Pesquisar

Canais

Serviços

Publicidade
Publicidade
Publicidade

Proibiram-na de falar - crônica de Marli Terezinha Andrucho Boldori

15 jul 2020 às 14:41

Compartilhar notícia

siga o Bonde no Google News!
Publicidade
Publicidade

Hoje, a tristeza veio me visitar, lembrei com muita saudade de uma amiga muito próxima, da minha adolescência e juventude. Ela era muito bonita e vivia com muito entusiasmo pela vida. Estudamos juntas até o curso superior aí, ela casou e assim ficamos mais distantes, porém eu sempre estava bem informada sobre a vida dela, assim como ela sobre a minha.

Ela era professora em duas escolas, fazia os três períodos, dizia que logo diminuiria o número de aulas, para aproveitar mais a vida em família, pois ela já tinha um bebê, porém, nunca conseguiu diminuir o número de aulas, pois outro filho nascera. O marido não dava conta de tudo sozinho, ela nunca reclamava, porém já não vivia com entusiasmo de outrora. Certa vez, viajei para a cidade dela, marcamos um café, foi maravilhoso, pudemos conversar muito e relembrar muitas coisas, que vivemos juntas. Os filhos já estavam na faculdade, mas ela ainda continuava a trabalhar nos três períodos, estava feliz, pois faltavam apenas dois anos para sua aposentadoria, tinha mil planos. Ainda gostava de falar sobre tudo. Disse-me ela, que os filhos eram maravilhosos, mas também gostavam de chamar a sua atenção quando ela falava demais à mesa, riu muito, disse-me ainda, que sentia vergonha quando pediam que ela não falasse sobre alguns assuntos, como doenças, morte e outros assuntos, porque a eles não interessava. Então ela riu e me disse:- Pior é que estes são os assuntos que me restam e acabou rindo muito, talvez para não chorar. Perguntei a ela, qual foi a atitude dela perante isso? Ela me respondeu que agora ela come junto com a família, todo final de semana, o que ela mais gosta, mas fica calada ou fala apenas o essencial. Meu peito parecia doer demais depois que ouvi a história da minha amiga, ela precisava desabafar e o fez comigo, fiquei muito triste, pois ela nem percebia o quanto estava sofrendo calada.

Cadastre-se em nossa newsletter

Publicidade
Publicidade


Houve a despedida. Fui caminhando e analisando a situação, ela, uma mãe dedicada, professora exemplar, esposa esforçada e que estava aos poucos se calando, devido à proibição velada dos filhos. Uma mulher cheia de energia, nunca deixou faltar nada a eles, ela que estava sempre de bom humor, sorria cheia de vida, estava ficando quieta, comigo ela desabafou, porém parece que ela aceitava como normal não poder falar o tanto que gostaria e participar mais da vida dos filhos, das conversas, das risadas.

Leia mais:

Imagem de destaque

Dia da Consciência Negra - Crônica de Flavio Madalosso Vieira Neto

Imagem de destaque

Amo Joanita (Crônica de Isabel Furini)

Imagem de destaque

Ontem ganhei o dia (Crônica de Marli Boldori)

Imagem de destaque

Banco de Primavera - por Vanice Zimerman


Os almoços de domingo, com todos à mesa, não podiam faltar, pois era neste dia que as conversas eram divertidas e todos participavam das notícias.

Publicidade


E, assim passou mais um tempo, quando recebi o telefonema de que a minha amiga havia falecido. Fiquei chocada, paralisada, lembrei-me da nossa conversa, dos planos, e ela nem chegou a se aposentar. Pensei: Será que a tristeza recolhida na alma, ajudou a minha amiga a ir embora, antes de realizar seus sonhos?


Cheguei quase atrasada para o enterro, o caixão já estava sendo levado.

Publicidade


Chorei silenciosamente e pensei:


Conseguiram calar a minha amiga para sempre.


Será que eles têm noção disso?

Marli Terezinha Andrucho Boldori


Publicidade

Últimas notícias

Publicidade
LONDRINA Previsão do Tempo