Sobre Cruz e Sousa
Cisne
Vagueia, ondula, indomado e belo,
um cisne insone em solitário canto.
Revolve à margem a plumagem negra,
em meio a um bando de pombas atônitas.
Encontra um outro, de alvacentas plumas,
um ser sagrado no monte Parnaso,
e enquanto o branco vai vencendo a bruma
ele naufraga, bêbado de espaço.
Em vão indaga, o olhar emparedado
na vertigem da luz que o sol encerra:
"Se em torno tudo é treva, tudo é nada,
como sonhar azul em outra esfera?"
Negro cisne sangrando em frente a um poço.
Do alto, um Deus cruel cospe em seu rosto.
Antônio Carlos Sechin é doutor em Letras, professor titular de Literatura Brasileira da Faculdade de Letras da UFRJ, e um dos maiores poetas brasileiros da atualidade.