O Ministério Público Federal em São Paulo denunciou três agentes da repressão pela morte de Joaquim Alencar de Seixas, militante do Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT), assassinado em 17 de abril de 1971, durante o regime militar. Também são alvos da denúncia os médicos-legistas Pérsio José Ribeiro Carneiro e Paulo Augusto de Queiroz Rocha, responsáveis pelo exame de corpo de delito. Os médicos são acusados de falsidade ideológica por supostamente terem omitido informações e incluído dados falsos no laudo necroscópico, ‘com o objetivo de assegurar a ocultação e a impunidade do homicídio cometido pelos demais denunciados’.
Depoimentos colhidos pelo Ministério Público Federal e pela Comissão da Verdade do Estado de São Paulo mostram que os membros do Destacamento de Operações Internas - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI/CODI), os delegados David dos Santos Araújo, o ‘Capitão Lisboa’, e João José Vettorato, o ‘Capitão Amici’, além do investigador Pedro Antônio Mira Granciere, o ‘Tenente Ramiro’, "foram responsáveis pela tortura e morte de Joaquim de Seixas".
Os três acusados atuavam sob o comando do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, que morreu aos 83 anos no último dia 15 de outubro.
Leia mais:
STF retoma julgamento sobre responsabilidade de redes por conteúdos
Percentual de jovens que não estudam nem trabalham é o menor da série histórica, diz IBGE
Candidatos incluídos no Concurso Nacional Unificado devem enviar títulos até esta quinta-feira
The Town terá Green Day, Sex Pistols, Iggy Pop e Pitty em noite do rock em 2025
As informações foram divulgadas nesta segunda-feira, 14, no site do Ministério Público Federal em São Paulo (Leia a íntegra do procedimento. O número do processo é 0015358-42.2015.403.6184. Para consultar a tramitação, acesse www.jfsp.jus.br/foruns-federais
Segundo a denúncia do Ministério Público Federal, Seixas havia sido preso com seu filho, menor de idade na época, um dia antes, ’em uma emboscada estruturada pelos agentes da ditadura, para capturar integrantes do MRT’.
Pai e filho foram torturados na sede do DOI-CODI na Rua Tutoia, em São Paulo, um na presença do outro, destaca a acusação. O filho de Joaquim só foi retirado da sala de tortura à noite para levar os policiais à sua casa, ocasião em que a mãe e as duas irmãs também foram presas e levadas para o DOI-CODI.
"Quando retornou, na manhã do dia seguinte, ele encontrou o pai ainda vivo, com a cabeça baixa e o sangue escorrendo pela cabeça, ombro e peito. Ele continuava sofrendo torturas e respondia ‘que não iria falar'", diz a denúncia.
O Ministério Público Federal afirma que Joaquim de Seixas ‘foi torturado ininterruptamente das 10h30 do dia 16 de abril até o momento de sua morte, no dia 17, às 20 horas’.
Segundo o filho dele, que presenciou a maior parte das agressões, os três denunciados participaram pessoalmente das sessões de tortura que causaram a morte de seu pai, ‘sendo que David dos Santos Araújo foi quem desferiu a paulada final que ceifou a vida do militante’.
Na ocasião, a nota oficial divulgada pelos órgãos de segurança dizia que Joaquim de Seixas ‘morreu em razão de resistência à prisão e tentativa de fuga, seguida de tiroteio, ainda no dia 16'. Nessa data, sustenta a Procuradoria, o militante ‘ainda estava vivo e sendo torturado’.
"Esta versão forjada para justificar a morte do militante foi corroborada pelo laudo necroscópico produzido pelos médicos denunciados", afirma a Procuradoria. "De acordo com o laudo, o óbito foi causado por ‘hemorragia interna traumática’ em virtude dos sete projéteis de arma de fogo que atingiram Joaquim. Contudo, o laudo não faz qualquer menção aos sinais evidentes de tortura presentes no corpo da vítima, principalmente às lesões na cabeça, onde não consta ferimento por projétil. Hoje, o atestado de óbito, retificado após reivindicações da Comissão da Verdade de São Paulo e da Defensoria Pública do Estado, indica que a morte foi causada por "lesões contusas, provocadas por espancamento, que causaram traumatismo craniano, abdominal e dorsal".
Os três policiais - todos já aposentados - foram denunciados por homicídio qualificado por motivo torpe, com o emprego de tortura e mediante recurso que tornou impossível a defesa da vítima, ‘uma vez que Joaquim de Seixas encontrava-se completamente debilitado e amarrado quando sofreu os golpes fatais’.
O Ministério Público Federal requer ainda que os denunciados percam os cargos públicos e tenham as aposentadorias canceladas, bem como, em caso de condenação, ‘sejam despidos das medalhas e condecorações obtidas’.
"Os delitos denunciados foram cometidos em contexto de ataque sistemático e generalizado à população, em razão da ditadura militar brasileira, o que os qualifica como crimes contra a humanidade e, portanto, imprescritíveis e impassíveis de anistia", ressaltam os procuradores da República Andrey Borges de Mendonça e Anderson Vagner Gois dos Santos, autores da denúncia.
Os policiais acusados negam a prática de tortura e morte nas dependências do DOI/CODI. Os legistas negam ter inserido dados falsos no laudo de necropsia de Joaquim Alencar de Seixas, do Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT).