O primeiro relatório sobre visão publicado pela OMS (Organização mundial da Saúde) mostra que, das alterações oculares que podem ser corrigidas com óculos, a miopia, que pode ser definida como a dificuldade de enxergar à distância, é a que mais cresce.
Para se ter ideia, apesar da população mundial estar envelhecendo e vivendo mais, a estimativa da organização é de que em 2020 o planeta vai ter 2,6 bilhões de míopes, bem mais que os 1,8 bilhões com presbiopia, que é a dificuldade de enxergar de perto depois dos 40 anos, o que representa um claro sinal de degeneração da visão.
De acordo com Leôncio Queiroz Neto, oftalmologista do Instituto Penido Burnier, o maior problema da miopia é sua progressão. Isso porque, explica o especialista, a partir de 6 graus aumenta a chance de descolamento da retina, glaucoma e degeneração macular que podem levar à perda definitiva da visão.
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O assunto, comenta, ganhou tamanha projeção na saúde pública que deve ser discutido no 64º Congresso Brasileiro de Oftalmologia que acontece no próximo ano em Campinas.
O aumento do número de míopes está acelerando a deficiência visual. Prova disso, segundo dados da OMS, é que já existem um bilhão de deficientes visuais no mundo por falta de óculos.
Sob controle - A boa notícia é que a progressão da miopia pode ser contida em até 38% dos casos, como com o uso do colírio de atropina a 0,01 junto com lente ortoceratológica. Esta é a principal conclusão de um estudo que acaba de ser apresentado nos Estados Unidos por pesquisadores da Jichi Medical University, instituição japonesa, durante o congresso de oftalmologia da AAO (American Academy of Ophthalmology).
Não é nenhum milagre. Queiroz Neto explica que o colírio normalmente é usado para dilatar a pupila durante a consulta oftalmológica e bloqueia receptores da retina que estão coligados à evolução da miopia. Já a lente ortoceratológica é usada durante a noite para achatar a superfície da córnea. Por isso, altera o foco periférico do olho, afirma o médico.
O estudo japonês acompanhou por dois anos 80 crianças míopes na faixa etária de oito e 12 anos que usaram os dois tratamentos durante três meses. Nas que tinham acima de 6 graus o tratamento diminuiu em 28% a progressão da miopia. No grupo com grau baixo e moderado, a redução foi de 38%.
Para Queiroz Neto, os resultados significam que quanto antes as crianças forem estimuladas a ter mais atividade física, maior a chance de preservar toda a saúde, inclusive a visão.
O risco das telas - A OMS declara que o excesso de telas e a falta de atividade ao ar livre são os principais gatilhos do avanço da miopia. Isso ficou comprovado em uma pesquisa desenvolvida por Queiroz Neto com 360 crianças na faixa etária de seis a nove anos. O uso intensivo do computador e de outras tecnologias fez 21% dos participantes apresentarem miopia, contra a prevalência de 12% nesta faixa etária.
O médico explica que nas crianças que usam muito as telas digitais, a dificuldade de enxergar à distância resulta do excesso de esforço visual para perto, que provoca a perda de flexibilidade dos músculos ciliares do olho e leva à diminuição da amplitude de foco do cristalino.
"Isso acontece porque até a idade de oito anos a visão está em desenvolvimento”, explica. No início, esta dificuldade de enxergar pode ser revertida com descanso de 30 minutos a cada hora na frente das telinhas. O problema, pondera o especialista, é que muitos pais não conseguem mudar o hábito de crianças que praticamente já nasceram com um celular na mão.
Mais ar livre - A dica de Queiroz Neto é estimular as brincadeiras ao ar livre. Diversos estudos já mostraram que duas horas de atividade externa por dia diminuem o risco de ficar míope por relaxar os músculos dos olhos, além de desacelerar a progressão. O oftalmologista acredita que o benefício também tem relação com a luz ultravioleta. Isso porque, este comprimento de luz já é utilizado por oftalmologistas para fortalecer a córnea. Nos míopes pode fortalecer as fibras de colágeno da esclera, parte branca do olho, e por isso dificulta o crescimento do globo ocular característico da alta miopia.
O oftalmologista ressalta que o uso dessas terapias pode ser desconfortável, mas em crianças que têm aumento de 0,5 grau a cada seis meses é melhor prevenir o risco de perda da visão.