A Lei Maria da Penha completa quatro anos no próximo sábado. Apesar dos recentes casos de agressões contra as mulheres, pesquisadoras e ativistas feministas avaliam como positiva a implementação da lei que criou mecanismos para conter a violência doméstica e familiar contra a mulher.
Para a socióloga Lourdes Maria Bandeira, professora da Universidade de Brasília (UnB) e subsecretária de Planejamento e Gestão Interna da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), a lei se "popularizou" e teve o "efeito prático e simbólico" de dar "visibilidade" à violência de gênero.
A pesquisadora e dirigente da SPM, no entanto, afirma que, apesar dos avanços, muitas mulheres "não têm autonomia emocional e afetiva" e sofrem com a permanência de uma "matriz moral tradicional" que estabelece uma divisão de trabalho injusta com o sexo feminino. Segundo ela, as mulheres ainda que trabalhem fora e tenham conquistado autonomia financeira ficam sobrecarregadas com os cuidados com a casa e filhos. "Não há gestão da igualdade no espaço doméstico."
Leia mais:
Celulite: por que surge, quais as principais causas e como tratar?
Arábia Saudita autoriza mulheres a dirigirem automóveis
'Nem todas as mulheres podem ser modelos', diz estilista da Dior
Empresa dos EUA cria fantasia de 'Kylie Jenner grávida' para o Halloween
A mesma matriz moral também está por trás das relações "de poder e posse" dos homens sobre as mulheres, agravadas pela "misoginia" (sentimento de desprezo dos homens contra as mulheres) que explicaria, por exemplo, a extrema crueldade usada para matar Eliza Samudio, ex-amante do goleiro Bruno, do Flamengo, de acordo com a Polícia Civil de Minas Gerais. O goleiro é acusado pela polícia de ser o mandante do crime.
Para Myllena Calasans de Matos; assessora parlamentar Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), o caso de Eliza também é revelador do machismo institucionalizado. "Ela acionou o Poder Público no momento certo, mas infelizmente os representantes do Estado interpretaram erroneamente o caso dela. Possivelmente, se tivessem dado alguma proteção o desfecho pudesse ser outro", disse, lembrando que Eliza acionou a Justiça, mas a juíza avaliou que não se aplicava a Lei Maria da Penha.
"Isso mostra a percepção que o Judiciário tem das mulheres. Nós temos diversas sentenças, diversos acórdãos em que a mulher não foi julgada em função da violência que sofreu. O passado delas era julgado e os agressores eram absolvidos", acrescentou.
A biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, que empresta o nome a lei e também foi vítima de violência, aponta a ideologia machista ao analisar o comportamento da Justiça. "Os magistrados de hoje são, em grande parte, oriundos daquela cultura machista que existia no passado. A gente tem que colaborar chamando atenção da sociedade, mostrando essas aberrações de pessoas que estão ali para proteger as mulheres e ninguém protege."
Para ela, a "cultura machista deve ser desconstruída" por meio de um trabalho educativo e a Lei Maria da Penha, ao estabelecer mecanismos de proteção e de denúncia, tem colaborado para coibir a violência contra as mulheres. A biofarmacêutica é a entrevistada do programa 3 a 1 da TV Brasil, que vai ao ar na quarta-feira da próxima semana (11), às 23h.
De acordo com dados da Fundação Perseu Abramo (2001), a cada 15 segundos uma mulher no Brasil sofre alguma forma de agressão (em 70% dos casos são vítimas de alguém com quem mantém vínculo afetivo).