No filme A Primeira Noite de um Homem, um amigo bem-intencionado da família diz ao personagem Ben, vivido por Dustin Hoffman: "Quero te dizer somente uma palavra, só uma palavra plásticos", como resposta à busca de sentido e de emprego do jovem na sua vida pós-universitária. Se eu fosse esse conselheiro hoje em dia, mesmo que não acreditem, sussurraria a palavra e-commerce no ouvido de Ben.
Atualmente, o e-commerce é a bandeira da falida economia da Internet: o site e-Toys já não existe, o Pets.com se extinguiu como os dinossauros e muitas outras companhias ponto-com estão à beira do abismo. As Cassandras dos negócios e as mídias da Internet ficam felizes assinalando as falhas dessas empresas - que não foram poucas, para a satisfação delas -, como prova de que não existe uma Nova Economia e de que a Web não é mais que uma boa maneira de checar o correio eletrônico durante as férias.
A primeira e mais óbvia foi gastar muito dinheiro em publicidade criativamente imponente, mas economicamente ineficiente, em grandes eventos esportivos e em todos os ônibus e revistas do mundo ocidental. O e-Toys, por exemplo, desembolsou 34 milhões de dólares no ano passado, justamente até o momento de entrar em falência. O objetivo era adquirir uma posição de liderança de marca num mercado novo, mas, como resultado, tudo o que se obteve foram marcas bem reconhecidas, porém sem empresas.
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O segundo equívoco, menos ululante, se refere ao investimento excessivo em infra-estrutura. Muitas empresas de e-commerce construíram bonitos e avançados depósitos para manejar e enviar milhões de pedidos online que nunca chegaram. A fracassada distribuidora de alimentos online Webvan pagou a Bechtel 1 bilhão de dólares para construir 26 depósitos. Por sua vez, o e-Toys despendeu 80 milhões de dólares na sua rede de distribuição e na construção de instalações dotadas da mais avançada tecnologia, que seria a inveja de qualquer executivo da FedEx. Segundo a Industry Standard, hoje em dia pode-se comprar esses depósitos dando 50 centavos por cada dólar investido.
O desembolso de capital também foi demasiado em tecnologia, e pode ser considerado o terceiro grande erro dessa tríade de problemas. As companhias de e-commerce precipitaram-se em adquirir softwares multimilionários e complexos, além de soluções de hardware de Blue Martini, Broadvision e emc e Exodus, chegando a ter orçamentos de Tecnologia de Informação similares aos de um país pequeno - sem contar os sistemas desenhados para negócios de fins do século 20 (e não para lucros de fins do século 20 e princípios do século 21). Resumindo, gastaram muito para criar marcas dominantes, sistemas enormes de distribuição e plataformas com a mais avançada tecnologia para um mercado ainda inexistente.
Então as Casandras da Internet têm razão, não é verdade? E o jovem Ben não deve considerar o comércio eletrônico (e, sim, os plásticos)? Na realidade, as Casandras estão certas sobre as empresas de e-commerce que se excederam como negócios ridículos, mas equivocadas em sua suposição de que o comércio eletrônico constitui um modelo de negócios defeituoso. O e-Toys e outras empresas decidiram gastar demais, mas não tinham de fazê-lo. A boa notícia para Ben e outros futuros empresários é que nunca havia existido um momento mais propício para começar uma companhia de comércio eletrônico.
A sabedoria convencional que as Casandras têm tratado de vender sobre o e-commerce é que se trata de um outro canal precisando de uma parceria com uma empresa tradicional para poder ser bem-sucedido como um varejista virtual. Essa crença, no entanto, ignora a presença - desde há algum tempo - e o êxito dos vendedores por catálogo. O líder Lands End, LL. Bean e um sem-número de pequenas companhias caseiras de vendas por catálogo (que enchem permanentemente minha caixa postal em Miami) funcionam somente com um canal - o telefone -, sem associar-se com o WalMart. A diferença entre eles e e-Toys reside no fato de que são suficientemente inteligentes para não competir com o WalMart ou com a Toys r us. Em vez disso, elas se concentram em um nicho do mercado ao qual não chegam os vendedores de massa. Na verdade, conforme indica o artigo "Como sobreviveria o e-Toys", publicado no Business Week Online, "as empresas focadas em vãos conseguem seguir adiante na rede, pensando em pequena escala." O texto toma o SmarterKids.com como exemplo, em contraste com o e-Toys. Especializado em brinquedos didáticos, o SmarterKids desfruta de margens de 40% a 50%, além de estimar uma receita de quase 69 milhões de dólares para este ano, já com um aumento anual de 25%, e ganhos operacionais de 2 milhões de dólares.
O mais importante dos argumentos, ignorado no meio da histeria contra e-commerce, é que o público está crescendo rapidamente e gosta de fazer compras online. Segundo a e-Marketer, as vendas eletrônicas mundiais chegarão a 550 bilhões de dólares neste ano, 92% mais que em 2000. Apesar de a maior parte desse valor ser gerada nos Estados Unidos e na Europa, também se espera que o e-commerce aumente substancialmente na América Latina. A região, que movimentou 3,6 bilhões de dólares no ano passado com o comércio online, deve chegar a 66,5 bilhões em 2004.
A projeção faz sentido porque, como já escutamos tantas vezes, o público latino-americano da Internet está crescendo mais rapidamente do que em qualquer outra parte do mundo. Obviamente, há obstáculos importantes, começando pela falta de empresas de e-commerce similares às dos Estados Unidos. Segundo a IDC, os portais que atuam nesse mercado, especialmente os locais, estão surpreendentemente mal equipados para executar transações de compra e venda pela Web - para se ter uma idéia, somente 61% deles têm capacidade para receber pagamento online, um recurso fundamental no ambiente virtual. Por outro lado, a e-Marketer também constatou que "um pequeno índice de penetração na Internet, um número limitado de computadores pessoais e um baixo uso de cartões de crédito impedem que os consumidores latino-americanos gastem na rede." Como uma pessoa pode gastar na Internet se não está online?
De fato, existem empecilhos para qualquer futuro empresário do e-commerce. Há penetração limitada de cartões de crédito, e as entregas são um desafio, mas nada é impossível quando existe um público - que, como indica a idc, está muito malservido! Enquanto os capitalistas de risco e outros empresários gastaram milhões de dólares para criar uma infra-estrutura e decifrar como conseguir uma presença rentável no mercado online, os consumidores têm diferentes expectativas, mas estão dispostos a pagar e a esperar pelo envio do produto se conseguirem obtê-lo pela rede e não puderem encontrá-lo com facilidade em outro lugar. A chave, como dito anteriormente, é apostar nos nichos de mercado. Ainda que isso soe estranho, a tecnologia para instalar um site de e-commerce custa pouco. Qualquer um pode estabelecer uma loja online no Yahoo! com 1.000 artigos por míseros 300 dólares ao mês. Ou, então, pode ser mais ambicioso e conseguir o servidor comercial de Microsoft (que é igual ao de Blue Martini) por pouco mais de 10.000 dólares. Mas ninguém precisa pagar 80 milhões de dólares por uma loja, se possui um inventário limitado (e se trabalha com sócios). Finalmente, quem é criativo com as ferramentas de publicidade online, como correio direto via e-mail ou banners, pode encontrar seu público de forma relativamente barata. Claro, se queremos ser um Amazon ou um Submarino, vai ser muito mais difícil, como comprovou o segundo com a recente demissão de 20% de seus funcionários para conseguir ser lucrativo em meados do ano 2002. Mesmo a Amazon está contrariando as expectativas das Casandras com a notícia de que as perdas do primeiro trimestre seriam muito mais baixas do que os cálculos feitos por Wall Street e de que a empresa poderia gerar lucros no último trimestre do ano 2001. Hoje o conselho seria mesmo "e-commerce, Ben, e-commerce."
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