A reeleição, tão comemorada na campanha de 1998, está custando caro para o governador Jaime Lerner (PFL). Uma sucessão de crises ronda o Palácio Iguaçu, que tem ainda um ano e meio para recuperar a imagem política do governo e fazer um sucessor. A privatização da Copel, grampos telefônicos e a rebelião na Polícia Militar são os ingredientes mais picantes desta crise política, que não tem prazo para se esgotar.
Os aliados que gravitam em torno do governador, para protegê-lo das intempéries, cuidam para que o inferno astral não comprometa o futuro de Lerner, que, se não contornar as pendências, corre o risco de ter de encerrar a sua carreira política diante do clima árido. O sonho de ser presidente da República parece distante. Resta ao governador a possibilidade de uma candidatura ao Senado.
Desde que assumiu em janeiro de 1995, quando iniciou seu primeiro mandato como governador, Lerner enfrentou problemas. A política de privatizações, entretanto acentuou o desgaste. A venda do Banestado gerou polêmica desde a sua concepção, em 1997, quando o governo assumiu diante da Assembléia Legislativa rombo financeiro que, consumada a privatização, rendeu ao Estado dívida de R$ 5,8 bilhões.
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A venda da Copel, programada para outubro deste ano, promete ser mais corrosiva. A estatal, ao contrário do Banestado, não traz ônus. Pelo contrário, registrou no primeiro trimestre de 2001 lucro líquido de R$ 30 milhões. A privatização despertou o descontentamento não apenas na oposição, mas também de políticos tidos como aliados. Dentre os quais, o ex-governador José Richa e o presidente da Itaipu, Euclides Scalco.
Os grampos denunciados pela ex-secretária da Administração Maria Elisa Paciornik, em 1999, tiveram efeito postergado. Os reflexos não são nada positivos. O depoimento do ex-funcionário do serviço de Inteligência da Casa Militar, cabo Luiz Antonio Jordão, acusando o primeiro escalão de fazer escutas clandestinas, inclusive com a possibilidade de ramificações em comitês eleitorais, foi um prato indigesto.
A insurreição da Polícia Militar, a mais recente crise administrada pelo Palácio Iguaçu, é um reflexo da situação financeira do Estado. O governo do Paraná trabalha no vermelho há anos. Nem a antecipação dos royalties de Itaipu, nem as incessantes antecipações no recolhimento do ICMS, para cobrir furos na folha de pagamento, estimada hoje em R$ 250 milhões ao mês, conseguiram amenizar a dificuldade de caixa.
A falta de dinheiro bateu na porta da bancada que dá sustentação política ao governo na Assembléia. Há meses, interlocutores de Lerner tentam acalmar as bases, que cobram o cumprimento de promessas e a execução de emendas orçamentárias. Alguns aliados desistiram do governo e assumiram uma postura de oposição. A instalação de uma CPI para apurar os grampos, por exemplo, é uma resposta ao Palácio Iguaçu.
Os escândalos de Maringá e de Londrina também respingaram no governo. O depoimento do ex-secretário municipal da Fazenda Luiz Antonio Paolicchi, dizendo que a campanha do governador foi beneficiada com o esquema de desvio de dinheiro público, trouxe dor de cabeça durante pelo menos duas semanas. A prisão do prefeito cassado de Londrina, Antonio Belinati (sem partido), foi outro complicador.
Antonio Belinati continua casado no papel com a vice de Lerner, Emília Belinati (PTB). As ligações de Lerner com a família Belinati fragilizaram o governo que ficou numa situação constrangedora com a prisão do ex-prefeito de Londrina, parceiro político da campanha de 1996. A estratégia assumida pelo governo, para não se envolver na trama, foi manter-se neutro. A defesa, em favor da vice, veio depois da libertação de Belinati.
Rejeitando por um lado, sendo rejeitado por outro. O desgaste político de Lerner fez com que o prefeito de Curitiba, Cassio Taniguchi (PFL), se afastasse do governo. Preocupado com o avanço petista nas eleições do ano passado, o staff do prefeito pôs o governador na geladeira, excluindo-o do horário eleitoral. A resposta veio semanas depois numa reforma administrativa promovida pelo governador.
Os ex-secretários da Comunicação David Campos, um dos coordenadores da campanha, e da Fazenda Giovani Gionédis foram desligados do governo, numa manobra comandada pelo chefe da Casa Civil, Alceni Guerra. O relacionamento de Lerner com Cassio não é mais o mesmo, segundo fontes ligadas aos dois. "O verniz é de amizade, mas no fundo a campanha os distanciou", comenta uma fonte que não quer se identificar.
A briga pela reforma agrária no governo Lerner virou um peso para o governador. Desde o primeiro mandato, o relacionamento não é bom. O Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) acusa o governo de violar os direitos humanos. O governo rebate, mas os sem terra insistem. O último episódio que marcou a briga entre as partes foi o Tribunal Internacional, montado em Curitiba, e que "condenou" o governo pela morte de integrantes do movimento em ações policiais.
Relacionamento pouco amistoso também é mantido com os professores da rede pública estadual, que de tempos em tempos brigam com o governo na luta por melhores salários. O governo Lerner já enfrentou inclusive uma greve que durou semanas.