O programador Ernani Marcelino Wentland ficou surpreso ao descobrir que seu nome constava no órgão de proteção ao crédito - Serasa, quando negociava a compra de um terreno. Sem saber exatamente a razão da restrição, Ernani procurou imediatamente o órgão para conhecer o motivo. No Serasa, foi informado que um cartório do Rio de Janeiro tinha feito a solicitação da restrição. Ao entrar em contato com o cartório, o programador soube que um título em seu nome estava sendo protestado por uma empresa de cobrança do Estado do Rio de Janeiro.
Foi só então que Ernani descobriu que o motivo da inclusão de seu nome no cadastro de devedores era um cheque de R$ 60, dado em 2002 para pagar uma compra de supermercado. ''Na época o cheque retornou e eu entrei em contato com a empresa para ressarci-la. No entanto, eles me informaram que o tinham enviado à matriz e que eu deveria aguardar a notificação para efetuar o pagamento. Isso nunca aconteceu, a empresa até já mudou de direção e eu nunca mais vi esse cheque. Só agora soube que ele estava sendo protestado por uma empresa carioca'', relata.
O advogado Fernando Sasaki tem sido procurado para representar vários casos dessa natureza em Londrina. Segundo ele, o consumidor tem ciência da restrição de seu nome geralmente durante um procedimento financeiro, como aquisição de empréstimo bancário, ou durante ações que demandam investigação de sua condição pregressa. ''Como as pessoas têm urgência em efetivar a transação, elas acabam recorrendo a essas empresas de cobrança e fazendo o pagamento pelos débitos atrasados incidindo margens exorbitantes de juros e de forma irregular'', alerta Sasaki.
Leia mais:
Um terço das famílias brasileiras sobreviveu com renda de até R$ 500 por mês em 2021, mostra FGV
Taxa de desemprego no Brasil cai para 9,8%, segundo IBGE
Termina nesta terça o prazo para entrega da declaração do Imposto de Renda
Número de inadimplentes de Londrina cai 14% em abril, segundo dados do SPC
A irregularidade neste procedimento ocorre pois a grande maioria destes cheques protestados já estão com seu prazo de cobrança prescritos, ou seja, não podem mais ser cobrados nem mesmo judicialmente, informa o advogado. ''O prazo para um cheque ser protestado e justificar a restrição do nome da pessoa é o mesmo da apresentação, ou seja, de 30 dias, ou 60 dias se ele estiver fora da praça. Passado o prazo, nenhum nome pode ser incluído no Serasa por esse motivo. Nos próximos meses, a empresa tem até cinco anos para cobrar o pagamento judicialmente, por meio de processo cognitivo, pois após os cinco anos todas as dívidas são prescritas'', explica.
No caso de Ernani, entre a data que o cheque foi dado até o seu protesto passaram-se sete anos. ''Não entendo porque a empresa não me procurou antes, assim como eu me empenhei em reaver o cheque. Essa cobrança veio anos mais tarde e agora só está complicando a minha vida'', relata Ernani. Pelo cheque de R$ 60, a empresa de cobrança carioca quer o ressarcimento de R$ 400, pagos de forma integral, isso significa um acréscimo de R$ 340 por um cheque que nem mesmo pode ser cobrado hoje.
O advogado explicou que esse tipo de ''golpe'' é possível pois as empresas de cobrança adquirem esses cheques devolvidos e os transformam em letras de câmbio. As letras de câmbio podem ser protestadas em outros estados e os cartórios não têm obrigação de verificar a data do cheque que a originou para constatar a sua prescrição. A única notificação feita para o devedor é por meio de edital. Como o consumidor não lê editais, muito menos de outros estados, acaba não tendo ciência no exato momento de que está sendo protestado e de que seu nome consta no órgão de restrição ao crédito. A surpresa vem mais tarde, no momento em que a pessoa mais precisa de crédito. ''É ai que o plano das empresas cobradoras entra em ação e ocorre a extorsão'', alega Sasaki.
Para não cair nesta armação e acabar pagando por algo que já passou do período de cobrança judicial, o advogado recomenda que o consumidor siga alguns passos simples. Primeiramente é preciso descobrir a origem da restrição, saber o motivo pelo qual o nome foi incluído no órgão de proteção ao crédito e pedir um extrato demonstrativo. Depois, é preciso solicitar ao cartório uma certidão alegando que a pessoa está sendo protestada por aquele órgão e uma cópia do título que originou a letra de câmbio. Ao procurar a empresa de cobrança, é preciso solicitar uma cópia do cheque que motivou todo o imbróglio. Em mãos de todos esses documentos, é possível entrar no juizado de pequenas causas pedindo a retirada imediata do nome da condição de restrito, e ainda pedir indenização por danos morais sofridos pela vítima.