Mulher

Mulheres crescem no eleitorado e são maioria em 2 de cada 3 cidades

08 mar 2024 às 13:30

Ganhar votos das mulheres é cada vez mais importante para se eleger no Brasil. O crescente predomínio feminino no eleitorado faz campanhas políticas recalcularem rotas, define temas principais do pleito e acentua pontos de atrito entre direita e esquerda.


As mulheres constituem atualmente 52,6% da população habilitada a votar, segundo dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). A diferença nunca foi tão grande.


São, no total, 8,1 milhões de potenciais votos a mais que os dos homens, ou quase quatro vezes a diferença de Lula (PT) para Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno da disputa presidencial de 2022.


A superioridade numérica cresce ao menos desde 1996, início da série histórica com dados disponíveis, tanto no quadro geral como nos locais.


Neste ano de eleições municipais, as mulheres são a maioria do eleitorado em 3.657 cidades do país (65,7%). Em 1996, isso acontecia em apenas 775 municípios (14% na época).


A predominância do eleitorado feminino é ainda mais visível nas capitais e municípios com ao menos 200 mil eleitores, onde poderá haver segundo turno. Em todas essas localidades, as mulheres são maioria entre as pessoas aptas a votar.


Os cinco maiores índices estão em Maceió (55,5%), Niterói (55,5%), Aracaju (55,4%), João Pessoa (55,4%) e Recife (55,3%).


O eleitorado feminino tem características específicas, e conhecê-las ajuda a angariar votos nesse público.


Pesquisas qualitativas mostram que elas tendem a ser mais orientadas para o detalhe, mais criteriosas na comparação e levam mais tempo para decidir o voto, diz o consultor de comunicação política Igor Paulin.


Ele atuou nas campanhas vitoriosas de João Henrique Caldas (PL) para a Prefeitura de Maceió, cidade com maior eleitorado feminino, e na de Raquel Lyra (PSDB) ao Governo de Pernambuco.


Outro aspecto importante, afirma, é que as mulheres têm muita informação para avaliar o serviço público. Usam maternidades, sabem como o filho está na creche e são as principais usuárias de serviços de saúde para si e para suas crianças.


A constatação desse fato esteve por trás de uma relevante decisão tomada na campanha de Raquel.


Como prefeita de Caruaru (PE), ela havia recebido o apelido de "Racreche", usado pejorativamente por opositores pelo fato de sua gestão construir muitas unidades de educação infantil. "Percebemos que era um atributo", diz.


O apelido foi incorporado pela própria campanha, fortemente focada no voto feminino.


Pautas de saúde também tendem a se destacar na comunicação política voltada às mulheres, pois são elas que mais assumem tarefas de cuidado, diz Graziella Testa, cientista política e professora da Escola de Políticas Públicas e Governo da FGV (Fundação Getulio Vargas).


"É um tema que aparece tanto nas eleições proporcionais quanto nas majoritárias e também no cenário internacional. Quando não existe uma boa assistência do Estado, o serviço recai sobre elas", afirma.


Outro tema relevante para as mulheres é o da liberação do porte e posse de armas, que costuma mobilizar eleitoras, independentemente de outros recortes, como o religioso. "Mesmo mulheres evangélicas são menos propensas a serem favoráveis à liberação", afirma.


Pesquisas acadêmicas em diferentes países, como Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha, mostraram que mulheres tendem a votar mais à esquerda do que homens.


A diferença foi atribuída a fatores como o aumento de divórcios, que deixou mulheres mais pobres e, portanto, mais propensas a apoiar partidos que priorizem o combate à desigualdade; à maior ligação delas com políticas sociais; e à crescente escolarização.


Também no Brasil, pesquisas de intenção de voto apontaram vantagem mais larga de Lula sobre Bolsonaro entre as mulheres.


A cientista política e professora da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) Mara Telles, por outro lado, diz que a disputa política em torno do que é a família e do que é ser mulher pode influenciar de alguma forma o cenário.


O debate resvala em temas presentes nas últimas duas eleições presidenciais como banheiros unissex e educação sexual nas escolas.


Enquanto a direita aparenta maior grau de consenso nesses debates, a esquerda parece estar dividida, afirma ela, que também é presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores Eleitorais.


LONGEVIDADE E FATORES SOCIAIS AJUDAM A EXPLICAR MAIORIA FEMININA


Um conjunto de fatores, demográficos e sociais, ajudam a explicar a maior presença de mulheres no eleitorado no Brasil.


A maior expectativa de vida é uma delas. Em 2022, a projeção era de 72 anos para os homens e 79 para mulheres.


A diferença se deve tanto a questões genéticas quanto a sociais e comportamentais, como a exposição maior à violência, a menor frequência ao médico e a maior prevalência de consumo abusivo de álcool entre os homens, por exemplo.


Se a longevidade fosse a única explicação para a maior proporção de mulheres no eleitorado, o impacto seria menor: como o voto a partir dos 70 anos é facultativo, uma maior parcela de eleitoras idosas poderia não significar mais votos na urna. Mas não é o caso.


Os dados do TSE mostram que o predomínio feminino é praticamente o mesmo na faixa etária do voto obrigatório (18 a 69 anos), com as mulheres representando 52,2% desse grupo. Elas são a maioria em 3.444 municípios, incluindo todas as cidades grandes do país, considerando esse recorte.


Contribui também para esse resultado o fato de os homens estarem mais sujeitos a algumas situações que geram o cancelamento do título ou a suspensão dos direitos políticos.


Nas eleições de 2022, eles constituíram uma fatia de 55% dos eleitores faltosos, ou seja, aqueles ausentes em três pleitos seguidos. Com isso, podem ter o título cancelado caso não paguem multa ou se justifiquem no prazo legal.


Homens são também 95% das 832 mil pessoas privadas de liberdade no sistema prisional. Presos com condenação em trânsito em julgado não podem votar. Os provisórios até poderiam, mas apenas uma parcela diminuta está com a situação eleitoral regularizada.


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