Quem já não entrou em uma farmácia e comprou facilmente um antibiótico sem receita médica? A prática é comum no Brasil, mas a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) quer mudar esse cenário, propondo medidas restritivas para prescrição e comércio dos antibióticos orais e injetáveis. Uma das propostas é a retenção da receita para a venda desses medicamentos, assim como já acontece com os psicotrópicos.
O objetivo é acabar com o problema da automedicação de antibióticos e contribuir para a redução da resistência bacteriana na comunidade. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 50% das prescrições desses medicamentos no mundo são inadequadas. Só no Brasil, o comércio de antibióticos movimentou, em 2009, cerca de R$ 1,6 bilhão, segundo relatório do instituto IMS Health.
A Anvisa abriu, no último dia 18, consulta pública para implantar medidas de controle do comércio de antibióticos no País. Nesta semana, foi realizada uma audiência pública para discutir o assunto.
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As propostas incluem a exigência de receita de controle especial em duas vias, a apresentação e retenção de uma via da receita no ato da compra, e rótulo e bula com a frase ''Venda sob prescrição médica - só pode ser vendido com retenção da receita''. Também está sendo proposto o controle eletrônico da movimentação (entradas e saídas) de alguns antibióticos (azitromicina, sulfametoxazol, amoxicilina e cefalexina) nas farmácias e drogarias do setor privado pelo Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC).
Facilidade
O Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) constatou a facilidade de se comprar antibiótico sem receita em 104 farmácias, espalhadas em dez estados brasileiros. Em nota enviada pela assessoria de imprensa, o órgão informa que comunicou a Anvisa e cobrou solução para o problema, mas entende que o rigor deve valer para todos os medicamentos de tarja vermelha.
A opinião é compartilhada pelo cardiologista Manoel Fernandes Canesin, presidente da Sociedade Paranaense de Cardiologia e membro da Sociedade Paranaense de Clínica Médica. ''Hoje o indivíduo não vai ao médico e compra o que quiser na farmácia, com exceção dos psiquiátricos. Esse é um grande problema de saúde pública'', afirma.
Ele considera que o custo da automedicação sai alto para a saúde pública. ''As pessoas têm dor de garganta e vão à farmácia comprar um antibiótico quando na verdade nem precisariam disso, talvez um antiinflamatório resolveria. O risco é a pessoa criar resistência contra esse antibiótico e quando precisar realmente tomar esse medicamento ele poderá não fazer efeito. Ou então, será necessário receitar um mais forte'', esclarece.
Canesin acha correto a exigência de receita em duas vias não só para os antibióticos como para os demais medicamentos, com exceção de analgésicos simples, alguns colírios e antiinflamatórios. Ele alerta, porém, que a discussão deve envolver também a questão do limite de consultas dos planos de saúde.
Necessidade
Para Airton José Petris, coordenador do curso de Farmácia da Universidade Norte do Paraná (Unopar), o controle do comércio de antibióticos é uma necessidade da sociedade. ''Além do risco individual, o uso indiscriminado desses medicamentos contribui para que a população de bactérias se torne mais resistente'', alerta.
Na opinião de Ademir Vejam, gerente comercial da rede de farmácia Senador, com seis lojas em Londrina, o maior rigor na comercialização de antibióticos é bem-vindo. ''Do ponto de vista financeiro, as exigências podem interferir no faturamento de algumas farmácias que vendem medicamento de forma indiscriminada. Mas o estabelecimento que já trabalha com consciência profissional não terá prejuízo financeiro'', observa. O gerente admite que a rede que gerencia vende determinados antibióticos sem receita médica, mas desde que haja uma avaliação do farmacêutico de plantão.
Propostas da Anvisa
- Exigência de receita de controle especial em duas vias.
- Apresentação e retenção de uma via da receita no ato da compra.
- Rótulo e bula com a frase ''Venda sob prescrição médica - só pode ser vendido com retenção da receita''.
- Controle eletrônico da movimentação (entradas e saídas) de alguns antibióticos (azitromicina, sulfametoxazol, amoxicilina e cefalexina) nas farmácias e drogarias do setor privado pelo Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC).