Todo brasileiro é louco por futebol; em época de Copa do Mundo, se devota ainda mais pelo verde e amarelo. Aproveitando os ares de palpitação e gritos de 'gol' ansiosos por escapar da garganta, o escritor José Melquíades Ursi lança o livro ''Como Nascem os Deuses da Bola'', pela editora Lance Livre.
Com prefácio de Juca Kfouri, um dos mais renomados jornalistas esportivos do país, o livro faz um interessante passeio pelo esporte que naturalmente faz referência a talentosa ginga dos jogadores brasileiros nos gramados. De maneira simples, porém, polêmica em alguns pontos, Ursi procura jusitificar as origens de toda poesia desenvolvida em campo.
Como em cada regra cabem exceções, aqueles que não encontram tamanha afinidade com o esporte também podem se deparar com lições de solidariedade, descontração, respeito de regras e liberdade não engessada, segundo revela o autor: ''Todo o livro está calcado em histórias do futebol que oferecem a representação da vida, sob um ponto de vista mais lúdico, plástico, ainda que responsável. Digo que viver é olhar para as circunstâncias, associadas aos lugares por onde passamos e à forma como vivenciamos o tempo subjetivo ou cronológico para atingirmos níveis sempre mais densos de elevação humana e espiritual''. Ursi nasceu em Jaguapitã (46 km ao norte de Londrina), é graduado em Filosofia, Pedagogia e Estudos Sociais. Foi professor e hoje atua em programação visual. Leia os principais trechos da entrevista que o escritor concedeu a Folha2.
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Afinal, o futebol é um talento essencialmente brasileiro?
Não digo que o futebol seja talento essencialmente brasileiro, já que não podemos desconhecer a qualidade de craques como Zidani, Maradona, Etô, Cruyff, Messi, Platini, e muitos outros. No entanto, a forma característica da ginga no campo de jogo é particularmente brasileira. Isso provoca o prazer de jogar futebol e de ver a arte desfilar em campo. O mundo inteiro percebe isso, tanto que o diretor de cinema Pier Paolo Pasolini, decretou com sua sensibilidade: ''O futebol europeu é prosa, mas o brasileiro é poesia''. Naturalmente, referia-se ao encanto que só nosso futebol apresenta. A Copa do Mundo já começa a evidenciar isso. Quantos dribles, que ginga se viu, antes do jogo do Brasil. Quase nada de especial ou agradável.
De todos os esportes, o futebol é o que mais recebe incentivos do Governo Federal. Na sua opinião, isso se justifica?
Não. Não se justifica como exclusividade. Ora, num país onde se gasta tanto à toa e inescrupulosamente, há sim dinheiro para dotar as escolas de equipamentos esportivos para a prática de todos os esportes, inclusive os olímpicos. Somos um povo essencialmente criativo e nem o descaso e a malversação do erário público impedirá de nos tornar uma Nação respeitada pelo mundo, já que respeitável já começamos a ser. Sociólogos do mundo já se debruçam a estudar a criatividade brasileira em todas as áreas da criação artística, como o italiano Domênico Di Masi, que escreveu ''O ócio criativo''.
Como aconteceu o contato com Juca Kfouri?
Bem, não nos conhecemos pessoalmente. Mas há pessoas que estabelecem sintonias com os outros, mesmo que distantes. A postura ética de Juca e sua perspicácia sempre me colocaram em sintonia com ele, embora não o conheça pessoalmente. Então o contato foi feito por e-mail. Consegui na Rádio CBN. Enviei e-mail perguntando-lhe se podia lhe enviar os originais do livro. Ele o acolheu. Enviei pelo correio. Menos de dez dias depois recebia um e-mail do Juca com o prefácio. A sua gentileza me impressionou. Pude então agradecer por telefone. Um dia espero agradecê-lo pessoalmente. Ele já fez a divulgação nacional pela CBN, antes de viajar para a Alemanha, para cobrir a Copa.
Você já jogou futebol profissionalmente?
Cheguei a treinar no Palmeiras, de São Paulo, convidado pelo Julinho, um dos maiores ponteiros direitos que o Brasil conheceu, mas as dificuldades de comunicação da época impediram-me de ficar na cidade. Joguei depois no Jandaia E. C., aqui no Norte do Paraná. Fui campeão da segunda divisão, em 1969, em final contra a Platinense. Tinha convites para jogar em times grandes, mas abandonei o futebol para me dedicar aos estudos. Na época, o futebol não dava camisa como hoje. No entanto, essa experiência foi fundamental para me permitir escrever o livro, já que convivi com jogadores vindos de outras partes do Brasil, principalmente de São Paulo