Que bom que ainda existem músicos como Mario Adnet. Ouvir seu mais recente disco, "Villa-Lobos Coração Popular" é o mesmo que se deixar embalar pela melhor e de mais alta qualidade Música Popular Brasileira. Após literalmente mergulhar numa ampla pesquisa sobre vida e obra do compositor e maestro Villa-Lobos, que durou mais de dez anos, ele lançou um CD equilibrado e irretocável. Talvez o melhor até hoje em sua carreira.
O ponto de partida foi há 12 anos, quando Adnet descobriu a valsa/canção "Tristorosa", uma parceria de 1910 entre o compositor e o poeta Cacaso. "Isto me motivou a procurar mais sobre ele", explica Adnet. A partir daí, suas visitas ao Museu Villa-Lobos, no Rio de Janeiro, se tornaram frequentes.
"Cada vez mais curioso, passei a encomendar cópias das partituras e gravações de várias delas, algumas feitas em parceria com ilustres como Manuel Bandeira, Ronald de Carvalho e Carlos Drummond de Andrade".
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Arrebatado pela beleza e delicadeza das composições, ele começou a ouvi-las de maneira diferente, procurando o que estava por trás daquelas vozes, o que encobria a delicadeza dos arranjos. "Tudo era muito solene e formal", comenta Adnet. "Eu ouvia e ficava pensando no quanto aquilo tudo ficaria lindo com mais suingue".
A partir daí, ele começou a traduzir o que encontrava para uma linguagem mais próxima, descomplicando a audição. No meio deste processo, Adnet passou a perceber semelhanças entre a obra de Villa-Lobos e a boa MPB, em especial o trabalho de Tom Jobim. A idéia de selecionar algumas daquelas canções e gravar um disco surgiu há apenas dois anos.
Além da obrigatória "Tristorosa", que deu origem a todo o projeto, Adnet fez questão de incluir no disco, por exemplo, "Melodia Sentimental". A música "Modinha", que já havia sido gravada por Tom Jobim, Sylvio Caldas e Elizeth Cardoso, ganhou a lindíssima voz de sua irmã, Muiza Adnet.
Com a seresta "Abril", terceira faixa do CD, Adnet descobriu o quanto Tom Jobim citava Villa-Lobos em seu trabalho. A canção "Chovendo na Roseira", de Jobim, teria influências claras de tal composição de Villa-Lobos.
Ao mesmo tempo em que cumpria a difícil tarefa de selecionar apenas 14 músicas para o disco, Adnet escolhia parceiros que participariam das gravações. O resultado final traz uma seleção de craques, como Guinga, Cláudio Nucci e Zé Renato, além de Muiza Adnet.
"O Zé e o Cláudio são parceiros de longa data", comenta. Eles emprestam suas vozes para as faixas "Cabôca di Caxangá" e "Desejo". Esta última aliás, foi uma das primeiras canções selecionadas por Adnet para o disco.
O mestre Guinga participa com violão e voz das músicas "Realejo" e "Estrela é Lua Nova". Na voz de Muiza Adnet, além de "Tristorosa", estão "Manhã na Praia", "Abril", "Canção do Amor", "Evocação" e "Modinha".
Os instrumentistas Marcos Nimrichter (piano e acordeon), Zeca Assumpção (baixo acústico), Marcos Suzano (percussão), Paulo Sérgio Santos (clarinete e clarone), Hugo Pilger (cellos) e Rodrigo Campello (violão e violão de sete cordas) também fazem parte do novo disco, que foi lançado graças à Lei Municipal de Incentivo à Cultura do Rio de Janeiro.
Antes da interpretação de Adnet, as músicas de Villa-Lobos já haviam sido registradas por Sylvio Caldas, Elizeth, Jobim, Edu Lobo, Ney Matogrosso e Egberto Gismonti, entre muitos outros. Cada um, entretanto, fez uma leitura própria e diferenciada do trabalho do maestro. Parodiando Edu Lobo, Adnet diz que "essa coisa de compositor clássico ou erudito é limitante, Villa era muito mais, ia além, era uma usina de idéias".
Autodidata, Villa-Lobos costumava aprender "de ouvido". Na opinião de Adnet, exatamente por isso a sua obra é tão rica. "Ele fez uma síntese perfeita entre a música popular e a erudita", afirma. Villa-Lobos nasceu em 5 de março de 1887, no Rio de Janeiro, e morreu na mesma cidade em 17 de novembro de 1959. O maestro deixou mais de mil composições.