Segundo o relatório, grupos de comunicação considerados críticos ao governo Jair Bolsonaro e jornalistas mulheres foram os alvos preferenciais no monitoramento realizado entre os dias 14 de março e 13 de junho de 2021.
A pesquisa monitorou as mais frequentes hashtags de ataque à imprensa no período: #imprensalixo, #extreamaimprensa, #globolixo, #cnnlixo e #estadãofake. Além disso, os pesquisadores mapearam episódios de assédio nas redes contra perfis de alguns jornalistas, como Maju Coutinho (TV Globo), Daniela Lima e Pedro Duran (CNN Brasil), Mariliz Pereira Jorge, colunista da Folha de S.Paulo, e Rodrigo Menegat (DW News).
Segundo o levantamento, a quantidade de tuítes mencionando jornalistas mulheres foi 13 vezes maior do que aqueles que se referiam aos colegas homens. Em 10% dos tuítes estavam presentes termos depreciativos e palavrões como safada(o), vagabunda(o), puta(o), burra(o), ridícula(a), idiota, arrombada(o) e imbecil.
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A incidência desses termos foi 50% maior quando direcionados às jornalistas mulheres, em relação aos homens.
De acordo com o estudo, o uso de contas automatizadas indica "mobilizações orquestradas com o objetivo de ampliar artificialmente movimentos de ataques à imprensa no Twitter".
"A utilização de robôs multiplica o alcance nas redes em torno de determinados assuntos, criando uma percepção falsa de uma adesão maior do que a real a determinadas posições ao estimular artificialmente um efeito de manada", afirma o relatório.
"A identificação de contas automatizadas também sugere que existem determinados atores com interesses políticos, recursos financeiros e capacidade técnica mobilizados para promover um ambiente de descrédito generalizado à imprensa nas redes sociais."
O diretor regional da RSF para América Latina, Emmanuel Colombié, diz que "as críticas à imprensa são absolutamente normais, saudáveis e necessárias em qualquer democracia". "Isso nada tem a ver com os movimentos organizados de ódio ao jornalismo que ganham intensidade no ambiente digital e em particular nas redes sociais."
"O estudo demonstra justamente a escala avassaladora dessas campanhas que buscam apenas reforçar uma ideia simplista: a imprensa é uma inimiga e deve ser combatida. Quando essa ideia se instala em amplos setores da sociedade, ela se torna um mecanismo de intimidação e
silenciamento mais eficiente do que os instrumentos explícitos de censura do Estado."
Entre os dias 14 e 19 de março, Mariliz Pereira Jorge foi alvo de uma onda de ataques nas redes após a publicação de uma coluna na Folha de S.Paulo crítica a Bolsonaro.
No mesmo período, Maju Coutinho foi atacada por um comentário em relação às medidas de isolamento social na pandemia.
Nos dias 6 e 27 de maio, Daniela Lima foi alvo de ataques por comentários relacionados à
operação policial na favela do Jacarezinho e ao desemprego no país. O repórter Pedro Duran foi atacado nas redes após ter sido expulso de uma manifestação bolsonarista em 22 de maio.
E Rodrigo Menegat foi massivamente atacado no fim de maio após acusação falsa de ter hackeado o TrateCov, aplicativo do Ministério da Saúde com orientações a infectados pela Covid-19.
O levantamento avaliou questões como intensidade e volume total de menções às hashtags, interações e perfil ideológico dos usuários que fizeram uso das hashtags, grau de probabilidade de automação, teor de insultos e ofensas no conteúdo dos tuítes direcionado contra os jornalistas. Foi usado o PegaBot, ferramenta desenvolvida pelo ITS-Rio para detectar contas com alta probabilidade de serem bots.
Em 2020, a Repórteres Sem Fronteiras monitorou o discurso da família Bolsonaro -o presidente, o senador Flávio, o deputado federal Eduardo e o vereador Carlos-, de ministros, do vice-presidente Hamilton Mourão e da própria Secretaria de Comunicação Social da Presidência em relação à imprensa.
Juntos, eles fizeram 580 ataques, sendo 85% deles de autoria exclusiva do presidente e seus três filhos com cargos eletivos.
Apenas no primeiro semestre de 2021, a RSF documentou 331 ataques, partindo da mesma metodologia, considerando sobretudo agressões morais como ameaças, xingamentos e exposição de jornalistas e veículos de comunicação de maneira vexatória em declarações públicas, entrevistas e postagens em redes sociais.
O Brasil ocupa a 111ª colocação no Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa 2021 elaborado pela Repórteres Sem Fronteiras, tendo entrado para a zona vermelha do índice pela primeira vez. Em 2 de julho de 2021, a RSF incluiu Jair Bolsonaro em sua lista global de predadores da liberdade de imprensa.