A organização criminosa que fraudou a contratação emergencial da Providence Auto Center, de Cambé (Região Metropolitana de Londrina), para fazer a manutenção da frota oficial de veículos do Estado, ao custo de R$ 1,5 milhão pelo prazo de até 180 dias, pretendia continuar prestando o serviço. Essa é uma das conclusões do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), após monitorar conversas telefônicas entre os réus, que seriam liderados por Luiz Abi Antoun, parente do governador Beto Richa (PSDB) e dono de fato da oficina.
Por quase cinco anos, a empresa Montavel foi a contratada para o serviço na região de Londrina. Com o fim do contrato, a Secretaria Estadual de Administração e Previdência (Seap), por meio do Departamento de Transporte Oficial (Deto), abriu procedimento de dispensa de licitação e contratou a Providence, que, no papel, pertencia ao mecânico Ismar Ieger.
Segundo o Gaeco, conforme consta de denúncia já recebida pelo juiz da 3ª Vara Criminal, Juliano Nanuncio, o processo foi fraudado: os dois orçamentos que deram legalidade à contratação da Providence foram fabricados pelos réus, incluindo o advogado José Carlos Lucca, o empresário Paulo Midauar, o ex-diretor do Deto, Ernani Delicato, o empresário Roberto Tsuneda, sócio de Abi na empresa KLM, e do policial militar Ricardo Batista.
Leia mais:
Vereadores de Londrina rejeitam projeto de lei que autorizava troca de imóveis para sede da Codel e Ippul
STF retoma julgamento que pode punir redes sociais por conteúdos de usuários
Entenda o caminho do pacote de corte de gastos no Congresso
TikTok entra com recurso e adia decisão sobre obrigatoriedade de cadastro
A contratação emergencial, por até 180 dias, valeria até que fosse contratada, por licitação, uma empresa para prestar o serviço em todo o estado, ao custo anual de até R$ 57 milhões. A JMK Serviços, de Curitiba, foi a vencedora e o contrato foi assinado em 28 de janeiro.
No entanto, pelo novo sistema, a JMK, uma espécie de gerenciadora da frota oficial, pode credenciar até 220 oficinas para prestar serviços para os veículos do Estado. Sabendo disso, em telefonema no dia 6 de fevereiro, Delicato informa Ieger sobre o fim do contrato emergencial, mas afirma que vai indicar a Providence para ser cadastrada pela JMK e continuar prestando serviços.
Na mesma ligação, o chefe do Deto aconselha Ieger a encaminhar orçamentos abertos que seriam pagos posteriormente, mesmo com o fim do contrato. Para garantir isso, ele fala com uma pessoa do governo, que retarda do dia 5 para 9 de fevereiro a data limite para Ieger mandar os orçamentos, "denotando a participação direta e primordial de Ernani (Delicato) para que a Providence recebesse dinheiro público", escreveram os promotores do Gaeco em relatório enviado à 3ª Vara Criminal, que autorizou as escutas.
Na mesma data, Ieger telefonou para Lucca e o informou sobre a nova empresa contratada pelo governo. O advogado dá a entender que sabia que a Providence seria subcontratada pela nova empresa e diz que os detalhes seriam resolvidos com "nosso amigo", possivelmente, segundo o Gaeco, referindo-se a Abi.
Em 9 de fevereiro, nova conversa entre Delicato e Ieger revela que o primeiro manteria contato com o representante da JMK, Aldo Marchini Júnior, para indicar a Providence. Esse diálogo não está transcrito, mas, segundo o relatório do Gaeco, "reforça o interesse que Delicato tem nos negócios da Providence".
A reportagem solicitou entrevista ontem à JMK. Em nota, a empresa informou que a "oficina Providence nunca fez e não faz parte da rede credenciada da JMK... A JMK acredita na transparência e continuará prestando o seu serviço dentro de padrões rigorosos, sempre visando os melhores resultados para os clientes". Na relação das oficinas mecânicas credenciadas pela JMK, disponível no site da Seap, não consta o nome da Providence entre os 20 estabelecimentos de Londrina.
Na chamada cota, espécie de adendo da denúncia, os promotores pedem a remessa do inquérito à Promotoria de Defesa do Patrimônio Público de Curitiba para apurar "eventuais irregularidades no procedimento licitatório que culminou com a contratação da JMK". Promotores da capital já averiguam se houve eventual improbidade na contratação emergencial da Providence.
Na mesma cota, o Gaeco pede remessa do processo ao Tribunal de Justiça (TJ) do Paraná para investigar eventual participação da secretária de Administração, Dinorah Nogara, que tem foro privilegiado.