Discutir um assunto com outra pessoa antes de tomar uma decisão só vale a pena se a conversa for franca e se ambos os interlocutores tiverem o mesmo nível de competência, mostra estudo publicado na edição desta semana da revista Science. É especialmente importante que as incertezas de cada um sejam compartilhadas. Se a comunicação não for boa ou se um dos debatedores entender muito menos do assunto que o outro, o melhor é decidir sozinho.
Para chegar a essa conclusão, cientistas liderados por Bahador Bahrami, do University College London, submeteram pares de voluntários a um teste em que tinham de observar uma tela cinza em dois intervalos de tempo e, então, decidir em qual desses intervalos um alvo havia aparecido na imagem. Quando apresentado, o alvo se mantinha visível por apenas 85 milissegundos. Cada participante tinha uma tela própria.
O teste foi realizado em quatro modalidades diferentes, o que permitiu aos pesquisadores controlar tanto o grau de comunicação entre os voluntários - em uma modalidade, eles só podiam informar um ao outro quando acreditavam ter visto o alvo, sem mais elaboração - e, também, o grau de "competência" de cada um, inserindo interferências na imagem que efetivamente tornavam um dos membros do par menos capaz de tomar a decisão correta que o outro.
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Cada par de voluntários tomou parte em várias rodadas do experimento, o que permitiu produzir uma série de índices de sucessos e fracassos.
A conclusão foi de que a taxa de sucessos das duplas só superou a obtida pelo membro "mais competente" sozinho quando o grau de competência de ambos os participantes era próximo, e os dois tinham a oportunidade de se comunicar livremente - sendo fundamental a troca de informação sobre o grau de confiança de cada um no próprio palpite.
Quando os graus de competência eram muito diferentes, nem mesmo a comunicação franca ajudava a tornar a decisão melhor. Nesse caso, a "ditadura do mais competente" se revela a melhor estratégia. Perguntado pelo estadão.com.br sobre se esse resultado indicaria que decisões democráticas tendem a ser de baixa qualidade, Bahrami destacou o valor da educação.
"Com educação, que eleva os membros menos competentes para que alcancem os melhores, a melhor estratégia automaticamente muda para formas mais democráticas de votação", disse ele.
O pesquisador reconheceu ainda que seu estudo não leva em conta situações onde a "decisão correta" pode não ser clara, mas fez a ressalva de que esse tipo de conjuntura foi simulado em uma das modalidades do experimento, na qual as duplas não eram informadas, ao fim de cada rodada, se sua decisão conjunta tinha estado certa ou não. "Nossos resultados mostraram que, mesmo neste caso, o benefício coletivo aparece".
O estudo também não tratou de situações onde os membros da dupla sabem claramente que um deles é mais competente a respeito do assunto discutido - por exemplo, numa conversa entre paciente e médico. Mas Bahrami disse que, em um ou dois casos observados durante o estudo, os participantes notaram o desnível de competência entre eles e conseguiram tirar benefício do fato.
Em comentário a respeito do trabalho, também publicado na Nature, o pesquisador Marc Ernst, do Instituto Max Planck, exemplifica a aplicação do resultado de Bahrami em que um jogo de futebol que tenha dois árbitros que, seguindo as conclusões do estudo, poderiam cooperar de forma a decidir lances duvidosos de forma melhor do que cada um deles seria capaz, atuando sozinho. "Mas se seria factível ter dois árbitros negociando cada decisão é outra história", ressalva.
O próximo passo da pesquisa de Bahrami, em 2011, será determinar o que acontece quando um dos participantes da decisão tem motivos para mentir sobre seu nível de incerteza - se está tentando impressionar ou se impor sobre o outro, por exemplo. "Espero ter a resposta para isso em breve", disse.