Brasileiros têm utilizado cada vez mais a internet para importar sementes de maconha e outras drogas para evitar contato com a polícia e traficantes. Somente no ano passado, a Receita Federal localizou 2.359 sementes da erva, uma alta de 143% em relação a 2013, quando foi registrada a apreensão de 970 unidades. O total de drogas flagradas, incluindo cocaína e narcóticos sintéticos, somou 684 quilos, um aumento de 64% em relação aos 416 kg apreendidos em 2013. Os dados foram fornecidos por meio da Lei de Acessos à Informação.
Atento ao público, empresas estrangeiras saíram da chamada "deep web" - local na internet em que as páginas não aparecem nas ferramentas de busca - e, instaladas em países onde a venda de sementes é permitida, apresentam sites com conteúdo totalmente em português e estimativas de preços em reais. Compradores relatam ainda a utilização de aplicativos de troca de mensagens, como WhatsApp, Telegram e Facebook, para acertar as transações.
Um dos sites mais populares é o Seedsman, do Reino Unido, que apresenta opções para gostos variados, com diferentes preços. Uma das semente mais caras, por exemplo, sai por ¤ 44, cerca de R$ 154.
Leia mais:
STF: Moraes afirma que plataformas continuarão no Brasil se respeitarem a lei
Governo de SP confirma que surto de virose em Guarujá foi provocado por norovírus, mas ainda investiga origem
Casa Civil mandou que ministérios votassem contra resolução do Conanda sobre aborto legal
Casa utilizada em gravações de “Ainda Estou Aqui” atrai fãs e curiosos
A plataforma alerta seus usuários para eventuais riscos na aquisição: "Recomendamos que você verifique a legislação de seu país para confirmar se você pode comprar legalmente os produtos que vendemos. Todos os produtos vendidos no site são legais para venda no Reino Unido e na Europa". Porém, a plataforma oferece a opção de "envio secreto" - com um seguro em caso de extravio e uma embalagem "discreta" -, geralmente com algum tipo de brinde para disfarçar o produto.
Ao mesmo tempo em que cresce a importação de sementes, pipocam no Brasil fóruns e páginas que ensinam a cultivá-las. Em junho, o dono de um canal no Youtube que ensinava a plantar a droga - que hoje conta com 43 mil inscritos - foi preso no Distrito Federal acusado de tráfico. Em sua casa foram achados cem pés de maconha.
De acordo com a polícia, o autor da publicação na internet, um professor de 52 anos, criou uma cooperativa que cobrava colaborações mensais dos seguidores e, em troca, enviava a todos sementes da planta, ao custo de até R$ 75.
Outras drogas
A cocaína lidera o ranking dos narcóticos enviados ao Brasil pelo correio. Em 2015, os 651 kg do pó apreendidos corresponderam a 95% dos flagrantes. Em 2013, a participação era um pouco maior: 97%, ou seja, 406 dos 417 kg apreendidos no total.
A queda de 2 pontos porcentuais no volume da cocaína apreendida reflete o aumento de flagrante das demais drogas. No caso do grupo que reúne anfetaminas, metanfetaminas e ecstasy, as apreensões saltaram de 30 gramas para 6,5 quilos no intervalo de dois anos.
Para o Ministério Público Federal, a compra pela internet de entorpecentes pode ser enquadrada no crime de tráfico. Em abril, a Procuradoria da República em São Paulo ofereceu denúncia contra um estudante de 29 anos, morador de Brasília, que fez negócio pela web.
Segundo denúncia da procuradora Viviane de Oliveira Martinez, o rapaz entrou em um site da "deep web", adquiriu 103 comprimidos de ecstasy e pagou em bitcoins, moeda virtual usada em transações eletrônicas. "A transnacionalidade do delito de tráfico restou demonstrada pelo fato de que a droga foi enviada por remetente desconhecido, o qual a postou na Holanda com destino ao denunciado", escreveu a procuradora.
O MPF entendeu que a quantidade de comprimidos era muito grande para falar em "consumo próprio". Assim, o rapaz, que estava desempregado, foi denunciado por tráfico internacional, cuja pena pode chegar a até 25 anos de prisão.
Lei federal
O professor de Direito Constitucional Rubens Glezer, da Fundação Getulio Vargas, reforça que as práticas de compra e cultivo de drogas são consideradas crime. "Hoje a lei federal diz que isso é crime. Há um questionamento geral no País e o debate já está no STF (Supremo Tribunal Federal), até mesmo sobre porte de qualquer droga. O problema é que esta é uma política fracassada", afirma.
Para Glazer, ao procurar o comércio online, "as pessoas buscam mecanismos para fugir da ação dos agentes públicos". "Se houvesse a descriminalização, o crime organizado perderia uma boa fonte de sua renda", disse o professor.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.