Fitas com horas e horas de material inédito apagadas, muitos meses para escrever as letras, gravações interrompidas para que o vocalista Rivers Cuomo pudesse concluir mais um semestre em Harvard... Tudo para nada. "Make Believe" (Geffen – importado), álbum de difícil parto e o quinto na discografia do Weezer, chegou no início desta semana às lojas dos Estados Unidos e da Europa e pode ser considerado a pior coisa que o quarteto ianque nerd já lançou.
Considerando-se que o anterior, "Maladroit" (de 2002), já havia desagradado boa parcela da platéia de Cuomo, dá para dizer que o Weezer vai ladeira abaixo, no ponto para se tornar apenas mais uma banda com integrantes excêntricos, incapazes de repetir as glórias musicais dos primórdios, reféns da fidelidade canina de fãs fervorosos – clã que, a julgar pela toada, tende a ficar reduzido. Afinal, não é todo mundo que está disposto a dar uma segunda risadinha ao ver o tal clipe gravado na mansão da Playboy.
Assim como não deverão ser muitos os que vão se empolgar com a choradeira de "Make Believe". O primeiro single, "Beverly Hills", pastiche de Kiss com reflexões patéticas sobre o estilo de vida dos endinheirados, é o típico caso de aperitivo enganoso: é o único momento de festa num álbum recheado de guitarras pesadas a serviço de melodias e versos lamuriosos. Obviamente que isso não é novidade quando se fala em Weezer (você ainda se lembra de "Say It Ain’t So"? De "Across The Sea"?), mas o novo repertório carece de inspiração e se baseia em lamentações simplórias, desprovidas da sagacidade que dava o sabor a hits indies derrotistas como "In The Garage", "Pink Triangle" e "The Good Life".
Em alguns momentos, o constrangimento é mais musical: "This Is Such A Pity" é uma remissão sem sal ao pop dos anos 80, com teclados datados e tudo, e "Freak Me Out" tem melodia que lembra os Bee Gees (vamos lá, três pancadas na madeira). Em outros, o ridículo vem das letras: "eu posso não ser uma alma perfeita/ mas posso aprender auto-controle/ então, me perdoe, meu amigo", diz "Pardon Me"; "você é mais alta que uma montanha/ mais profunda que o mar", vai "Hold Me". Se Odair José cantasse esses versos em português, não faltaria gente para aplicar com gosto o carimbo de "brega". Mas como está tudo em inglês e quem canta é um gringo com óculos de aro grosso, tem indie que vai cantar junto e achar tudo uma beleza.
Quando música e letras se igualam em ruindade, o novo Weezer chega a dar medo: para não citar apenas a estúpida "Beverly Hills", há a pior canção anti-drogas de todos os tempos, a farofenta "We’re All On Drugs", e a piegas "My Best Friend" (refrão: "você é o meu melhor amigo/ e eu te amo"), com corinho meloso a repetir "love you, love you".
"Make Believe" só não é um desastre total porque traz "Perfect Situation", "Peace" e "The Damage In Your Heart", que, embora estejam longe de serem brilhantes, ao menos mostram que Cuomo não perdeu totalmente a mão. Aliás, esse moço precisa pensar melhor na idéia de acabar com o Weezer. Se for para macular desse jeito o bom nome construído com o Álbum Azul (1994) e "Pinkerton" (96), não há motivo para continuar.
LANÇAMENTOS
Morrissey – "Live At Earls Court" (Sanctuary – importado)
Quem já ouviu "Rank", disco ao vivo dos Smiths, sabe que a irregularidade é inerente à presença de Morrissey no palco. Este álbum gravado em dezembro do ano passado no conhecido Earls Court, em Londres, traz um repertório eficiente: hits da carreira solo somados a músicas do último álbum de estúdio, "You Are The Quarry" (de 2004), a ótimos lados B ("Don’t Make Fun Of Daddy’s Voice", "Friday Mourning"), a sucessos da ex-banda e a uma cover digna da original ("Redondo Beach", de Patti Smith). As interpretações, porém, muitas vezes naufragam – nas canções dos Smiths ("There Is A Light That Never Goes Out", "Bigmouth Strikes Again"), em especial, cantor e banda parecem cansados. Mas há momentos que pagam o ingresso: "November Spawned A Monster" supera a beleza da versão de estúdio e "Munich Air Disaster 1958" reafirma que é uma das melhores canções da safra recente de Morrissey. Nenhum fã vai poder reclamar.
Para quem gosta de: Morrissey, Morrissey e Morrissey.
Antony & The Johnsons – "I Am A Bird Now" (Secretly Canadian - importado)
Antony tem a voz mais perturbadora da música pop atual e um fã clube ilustre: Amanda Palmer, dos Dresden Dolls, já dedicou elogios rasgados ao cantor; Rufus Wainwright, Boy George e Lou Reed gostam tanto da música do moço que até participam de "I Am A Bird Now", segundo álbum de Antony com a banda de apoio The Johnsons. Escorado por arranjos minimalistas, com piano onipresente, o vocalista arrisca vôos melódicos sofisticados, e o timbre de sua voz é tão único que chega a parecer sobrenatural. As canções são depressivas, dentro da dinastia Leonard Cohen, com uma exceção à regra: "Fistful Of Love" é soul de primeira. É bom prestar atenção nesse rapaz.
Para quem gosta de: Leonard Cohen, Tindersticks, Nick Cave & The Bad Seeds.