As chapas que vão disputar as prefeituras das capitais brasileiras terão maior presença feminina nas eleições de 2024, mas a maioria das candidatas estará em posição coadjuvante na disputa.
Leia mais:
Eleições em Londrina: candidatos assinam ‘Pacto pela Paz’ no 2° turno
Coronel Villa confirma apoio a Maria Tereza à prefeitura de Londrina
Marqueteiro anuncia saída da equipe de Maria Tereza após ‘trapalhada’ de campanha com PT
Justiça manda Filipe Barros apagar montagem com foto de Belinati no Instagram
Levantamento da reportagem mapeou 192 chapas registradas na Justiça Eleitoral para disputar prefeituras das capitais e identificou que 118 delas terão participação feminina –cerca de 60% do total. Esse número pode ter mudanças pontuais até quinta-feira (15), prazo para final registro de candidaturas.
A presença das mulheres como cabeça de chapa, porém, ainda é diminuta. Do total de candidaturas registradas nas capitais, apenas 40 serão lideradas por mulheres, o que equivale a 20,8% dos candidatos às prefeituras. Na eleição de 2020, esse percentual nas capitais foi de 18,6%.
Além das chapas comandadas por mulheres, outras 78 serão lideradas por candidatos homens com mulheres candidatas a vice-prefeita. Este número representa cerca de 40% do total de candidaturas nas capitais.
"Historicamente, esta tem sido uma evolução lenta e gradual. Mas os números demonstram uma evolução a ponto de causar estranheza quando uma candidatura é lançada apenas com homens", avalia a cientista política Priscila Lapa, professora da Universidade Federal de Pernambuco.
A lei eleitoral determina que os partidos lancem pelo menos 30% de candidatas mulheres nas chapas proporcionais e que destinem o mesmo percentual do fundo eleitoral para o custeio de gastos de candidaturas femininas.
As regras eleitorais, contudo, têm brechas que possibilitam a destinação de recursos da cota de gênero para chapas lideradas por homens com mulheres na vice.
Desta forma, 6 em cada 10 chapas registradas nas capitais poderão utilizar a fatia do fundo eleitoral destinada à cota de gênero. Nesta eleição, o valor total do fundo será de R$ 4,9 bilhões, que serão distribuídos entre 29 partidos.
Fortaleza, Manaus, Cuiabá, João Pessoa, Florianópolis e Rio Branco não terão nenhuma mulher como candidata a prefeita. Ainda há uma indefinição em Boa Vista: a deputada estadual Catarina Guerra (União Brasil), única mulher que registrou candidatura, enfrenta uma disputa no partido.
Por outro lado, Aracaju será a única dentre as capitais que terá maioria feminina na disputa pela prefeitura: são 5 mulheres entre os 8 postulantes ao cargo na cidade.
Dez chapas serão formadas apenas por mulheres. Dentre elas está a candidatura da deputada federal Tabata Amaral (PSB), que disputará a Prefeitura de São Paulo com Lúcia França (PSB) como candidata a vice.
A escolha foi feita após uma tentativa fracassada de aliança com o PSDB. Ao anunciar a escolha da vice, Tabata destacou o ineditismo da chapa com duas mulheres na capital paulista: "É o momento de a gente poder consertar o que os homens têm feito com a cidade de São Paulo".
Em Porto Alegre, a principal chapa de oposição ao prefeito Sebastião Melo (MDB) também será formada for duas mulheres: a deputada federal Maria do Rosário (PT) será candidata à prefeita com Tamyris Filgueira (PSOL) como vice.
No campo conservador, a prefeita de Campo Grande, Adriane Lopes (PP), também definiu uma chapa 100% feminina e terá Camila Nascimento (Avante) como candidata a vice.
Mesmo com os incentivos da Justiça Eleitoral por mais diversidade de gênero, o avanço das candidaturas femininas esbarra nas máquinas partidárias, disputas internas e baixa representatividade das mulheres em cargos com poder decisório nas cúpulas partidárias.
"Como você vai mobilizar os acordos se você não está nem convidada a sentar na mesa? Essa é uma situação que a gente escuta muito de candidatas mulheres", afirma Amanda Brito, uma das responsáveis pela plataforma 72 horas, observatório de gênero e equidade nas eleições.
Este cenário fez com que pré-candidaturas de mulheres não prosperassem nas capitais em 2024, caso da deputada federal Luizianne Lins (PT) em Fortaleza, da deputada federal Katarina Feitosa (PSD) em Aracaju, e da ex-secretária estadual Luisa Barreto (Novo) em Belo Horizonte.
Esta última acabou sendo indicada como candidata a vice na chapa liderada pelo deputado estadual Mauro Tramonte (Republicanos), desmobilizando a estratégia do Novo de lançar mulheres como candidatas nas três maiores capitais do Sudeste.
A UP (Unidade Popular) será o único partido com mulheres em todas as chapas majoritárias nas capitais. Foram lançados 10 candidatos a prefeito, dos quais 6 são mulheres. Os quatro homens que serão candidatos terão mulheres como companheiras de chapa.
Dentre os partidos com representação no Congresso Nacional, o PT tem maior proporção de candidaturas femininas: dos 13 postulantes às prefeituras nas capitais, 5 são mulheres. Internamente, o partido incentiva a participação das mulheres por meio do programa Elas por Elas.
Na sequência, aparecem o PSOL, com quatro candidaturas de mulheres, e União Brasil com três –número que ainda pode chegar a quatro, a depender do desfecho do imbróglio em Boa Vista. No início do ano, o União Brasil lançou a plataforma Defesa Lilás, com cursos voltados para candidatas mulheres.
O cumprimento das regras de participação feminina segue no radar do Tribunal Superior Eleitoral, que na última legislatura cassou chapas de vereadores por não cumprir requisitos de candidaturas femininas. A Justiça também vai mirar os casos de fraudes com "laranjas" –mulheres usadas apenas para cumprir a cota, mas sem realização efetiva de campanha.
Gisele Agnelli, cofundadora do Vote Nelas, classifica essas candidaturas como fictícias e destaca que, na maioria dos casos, há um esforço pessoal das candidatas em suas próprias campanhas, mas elas não recebem estrutura e apoio financeiro relevante do partido.
"Os partidos prometem mundos e fundos, mas muitas vezes o dinheiro não vem ou vem tardiamente", disse Gisele, que destaca que o subfinanciamento das candidaturas femininas precisa ser encarado como violência política de gênero.
Os desafios permanecem para as eleições futuras. Em julho deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou a PEC da Anistia, que afrouxa as regras de fiscalização e transparência no cumprimento das cotas para mulheres. O pacote ainda depende de aprovação no Senado e não valerá para esta eleição.