Em meio à confusão de produtos, sons, imagens, cores e sabores dos labirínticos corredores dos shoppings que comercializam produtos importados - os camelódromos -, o consumidor quase sempre se esquece da própria segurança. Mas há pelo menos um perigo que ninguém deveria negligenciar: o de incêndio, potencializado por falhas nas instalações elétricas e pelas ''gambiarras'' criadas pela falta de fiscalização. O risco cresce ainda mais daqui até o final do ano com o aumento do movimento por ocasião do Dia das Crianças e da antecipação dos presentes de Natal.
A FOLHA percorreu três das principais galerias populares do Centro de Londrina e constatou que os problemas se repetem. As inconformidades são mais evidentes no shopping popular localizado na esquina da Rua Mato Grosso com Sergipe. Além de contar com o maior número de lojas, o espaço tem dois andares. Isso multiplica as deficiências na rede elétrica. Na esquina da Avenida São Paulo com Benjamin Constant, outro centro de compras de dois andares também não está a salvo das ligações caseiras e excesso de aparelhos em uma única tomada.
O shopping que apresenta a rede elétrica em melhores condições é um situado na Rua Minas Gerais, que foi quase totalmente destruído por um incêndio na noite de 16 de junho de 2008, um sábado. Embora o fogo tenha queimado grande quantidade de mercadoria, ninguém saiu ferido porque o local já estava fechado. O espaço foi reconstruído e reinaugurado com outros 130 lojistas. A fiação agora fica organizada em canaletas de metal no chão, instaladas entre um box e outro. Os corredores são amplos e os extintores são de fácil localização.
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Sinalização precária
Nos boxes dos camelódromos não é difícil encontrar caixas de distribuição de energia com um emaranhado de fios expostos. Comuns também são os filtros de linha e extensões sobrecarregadas com equipamentos eletrônicos como TVs de plasma, videogames, aparelhos de som, carregadores de celulares, ventiladores, DVDs, brinquedos eletroeletrônicos, entre outros ítens. Ligações caseiras ''isoladas'' com fitas adesivas são facilmente localizáveis. Pelos corredores, emendas improvisadas também ficam aparentes. Para amenizar o forte calor, a instalação de ventiladores e aparelhos de ar condicionado contribuem para sobrecarregar a rede.
Somado a isso tudo, ainda tem o fato de que grande parte dos comerciantes mantém estoques de mercadorias nos seus pontos de venda. E, outros, fazem pequenos consertos de eletroeletrônicos utilizando ferramentas elétricas para realizar pequenas soldas, por exemplo. Por fim, a sinalização de ''saídas de emergência'' é precária ou inexistente. O mesmo acontece com os extintores. Falta também a instalação de refletores de acionamento automático para as urgências.
Camelódromo promete investir R$ 200 mil em reforma
A gerência do Shopping Popular, o Camelódromo de Londrina, situado na Rua Sergipe com Mato Grosso, admitiu que existem problemas nas instalações elétricas do empreendimento que fazem com que a rede trabalhe no limite. Mas afirma que um projeto de reforma em toda a rede já está em execução, com objetivo de garantir tranquilidade para os lojistas e segurança para os clientes. A expectativa é que seja concluído antes do final do ano.
O gerente-administrativo do shopping, Samuel dos Santos, reconheceu que a estrutura elétrica existente hoje é precária e preocupante. ''Este investimento é prioritário, porque estamos mexendo com vidas'', comentou. Ele afirmou que desde a inauguração, em janeiro de 2003, o uso do espaço foi se ampliando e os problemas se acumulando. Quando começou a funcionar, por exemplo, não havia sistema de climatização nem tantas TVs e equipamentos eletrônicos ligados ao mesmo tempo como agora. ''Temos disjuntor de 700 amperes, a casa de força é de 300 kva e não suporta todos os aparelhos de ar condicionado ligados juntos. Das 40 máquinas, só umas 30 ficam ligadas'', completou.
Com a reforma, de acordo com Santos, cada loja vai ter um disjuntor e uma amperagem determinada. ''Não vai ser possível ligar mais aparelhos do que a capacidade'', afirmou o gerente. Atualmente os 350 lojistas gastam, em média, de R$ 18 mil a R$ 20 mil com energia. As medições são individualizadas, para que cada um pague o que efetivamente consome. Segundo Santos, o novo projeto prevê a instalação de mais um transformador no local.
O proprietário do imóvel, Mohamed El Sayed, informou que estão sendo investidos de R$ 150 mil a R$ 200 mil na reforma da rede elétrica. ''Estamos utilizando o que há de mais moderno, visando a segurança de todos que utilizam o espaço e mais economia para os lojistas'', garantiu. O empresário afirmou que a reforma não foi uma exigência da fiscalização, e sim uma medida que se julgou necessária. O projeto da reforma, segundo Sayed, foi assinado há mais de dois meses.
A administração do shopping localizado na Rua Minas Gerais alegou que só daria entrevista se o texto fosse ''aprovado'' pela diretoria antes da publicação, prática que a FOLHA não corrobora.
Forças-tarefas tentam suprir fiscalização falha
Se por um lado os estabelecimentos são negligentes em admitir o uso improvisado e perigoso da rede elétrica, por outro a falta de fiscalização e a burocracia também contribuem para permitir que a situação se alastre impunemente. Na tentativa de obter resultados mais efetivos, o município deu início, há dois meses, a forças-tarefas em locais de grande concentração de comércio. Segundo o secretário da Ordem Urbana e Rural, Wanderley Batista, o resultado do trabalho realizado isoladamente pelos fiscais não vinha sendo satisfatório.
Batista informou que as fiscalizações não têm como foco a rede elétrica, mas se alguma infração for constatada a olho nu, os bombeiros são comunicados. Ele admitiu que, no caso dos camelódromos, a administração tem sido ausente. ''As infrações existem, e todos nós somos responsáveis''. Ele afirmou que os shoppings populares não estão na lista de locais a serem visitados pela força-tarefa, mas não descartou a possiblidade de incluí-los.
O gerente do Departamento de Receita da Copel em Londrina, Claudio Aires, informou que a responsabilidade da concessionária vai até o ponto de entrega da energia (ou entrada de serviço), que deve ser feita com a devida segurança operacional. ''A forma como a energia é utilizada dentro do estabelecimento é responsabilidade do consumidor.''
O gerente regional Crea em Londrina, Jéferson Cruz, explicou que o órgão fiscaliza apenas o exercício profissional do engenheiro responsável pelo projeto da rede elétrica. ''No caso dos camelódromos, não seria atribuição do Crea fiscalizar, a não ser em caso de reforma, ampliação ou alteração nas instalações elétricas.''
Segundo o tenente Leonardo Mendes dos Santos, do setor de Comunicação Social do Corpo de Bombeiros de Curitiba, a corporação é responsável pela fiscalização de itens de prevenção e combate a incêndios, mas a regularidade destas vistorias depende da demanda local de cada cidade.
De acordo com o tenente Rodrigo Nakamura, do 3º Grupamento de Bombeiros de Londrina, 80% dos incêndios em edifícios residenciais e comerciais são causados por problemas nas instalações elétricas. Ele admitiu que atualmente não existem mecanismos eficazes para a fiscalização desse problema. ''Aguardamos a regulamentação do novo Código de Prevenção a Incêndios do Paraná.'' (Colaboraram Wilhan Santin e Silvana Leão)