O Brasil não tem muito o que comemorar neste 8 de março, Dia Internacional das Mulheres. Em 2022 o país bateu recorde em casos de feminicídio. Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública indicam que, no primeiro semestre do ano passado, 699 mulheres foram mortas por essa condição: ser do sexo feminino.
O Paraná seguiu a tendência de alta. No ano passado os casos de feminicídio tentados ou concretizados cresceram 30% no estado. De acordo com o Ministério Público do Paraná foram 274 registros contra 212 em 2021. As denúncias de violência doméstica também aumentaram em território paranaense: 44.493 em 2022 contra 42.539 no ano anterior.
A professora do curso de Direito do UniCuritiba, Adriana Martins Silva, analisa os números e explica como identificar relações abusivas e que colocam em risco a vida das mulheres. “A desigualdade de gênero é estrutural e para que esse cenário seja alterado ou reduzido é necessária a adoção de práticas sociais transformadoras, que impactem na prevenção de violência contra as mulheres.”
De acordo com a doutoranda em Direito e advogada na área da família, a situação se agravou durante a pandemia. “No decorrer do isolamento social, os casos de agressões físicas, violência psicológica e violências patrimoniais aumentaram, principalmente, por causa do convívio e do estresse familiar, da maior dificuldade econômica das famílias e da dependência financeira de inúmeras mulheres”, comenta.
Outro problema, continua a coordenadora do Grupo de Pesquisa e Extensão “Temas Contemporâneos de Direito de Família” do UniCuritiba foi a redução significativa de acesso aos canais de comunicação das mulheres com os órgãos públicos de defesa e com os meios de contato com a rede de proteção.
Lei do Feminicídio
Criada há 8 anos, em 9 de março, a Lei 13.104, conhecida como Lei do
Feminicídio, alterou o Código Penal e trouxe avanços. O principal deles é
a diferenciação entre os crimes comuns e os crimes motivados pela
questão de gênero. Além de prever o feminicídio como circunstância
qualificadora de homicídio, o crime contra as mulheres entrou no rol de
crimes hediondos.
Na prática, ensina a professora do UniCuritiba,
a lei permitiu que a polícia civil investigasse os crimes contra a
mulher de forma mais específica. “As autoridades policiais passaram a
identificar de forma mais apurada os crimes de homicídio que foram
motivados pelo menosprezo à mulher, ou seja, ficou mais fácil fazer a
observação das estatísticas, a prevenção e a contenção dos crimes de
feminicídio.”
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Violência dentro de casa
Um estudo feito
pelo ISP (Instituto de Segurança Pública) mostra que a maioria das
vítimas de feminicídio (59%) é morta pelo companheiro ou ex-companheiro.
Os crimes cometidos dentro de casa também chegam a 59%. O Dossiê Mulher
traz dados do Rio de Janeiro, mas a situação é semelhante em todo o
país.
A advogada Adriana Martins lembra que o feminicídio não é a
única forma de violência contra as mulheres. “De acordo com a Lei Maria
da Penha estão previstas a violência física, psicológica, sexual,
patrimonial e moral. Normalmente, a violência contra a mulher inicia seu
ciclo em ‘imperceptíveis’ comportamentos, como ciúme excessivo,
comentários depreciativos, cerceamento dos vínculos familiares e de
amigos, monitoramento de redes sociais e telefonemas, controle das
vestimentas e gostos.”
Segundo a professora, essas micro
violências repercutem nas tipificações criminais como, por exemplo, a
prática de injúrias, difamação, ameaça, práticas de vias de fato e lesão
corporal, culminando na destruição de objetos, furtos, estelionato ou
ainda violência sexual e, por fim, a concretização do feminicídio.
Relacionamentos abusivos
Identificar
e quebrar o ciclo de violência nem sempre é fácil. Adriana Martins diz
que a demora no rompimento dos relacionamentos abusivos se deve a três
fases da violência doméstica.
1. Fase de tensão: o agressor
apresenta pequenos sinais de violência e a vítima passa a ter medo de
deixá-lo desestabilizado, tem sentimento de culpa e a sensação de que a
situação poderá melhorar.
2. Fase de Ato de Violência: é o ápice
da violência propriamente dita, ou seja, o agressor concretiza os
diversos tipos de violência. Nesta fase, as mulheres altamente
fragilizadas sentem a necessidade de buscar ajuda.
3. Fase do
Arrependimento: o agressor pede desculpas e faz promessas na tentativa
de continuar no controle da situação. Esta fase é conhecida como “lua de
mel”, em que a mulher acredita que houve uma mudança verdadeira e que a
situação ficará melhor.
Enfrentar e romper esse ciclo é
essencial, alerta a professora. “As situações de violência devem ser
estancadas logo na primeira fase, para que não ocorra a intensificação
até a última fase, culminando com a morte.”
Como denunciar a violência
Mulheres
em situação de violência devem procurar a Delegacia da Mulher em seu
município ou qualquer outra unidade policial. Existe ainda a
possibilidade de fazer o Boletim de Ocorrência de forma on-line.
Outra
orientação da advogada Adriana Martins é alertar os parentes e amigos,
formando uma rede de apoio e proteção. “As medidas protetivas podem ser
solicitadas no ato do registro da ocorrência na Delegacia Especializada,
Defensoria Pública ou no Ministério Público.”
Em casos de
situação em flagrante, a mulher em situação de violência ou qualquer
outra pessoa que presenciar o ato pode acionar a Polícia Militar pelo
190. As mulheres também encontram orientações na Central de Atendimento à
Mulher, no 180.