A eliminação do câncer de colo de útero (ou câncer cérvico-uterino) nas Américas é uma das prioridades da OPAS (Organização Pan-americana da Saúde), que faz parte da OMS (Organização Mundial de Saúde), segundo o diretor-geral, Jarbas Barbosa.
A tarefa, no entanto, enfrenta dificuldades. Segundo ele, com a taxa de incidência da doença quase três vezes superior à meta de eliminação de quatro em cada 100 mil mulheres, a América Latina e o Caribe estão ainda longe de alcançar a eliminação.
“A eliminação do câncer de útero é uma das minhas prioridades como diretor da OPAS. Para este fim, fizemos o relançamento da iniciativa da eliminação de doenças em um esforço robusto para eliminar mais de 30 doenças, incluindo o câncer cérvico-uterino nas Américas para o ano de 2030. Esta iniciativa representa importante oportunidade estratégica e políticas para governos, sociedade civil, universidades, setor privado e comunidades trabalharem em conjunto e terem um impacto permanente em saúde”, apontou durante participação, por meio de vídeo, nesta quinta-feira (7), no encontro Vacina e prevenção do câncer: vários olhares, muitos desafios, para discutir a prevenção e os desafios da vacinação contra o Papilomavírus Humano (HPV), o rastreamento organizado, diagnóstico e tratamento do câncer do colo do útero.
Leia mais:
Pimenta diz não ver necessidade por ora de afastamento de Lula da Presidência após cirurgia
Com 1.176 casos de dengue, regional de Londrina lidera registros de dengue no Paraná
Lula evoluiu bem à cirurgia, está estável e conversa normalmente, dizem médicos
'Presidente encontra-se bem', diz boletim médico após cirurgia de Lula
Jarbas Barbosa informou que o câncer de útero é o terceiro mais comum entre as mulheres na região, onde cerca de 60 mil são diagnosticadas todos os anos. “Essa taxa extremamente elevada de câncer do colo de útero representa uma falha dos nossos sistemas de saúde. Temos evidências e ferramentas para prevenir o câncer do colo de útero e salvar as vidas das mulheres”, disse.
De acordo com o diretor, a pandemia da covid-19 atrasou muito a vacinação e o tratamento contra o HPV. “A pandemia de covid-19 levou a interrupções nos sistemas de saúde incluindo a imunização, acelerando assim o declínio da cobertura vacinal de muitas doenças evitáveis pela vacinação, por exemplo, no ano passado nenhum país das Américas atingiu a meta de 90% de cobertura vacinal contra o HPV, portanto o desafio permanece”, apontou.
O diretor segue ainda questionando: “Como podemos implantar estratégias não apenas para voltar onde estávamos antes da pandemia, mas ir adiante, fazer melhor e conseguir cobertura vacinal adequada”.
Barbosa contou que as vacinas contra o HPV estão disponíveis há mais de 15 anos. Além da imunização, a população tem à disposição os testes moleculares de HPV e o tratamento ablativo, no entanto, na avaliação dele, o maior desafio tem sido garantir que essas ferramentas sejam acessíveis e disponíveis de forma equitativa para todas as mulheres e meninas, especialmente, entre as populações mais vulneráveis.
Conforme o diretor, atualmente a OPAS trabalha em estreita colaboração com os países para elaborar estratégias de melhoria de sua cobertura inclusive por meio da coordenação de campanhas de imunização, das estratégias de planejamento, das alianças da vacinação com o setor da educação para oferecer vacinas nas escolas e auxiliando na transição para esquemas de dose única, como agora recomendado pela OPAS e OMS.
Apesar do cenário de dificuldades, Barbosa destacou avanços que já surgiram no combate à doença. “Já estamos observando melhorias nos programas contra o câncer de útero em relação às vacinas contra o HP. Estas já estão introduzidas em programas nacionais de 47 países e territórios nas Américas cobrindo 92% da nossa região. 27 países realizaram vacinação também em meninos contra o HPV no ano passado, mais da metade de todos os países que já introduziram a vacina contra o HPV”, observou.
Dose única
Uma das medidas que podem agilizar o processo de cobertura vacinal contra o HPV é a aplicação de dose única, que teve declaração de apoio da OMS e é vista como uma oportunidade para alcançar uma cobertura mais elevada. “Até agora 11 países das Américas já adotaram o esquema de dose única. Dessa forma parabenizo o Ministério da Saúde [do Brasil] pelos esforços para iniciar o caminho da recuperação após impacto negativo produzido pela pandemia”, acrescentou.
Antes da pandemia, o Brasil tinha cerca de 67% de cobertura vacinal completa e no ano passado foi reportada uma cobertura de 58% de vacinas contra o HPV. “Estamos confiantes de que o Brasil se recuperará e superará as suas taxas de cobertura pré pandemia com o compromisso forte do governo federal, do Ministério da Saúde, dos governos estaduais, dos governos municipais, vai alcançar sem dúvida alguma a taxa de vacinação de 90% até 2030 que é a nossa meta”, relatou.
Mesmo com a importância da vacinação, o diretor alertou que somente ela não eliminará o câncer do colo de útero, o rastreamento e o tratamento também são essenciais. “Os programas de rastreamento baseados em citologia estão em vigor na maioria dos países há mais de 40 anos, mas deficiências nas estruturas laboratoriais, na formação de pessoal e equipamentos, bem como, desafios logísticos. As limitações desses testes têm dificultado gravemente a sua capacidade de reduzir a mortalidade por câncer do colo de útero”, afirmou.
“Pode ser um grande desafio, mas chegou a hora de mudarmos os programas tradicionais de rastreamento baseados em citologia para abordagens mais simples com testes mais eficazes de HPV e tratamento ablativo”.
De acordo com o diretor, a OPAS oferece testes de HPV e dispositivos de tratamentos ablativos por meio do seu Fundo Estratégico que apoia os países fornecendo compras em grande quantidade de produtores qualificados e a um preço acessível independentemente da compra de cada país.
“Participar dessas compras do Fundo Estratégico é uma demonstração concreta de solidariedade, porque facilita para países de pequena população poder desfrutar do mesmo preço que um país de grande população poderia obter negociando com os produtores destes testes. Continuaremos a promover a utilização desse mecanismo subutilizado para aumentar o acesso e a disponibilidade de tecnologias de rastreamento organizado e de tratamento de lesões precursoras”, assegurou.
Países-membros
Conforme explicou, para recolocar a região no caminho certo, a OPAS trabalha em estreita colaboração com países-membros para introduzir o teste de HPV em serviços de atenção primária em saúde.
“Três países têm programas nacionais de rastreamento baseados nos testes moleculares de HPV e vários outros estão testando essas novas tecnologias com o objetivo de expandir a sua utilização em nível nacional, mais uma vez parabenizo o Ministério da Saúde do Brasil pelo reconhecimento ao trabalho que vem sendo desenvolvido no estado de Pernambuco no projeto de introdução do teste de HPV para rastreamento organizado como política pública no país”.
Barbosa elogiou ainda o Ministério da Saúde do Brasil pelo recente lançamento da campanha de eliminação do câncer do colo de útero pela Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), o que demonstra preocupação da pasta em atingir as populações mais vulneráveis e acometidas por esta doença.
O desenvolvimento de um teste de HPV para o Brasil também é bem-visto por ele, porque mostra o compromisso das partes interessadas em abordar, de forma sustentável, uma estratégia de apoiar os esforços de eliminação da doença no Brasil. “Espero que muito em breve possamos ter este teste molecular de HPV produzido no Brasil sendo oferecido pelo Fundo Estratégico da OPAS para todos os países da região, o que será uma grande contribuição do país para a eliminação do câncer do colo de útero”, completou.
“Devido ao alto comprometimento das partes interessadas e à forte vontade política no Brasil, tenho certeza de que o país será capaz de atingir as metas de 90% de cobertura com, pelo menos, uma dose de vacina contra o HPV, 70% de cobertura para testes de HPV em mulheres e 90% de cobertura para tratamento. Esse é o momento de trabalharmos ainda com mais afinco a Opas e o Ministério da Saúde do Brasil, todos os componentes do Sistema Único de Saúde do país, para que possamos avançar com esse grande objetivo de eliminar o câncer cérvico-uterino no país e na região das Américas”, concluiu.
A secretária da SVSA/MS (Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde), Ethel Leonor Noia Maciel, que representou a ministra Nísia Trindade no encontro, reforçou que a vacinação contra o HPV e outras doenças é uma prioridade da pasta.
A secretária destacou ainda a nova metodologia lançada pelo Ministério junto com a OPAS, chamada de microplanejamento, na qual as equipes desenvolvem ações em todos os estados e no Distrito Federal, formando multiplicadores para poder entender quais são as barreiras em cada local para a execução da vacinação no território brasileiro. “Nós repassamos R$151 milhões para estados e municípios para que eles pudessem focalizar e trabalhar nessas barreiras específicas. Em alguns lugares essas barreiras eram muito simples, uma caixa térmica, um gerador, um barco, a contratação de pessoal. Cada local teve a oportunidade e o financiamento para que pudesse ultrapassar as barreiras e fazer com que a vacina pudesse chegar onde precisa: no braço da população brasileira”, revelou.
Prosseguindo, ela lembra que a vacina contra HPV foi muito combatida e sofreu onda de informações mentirosas, como se aplicação fosse uma iniciação precoce da vida sexual.
Por fim, Ethel destacou o grau de violência contra mulheres e crianças que são estupradas no país, muitas delas por integrantes do seu núcleo familiar. “Nós fizemos mudanças importantes no Programa Nacional de Imunizações colocando essa vacina para vítimas de violência sexual”, contou. “Cada vez mais estamos prontos e abertos para colaborar e para que possamos transformar a saúde da nossa população porque é isso que todos nós queremos”.