No trecho de cerca de 400 metros da Rua Barão de Itapetininga, no coração de São Paulo, fica uma das principais concentrações de idosos por metro quadrado do Brasil. Eles trabalham como plaqueiros ou na distribuição de folhetos. A maioria é de aposentados que voltaram ao mercado de trabalho para recompor a renda. Ficam emparelhados, espalhados, agrupados. Difícil dar meia dúzia de passos sem encontrar com um senhor grisalho que responde, prontamente: "Sou aposentado, mas com a aposentadoria não dá para pagar as contas".
A rua, conhecida pela concentração de agências de emprego, traduz para a vida real os números apresentados na pesquisa do Instituto Análise, feita para o Estado, que ouviu 1 mil pessoas em todo o País. Para cerca de 70% dos entrevistados, "o brasileiro nunca se aposenta". Mesmo quando consegue o benefício do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), tem de voltar ao mercado de trabalho ou ser sustentado por alguém porque o dinheiro é insuficiente.
"É um fato, é a realidade. Ou o aposentado é sustentado ou vai ter de trabalhar. Com a aposentadoria, a renda cai, independentemente da classe social", diz Alberto Carlos Almeida, diretor do Instituto Análise.
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O paulista José Manoel dos Santos, de 74 anos, combina os trajes elegantes e o chapéu branco com o colete de vinil vermelho onde anuncia "Compro ouro, prata, brilhante...". Aposentado desde 1996, Santos voltou a trabalhar em seguida. Ele recebe R$ 987 do INSS. Como plaqueiro, ganha mais R$ 500. Com o dinheiro, sustenta boa parte das despesas da casa, que divide com a mulher (aposentada, que recebe um salário mínimo) e uma filha (do total de cinco), que está desempregada há três anos.
Só de aluguel Santos gasta R$ 600, mais uns R$ 300 na farmácia. O aposentado depende de medicamentos de uso contínuo desde que implantou pontes de safena e marcapasso. Consciente de que a idade tomou boa parte do vigor, ele admite, com certa tristeza, que uma hora terá de deixar as ruas e ficar em casa com uma renda menor. "É o jeito. Um dia terei de me sujeitar a viver só com a aposentadoria", diz.
A lida começou cedo. Aos 16 anos, quando chegou em São Paulo, começou a trabalhar como quebrador de cocos em uma fábrica de doces. Já foi zelador, metalúrgico, segurança e office boy. Quando está a postos na Barão de Itapetininga e as pernas já não têm forças para aguentar o esforço, Santos se senta no banquinho de madeira e continua o trabalho. Estica o colete e faz a propaganda para a loja de joias usadas.
A jornada, assim como a da maioria dos plaqueiros aposentados da Barão, começa às 8 horas e vai até às 18. Com chuva, sol forte, inverno rigoroso. Lá estão os senhores e algumas senhoras da Barão.
Maria dos Anjos Fernandes, de 58 anos, era copeira na Igreja São Francisco, no centro da cidade. O salário era de R$ 700. Há três anos veio a decisão de se aposentar e agora ganha R$ 465 do INSS, valor do salário mínimo. Com a renda não teria condições de pagar o aluguel e o condomínio do apartamento onde mora, na Santa Ifigênia. Três meses depois de se aposentar se deu conta que o dinheiro era insuficiente. Tentou outros bicos até parar há dois anos na Barão de Itapetininga. "Se ganhasse R$ 1 mil não estaria nas ruas até hoje", lamenta.
Depois de anos de trabalho, o sonho de Maria dos Anjos era um dia ter dinheiro para conhecer as Cataratas do Iguaçu. "Nesses anos todos não consegui conhecer e agora, como aposentada, ficou ainda mais difícil", comenta. Todos os dias ela sai de casa por volta das 7h30 com o banquinho de plástico debaixo do braço e se instala em um pedaço do calçadão. Arma uma banquinha e recebe os currículos que mais tarde serão encaminhados a uma agência de empregos. Só interrompe o trabalho para um lanche rápido. Ganha, assim como a maioria, pouco mais de um salário mínimo.