformado em sonho transcende a verdade e a mentira. Numa das 18 partes de "Sueño y mentira de Franco I y II" - que têm uma ordem e um tempo, mas que também podem ser lidas independentemente da seqüência, uma vez que constituem uma única obra -, o ditador Franco, com seu bigode, é ridicularizado em meio a inúmeras deformações surreais que parecem uma manifestação infernal, ou lembram o grotesco do Rei Ubu, com a gesticulação de quem se oferece aos bombardeios.
Nas seqüências iniciais, o ditador aparece como um perverso rei cristão, paródia do legendário El Cid ou D. Quixote. Segue-se a visão de um soldado mourisco arrancando as entranhas de um cavalo - motivo de vários estudos para a Guernica. Em outra situação o ditador posa como Nossa Senhora, abanando-se com um leque. Em seguida, o busto de uma mulher - que para Picasso era o símbolo da arte e da perfeição - é mostrado esmagado pela picareta do ditador. O fato de Franco aparecer desvestindo uma mulher é a representação máxima da covardia.
Certas imagens das 18 seqüências das gravuras inspiraram outras obras, de 1937 a 1938, nas quais o artista explora cenas isoladas ou volta seu ataque contra a Igreja e os aristocratas ou àqueles que financiaram a guerra sonho-mentira de Franco, tais como: "Retrato da Marquesa", "Mulher Chorando", "Mulher Gritando ou A Suplicante", "Prostituta Cristã Jogando Moeda para o Soldado Mourisco", "Defensores da Virgem", "Mulher com Barrete e Vestido Quadriculado" e "Mulher Rezando".
Desenvolvidas antes e depois de Guernica, as gravuras "Sueño y mentira de Franco I y II" marcam a subordinação da técnica e do estilo como armas políticas do artista. Casten-Peter Warncke registra que quando o artista concluiu "Sueño y mentira de Franco I y II", tinha idéia de imprimi-las e vendê-las separadamente. Mas, abandonou este primeiro projeto optando por não separá-las, consciente de sua unidade. Assim, concebeu uma embalagem para as duas gravuras, anexou o texto manuscrito e colocou-as à venda, para angariar fundos em benefício de seus companheiros republicanos espanhóis.
O artista
Pablo Ruiz Picasso, nasceu em Málaga (Espanha), em 1881, e morreu em Mougins (França), em 1973. A evolução de sua obra manifesta-se em diversas etapas. Passou a sua juventude em Barcelona, onde desenhou em revistas, realizou exposições e fundou a Arte Jovem. Em 1904, instalou-se em Paris, onde conheceu Fernande Olivier, sua companheira durante sete anos. Nesse ano, grava a água forte "Refeição Frugal".
Os períodos mais marcantes de sua carreira são a Fase Azul (1901-1904), com quadros de um azul quase monocrômico, com personagens esquálidos e de expressão trágica ("O Guitarrista Cego"); a Fase Rosa (1905-1907), com uma temática menos trágica (comediantes e cenas de circo); a Fase Cubista (1908-1916), sinalizada pela obra "Les Demoiselles d’Avignon" e da qual Picasso e Braque são os principais representantes. De 1917 a 1927, Picasso passa pela fase Clássica, seguida pela fase Surrealista (1928-1932), com figuras esquematizadas ("Banhistas em Pé"); fase Expressionista (1937), período em realiza o famoso "Guernica", em preto e branco; época Vallauris, em que realiza enormes murais para o edifício sede da Unesco.
Em 1963 é inaugurado o Museu Picasso, em Barcelona. Em 1999, a terra natal do artista, Málaga, dedica-lhe o Museu Picasso, depois de serem criados museus dedicados à obra de Picasso em Paris e outras cidades da França.
Serviço:
Exposição "Picasso"
Local: Museu da Gravura de Curitiba (Centro Cultural Solar do Barão)
Data: de 16 de maio a 8 de setembro
Horário de visitas: de terça a sexta-feira, das 9h às 18h; sábados, domingos e feriados, das 12h às 18h
Entrada: franca
Informações: com duas gravuras e duas cerâmicas pertencentes ao acervo da Fundação Cultural de Curitiba. Ilustra a mostra o vídeo "O Mistério de Picasso", sobre o ensaio artístico do cineasta Henri George Clouzot. Na abertura da exposição, o professor Fernando Bini profere palestra sobre Picasso