Por unanimidade dos votos, a 2ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal condenou Marcelo Valle Silveira Mello à pena de 1 ano e 2 meses de reclusão em regime inicialmente aberto, mais 7 dias-multa, pela prática do crime de racismo contra negros no Orkut.
Tendo em vista a possibilidade de substituição das penas privativas de liberdade por penas restritivas de direitos, previstas no art. 44 do Código Penal, o colegiado substituiu a pena acima por duas penas restritivas de direito, a serem definidas pelo juiz da Vara de Execuções Penais (VEP). As penas para o crime de racismo estão previstas no art. 20, parágrafo 2º, da Lei nº 7.716/89.
O recurso de apelação criminal com o objetivo de reformar a sentença da 6ª Vara Criminal de Brasília, que absolveu o acusado por entender que não houve crime de racismo, foi interposto pelo Ministério Público do DF e distribuído à 2ª Turma Criminal do TJDFT.
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Acusação
Segundo a peça acusatória, o réu cometeu o crime de racismo em três momentos, ou seja, nos dias 14 de junho e nos dias 12 e 13 de julho de 2005, por meio do Orkut, na Internet, praticando preconceito contra a raça negra ao defender seu posicionamento contrário ao sistema de cotas adotado pela Universidade de Brasília (UNB).
Em sua defesa, Marcelo alegou que a crítica era dirigida ao sistema de cotas por critérios de raças ou etnias, e que ele estava apenas manifestando sua verdadeira opinião sobre o sistema, já que defendia cotas por "renda" e não por "raça". Assegura ainda que os ânimos só ficaram acirrados depois que internautas começaram a agredi-lo, fazendo menção ao enfarto de sua avó, à depressão de sua mãe e à morte de seu pai.
Nas ocasiões relatadas, diz o Ministério Público do DF que Marcelo ofendeu os negros chamando-os de "burros", "macacos subdesenvolvidos", "ladrões", "vagabundos", "malandros", "sujos" e "pobres". Em um dos xingamentos, o acusado assim escreveu: "...agora vem com esse negócio de cotas...quer dizer que agora vcs querem justificar a cor pra culpar a gente do fracasso de vocês...até me dá vontade de virar um skin-head também ...só acho que eles tão perdendo tempo pq vcs macacos vão acabar na prisão". Em outra conversa, assim escreveu: "vcs não são mongolóides e tem a mesma capacidade de todos...vão estudar sua cambada de vagabundos...já não basta preto roubando dinheiro...agora eles também roubam vagas nas universidades...o que mais vão roubar depois?"
O Ministério Público do DF, ao interpor o recurso, argumentou que apesar de o réu ser portador de "um transtorno de personalidade", tinha plena consciência do que estava fazendo, tendo apenas diminuída sua capacidade de determinação, e preservado seu entendimento. Incidente de Insanidade Mental apontou que o réu é portador de "transtorno de personalidade do tipo impulsivo", mas tem preservado seu entendimento.
Decisão
Ao prolatar seu voto, diz o relator do caso, Desembargador Roberval Belinati, que com base no art. 26, parágrafo único do Código Penal, trata-se o réu de um "semi-imputável", ou seja, capaz de entender o caráter ilícito do fato que praticou, mas não inteiramente capaz de determinar-se de acordo com esse entendimento. Nesse caso, diz o julgador que sendo semi-imputável, responde pelo crime que praticou, com pena reduzida de um a dois terços.
Ainda segundo o relator, as diversas mensagens preconceituosas devem ser consideradas como continuação da primeira. "Todas as declarações racistas foram proferidas em um mesmo site de relacionamento da Internet, o "Orkut", entre meados de junho e julho de 2005, não sendo adequada a punição do apelado nos termos do art. 69 do Código Penal". Isso quer dizer que se trata de um crime continuado e não de um mesmo crime praticado por três vezes.
Quanto à prática de racismo em si, entende o relator que de fato a conduta de Marcelo se amolda ao crime de racismo, previsto no art. 20, da Lei 7.716/89. Apesar de a Constituição Federal assegurar a livre manifestação do pensamento, esse direito não pode ser utilizado para acobertar a prática de conduta criminosa. "A prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível. Dessa forma, caso uma manifestação seja racista, não há que se falar em liberdade de expressão, uma vez que esta conduta é criminosa, apta, portanto, a ensejar a responsabilização criminal do autor", assegurou.
Da decisão, cabe recurso para o STJ, informou a assessoria de imprensa do Tribunal.