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MERCADO DOS GAMES

Jogos NFT são mix de day trade com trabalho precário, dizem especialistas

Gustavo Soares - Folhapress
18 fev 2022 às 11:49
- Soumil Kumar/Pexels
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Em meio à popularização dos NFTs, games que utilizam os criptoativos em suas economias virtuais são cada vez mais comuns. Os jogos play-to-earn (jogue para receber, em inglês) chamam a atenção pela promessa de dinheiro fácil, mas acabam assemelhando-se a um tipo de trabalho mal remunerado, segundo especialistas.


Para ingressar em muitos desses jogos, o usuário precisa lidar com uma barreira inicial que é ter uma carteira digital e comprar um NFT. A diferença é que os criptoativos não ficarão à espera de um comprador no OpenSea, plataforma dedicada ao mercado de tokens não fungíveis.

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Os certificados de autenticidade digital, dentro dos chamados jogos NFT, ou cryptogames, têm uma função prática. Eles representam personagens, equipamentos ou habilidades que possibilitam que o usuário de fato jogue o jogo.

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Mas enquanto nos games convencionais o jogador é recompensado com moedas virtuais úteis somente no ecossistema de onde saíram, nos jogos play-to-earn o que o usuário recebe ao realizar determinadas atividades é um token.

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O termo é usado para se referir a ativos que operam em uma blockchain, como o bitcoin e o ethereum. A diferença entre um token e uma moeda virtual de jogos comuns é que ele pode ser convertido em moedas convencionais, como o real e o dólar, seguindo uma cotação diária.


Isso significa que as recompensas que antes eram destinadas somente a personalização e aprimoramentos, como acontece em games populares como League of Legends e World of Warcraft, servem também como ativos no mercado de criptomoedas.

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No caso do Axie Infinity, jogo NFT que conta com 2,8 milhões de jogadores ativos diariamente, o token é o SLP (Smooth Love Potion), cuja cotação atingiu um pico em meados de 2021. Segundo o site oficial, o game de origem vietnamita movimentou US$ 3,6 bilhões (R$ 18,5 bilhões) desde seu lançamento.


A jogabilidade de Axie Infinity consiste em usar os NFTs comprados inicialmente -agora representados por bichinhos fofos com atributos próprios- para batalhas em turno contra o computador ou outros jogadores, como na franquia Pokémon.

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É vencendo esses combates e completando desafios diários opcionais que o jogador obtém os SLPs, que não só podem ser usados para melhorar o time de Axies e facilitar futuras batalhas, como também ser convertidos em reais.


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Mas quem paga o usuário com tokens não é a SkyMavis, desenvolvedora baseada em Saigon, capital do Vietnã. Como acontece em apps como Uber, o jogo funciona como uma plataforma de intermediação entre seus usuários e o mercado, com suas taxas e regras. O mercado, no caso de Axie Infinity, é o de criptoativos.


As economias dos jogos NFT geralmente são desenhadas por especialistas para fazerem sentido. É com base nessa confiança, também sustentada pela criptografia dos blockchains, que o SLP possui valor, assim como o próprio bitcoin.

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"O que essa dimensão da blockchain e da criptomoeda faz é dar um lastro para essas economias virtuais, com investidores garantindo a estrutura, o funcionamento e o equilíbrio daquele contexto", explica Thiago Falcão, professor de Mídias Digitais na UFPB (Universidade Federal da Paraíba).


Embora a promessa de faturar uma renda extra jogando no celular ou no computador atraia usuários de perfis variados, de adolescentes a especialistas em finanças, os tokens são ativos altamente voláteis que precisam ser liquidados no mercado. É como se, em vez de um trabalhador receber seu salário em reais, recebesse em ações.

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"O consumo mais adequado desses jogos demanda que o jogador adentre a cultura das criptomoedas, que entenda de preços flutuantes, compra e venda. É uma introdução ao day trade, ao mercado de ações", diz Falcão. "Você pode jogar de uma forma desavisada, mas não vai chegar a lugar algum."


A barreira de custo inicial dos jogos play-to-earn fez surgirem relações análogas às de trabalho. Nas "scholarships" (ou "escolinhas", como são chamadas no meio no Brasil), donos de contas recrutam usuários informalmente para que joguem por eles e, assim, dividam os ganhos, cuja porcentagem varia de 30% a 50%.


O empresário Jean Maia conheceu Axie Infinity em novembro de 2021 através de perfis no Instagram dedicados a finanças e criptomoedas. Ele começou a jogar após ter conseguido uma vaga numa escolinha, sem precisar investir do próprio bolso.


"A gente ganhava entre US$ 150 (R$ 770) e US$ 200 (R$ 1.000) por mês, mas quando parei, em janeiro, estávamos ganhando US$ 30 (R$ 154)", conta ele, que passava duas horas por dia no game.

"Hoje eu tenho duas NFTs, uma valendo US$ 120 (R$ 616) e outra valendo US$ 150, paradas, tentando vender, por causa da baixa do jogo", lamenta.


Heloísa Passos, CEO da Sp4ce, empresa brasileira especializada em cryptogames, estima que cerca de 80 mil brasileiros jogavam Axie Infinity no final de 2021.


Em sua avaliação, o sucesso do jogo se deve à sua estrutura, o que deveria ser regra num meio em que poucos conseguem se sustentar a longo prazo, e que interessados são sujeitos a tentativas de golpes.


De acordo com o professor da UFPB, os jogos NFT têm mais a ver com trabalho precário do que com videogames, porque as pessoas se sentem forçadas a passar o máximo de tempo em seus dispositivos em busca de um lucro que pode não chegar.


"Não é uma coisa divertida. Não são mecanismos criados para o entretenimento, mas estruturas de trabalho gamificado. Nos jogos NFT sobra muito pouco do que faz um jogo, um jogo. O prazer, a experiência subjetiva e social de jogar, nada disso existe nesses cryptogames", diz.


A estudante de psicologia Vanessa de Barros não teve a mesma sorte de Jean. Após passar algumas semanas jogando numa escolinha de Axie Infinity, onde ganhava R$ 70 por semana, ela pegou R$ 5.000 emprestados de uma amiga para investir numa conta pessoal.


Vanessa usou o dinheiro para comprar os NFTs iniciais e montar um time de Axies com a confiança de que teria um retorno rápido. Mas, com a desvalorização do SLP e do dólar nos últimos meses, a conta hoje vale R$ 2.000, com criptoativos que ela só conseguiria liquidar abaixando ainda mais o preço.


"Eu sei que não vou entrar em outro [jogo NFT]. Estou esperando o SLP subir para tentar recuperar pelo menos o que eu investi, e acho que não vale a pena o estresse", disse ela. "Eu prefiro pagar para jogar a jogar para receber".


Para Passos, a principal razão para a desvalorização do SLP nos últimos meses foi o excesso de oferta e a falta de consumo no ecossistema do jogo, uma falha da própria desenvolvedora. Isso significa que mais SLPs foram parar nas carteiras dos usuários do que ficaram retidos no game.


Ela avalia que os jogadores que pretendem se arriscar em algum dos cryptogames devem ficar atentos a uma série de alertas vermelhos, como promessas de alto retorno sobre o investimento (ROI), a não existência de documentação pública sobre o projeto (whitepaper) e a dependência da entrada de novos jogadores para a valorização dos tokens.


"É importante que as pessoas, antes de entrarem nesse mercado, entendam bem como ele funciona, para que elas possam investir melhor o dinheiro. Antes de entrar no jogo, deve ser feita uma pesquisa", disse.

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