O crime de descaminho, que ocorre quando produtos chegam ao Brasil sem o devido pagamento de impostos, nem sempre é levado aos tribunais. Isso porque, em casos em que o valor do tributo não ultrapassa R$ 20 mil, o Ministério Público geralmente não apresenta denúncia criminal, aplicando o princípio da insignificância tributária. O STJ (Superior Tribunal de Justiça) fixou esse limite com base nas portarias 75 e 130 do Ministério da Fazenda, que estabelecem que o fisco não cobre créditos tributários abaixo desse valor.
A advogada Beatriz Daguer, especialista em Direito Criminal, explica que o princípio da insignificância nesses casos se baseia no entendimento de que o prejuízo ao erário é irrelevante do ponto de vista penal.
“Embora o descaminho represente uma infração criminal, quando o valor do tributo devido for inferior a vinte mil reais, o custo de um processo penal seria muito maior que o benefício gerado pela recuperação da quantia. Isso é o que entende tanto o Ministério da Fazenda quando o posicionamento do Poder Judiciário, aplicando assim o que se chama de insignificância penal”, comenta a advogada.
Leia mais:
Homens fingem ser benzedores e praticam estelionato na região de Apucarana
Jovem de 19 anos é executado a tiros enquanto prestava serviços em Marialva
Polícia Rodoviária Federal apreende em Maringá 117 iPhones contrabandeados
Polícia Rodoviária Estadual apreende mais de duas toneladas de maconha em Rolândia
Essa medida foi regulamentada pela Portaria 75, de 2012, que determina que processos envolvidos em valores abaixo de R$ 20 mil sobrecarregam o Judiciário desnecessariamente, desviando o foco de casos de maior gravidade. Daguer esclarece que, embora o descaminho de baixo valor seja penalmente irrelevante, ele ainda é uma infração administrativa.
“Isso significa que os bens introduzidos ilegalmente no país serão apreendidos pela Receita Federal, conforme a legislação aduaneira, por isso tantas apreensões são realizadas e produtos confiscados, mas criminalmente se o valor for abaixo do estipulado nada acontece, tendo apenas a repercussão administrativa e civil”, explica a especialista.
Em caso de reincidência, a advogada alerta alerta que o princípio da insignificância não se aplica. “Se um indivíduo for flagrado repetidamente com mercadorias abaixo do limite de R$ 20 mil, o STJ já pacificou o entendimento de que essa conduta leva à responsabilização criminal. A reiteração da prática pode, inclusive, aumentar a pena, se o juiz considerar a habitualidade no momento da sentença”.
Como o Estado cobra os valores de descaminho?
Embora não tenha sido feita a denúncia criminal em casos de descaminho abaixo de R$ 20 mil, o Estado ainda tem meios de recuperar os valores tributários devidos. A cobrança acontece pela via administrativa, com a emissão de autos de infração pela Receita Federal. Se após o lançamento definitivo o tributo não for pago, podem ser aplicadas multas, juros e, eventualmente, o débito pode ser protestado, além de levar a uma execução fiscal, que é uma demanda judicial que permite a penhora de bens para garantir o pagamento da dívida.
O entendimento geral, reforçado por decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribinal de Justiça (STJ), é que o objetivo é evitar a sobrecarga do sistema judiciário com questões de pequena monta, deixando espaço para o julgamento de casos que envolvam quantidades mais significativas ou práticas reiteradas.
Apreensão de bens e responsabilidades
Mesmo nos casos em que o valor do tributo devido não ultrapassa R$ 20 mil, a apreensão dos produtos é uma prática comum. Isso porque, do ponto de vista administrativo e aduaneiro, a entrada irregular de mercadorias no país é uma infração, o que permite à Receita Federal confiscar os bens. Além disso, o tributo segue sendo devido e será processado pela via administrativa e, em sendo o caso, de cobrança judicial.