"Dream team", foi esse o termo usado pelos analistas de mercado quando Michel Temer (MDB), compôs a equipe econômica. A escolha de Ilan Goldfajn para a presidência do Banco Central e Henrique Meirelles para Ministro da Fazenda, foram consideradas assertivas pela crítica especializada, afinal, ambos os nomes são advindos do mercado financeiro e eram considerados capazes de reverter o quadro econômico.
Com medidas ortodoxas, como o teto de gastos e a reforma trabalhista, o presidente se esforçou em tentar realizar reformas estruturais e consideradas bastante impopulares. Prova disso, foi a reforma previdenciária que esteve em pauta diversas vezes, mas nunca chegou a ser votada. Completando dois anos de governo, com aprovação de apenas 4%, Temer e seu time talvez estejam longe de comemorar.
Teto de gastos
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A primeira medida aprovada foi o teto de gastos. Nesse sentido, o professor de economia da UEL (Universidade Estadual de Londrina) Carlos Caldarelli ressalta que a intenção foi importante, mas equivocada. "Conter o avanço dos gastos públicos é necessário, mas a forma pela qual se deu não foi acertada. Pense que o governo vai restringir por muitos anos gastos com ciência e tecnologia e que isso é extremamente preocupante, uma vez que nossa economia padece de profundos gargalos tecnológicos", afirma.
"Uma sugestão para a questão dos gastos do governo e o problema fiscal no Brasil passa necessariamente por uma racionalização, ou seja, não se deve cortar e sim otimizar o que é gasto. Quando a economia voltar a crescer como poderemos ampliar os investimentos públicos? Como superar o grave problema de produtividade da economia brasileira?", complementa o professor.
Para o doutor e professor do departamento de administração da UEL, Luis Miguel Luzio, o teto de gastos inviabiliza o desenvolvimento do Brasil em áreas essenciais como saúde e educação. "Temer partiu da atual conjuntura econômica, que é extremamente adversa, como se a economia permanecesse nessa situação nos próximos anos. Entretanto, ao trabalhar com um cenário estático, congelou os gastos, o que faz com que o Estado fique impossibilitado de ampliar a sua atuação em áreas fundamentais como educação, saúde, assistência e infraestrutura, comprometendo qualquer projeto de desenvolvimento socioeconômico a médio e longo prazo", destaca.
Previdência Social
Bandeira levantada na equipe econômica, a reforma previdenciária foi esboçada e alterada inúmeras vezes, mas diante da perspectiva de não aprovação, o tema saiu do debate. Caldarelli reforça que a previdência precisa de mudanças, mas reitera que o que foi proposto não era ideal. "O que ocorreu foi que a reforma proposta era muito injusta e não atingia aqueles que realmente gozavam de vantagens. A aludida proposta era altamente prejudicial à classe média e aos beneficiários mais pobres. Acredito que o próximo mandatário tenha que discutir a questão da previdência e uma reforma que seja para o Brasil. Não é algo fácil, contudo, um enfrentamento necessário."
Luzio aponta a necessidade da reforma e ressalta que ela deve ser melhor estudada. "É inegável a discussão sobre a previdência, pois, muitas injustiças são promovidas pelo modelo atual. Entretanto, é algo que atinge diretamente a vida de toda a população e não pode ser discutido a toque de caixa e unilateralmente por um governo com pouca aprovação. Reitero que a discussão é inevitável e deixará muitos descontentes, considerando que o corporativismo é muito forte e nessas horas o bem-comum tende a ser relativizado".
Reforma Trabalhista
Com desemprego na casa dos 13 milhões, a reforma trabalhista ainda não teve efeito positivo. Nesse sentido, Caldarelli afirma que, a reforma trabalhista tem seus impactos no contexto do mercado de trabalho e os resultados têm uma dinâmica mais lenta de resposta. "Um ponto que quero destacar é que essa reforma levará a uma precarização do trabalho no Brasil, o que não é positivo. Assim sendo, não podemos esperar muito dela."
A respeito da reforma trabalhista, Luzio vê um cenário mais pessimista e isso implica no aumento da informalidade (trabalhos sem carteira assinada). "A reforma trabalhista aproveitou-se de um governo descolado da população e aprovou o que o mercado queria há muito tempo. Porém, a possível retomada do emprego que serviu de mantra para a aprovação da reforma, não se confirmou", opinou.
Saque FGTS
Considerado um acerto, o saque do FGTS movimentou a economia, entretanto, há ressalvas. Caldarelli ressalta que "foi uma medida anticíclica acertada no momento em que foi adotada, porquanto o objetivo foi impulsionar a variável consumo (que representa entre 60 e 70% do PIB). Entretanto, deve-se registrar que é uma medida de baixo alcance, não á capaz de sustentar crescimento, serve apenas como impulso", pontua o professor.
Luzio aponta que a medida pode dar um certo alívio, mas não é algo consistente. "É uma forma de dar algum gás para a economia, mas não é uma panaceia. Setores como a construção civil pode se beneficiar, e ter condições para dinamizar a economia e aumentar a empregabilidade, mas ainda existe uma oferta excedente que reduz a retomada em ritmo mais acelerado", afirma.
Taxa de Juros
A SELIC, taxa básica de juros está em 6,5% e vem sofrendo cortes pelo Banco Central (BC) desde outubro de 2016, quando estava no patamar de 14,25% no intuito de incentivar o consumo e diminuir inflação. Luzio considera a diminuição da taxa uma vitória do governo. "A redução das taxas de juros, foi sem dúvida, uma importante conquista do governo. A questão que se coloca é se esta é sustentável diante de um possível aumento da inflação fruto da reativação do consumo".
Caldarelli afirma que o impacto é pouco no bolso do consumidor "a redução não atinge os agentes (econômicos) de forma mais ampla e isso se deve ao elevado grau de concentração do sistema bancário brasileiro. Para ilustrar, apenas quatro bancos concentram quase 80% do mercado e nesse contexto não é difícil compreender o porquê a redução ainda não pôde ser sentida. Em relação às empresas, somente taxa de juros não é capaz de motivar o investimento. Acredito que uma retomada do crescimento mais consistente se dará em 2019 após a posse do novo mandatário", defende.
Gastos Sociais
Em relação aos gastos sociais, Luzio enxerga que a redução pode ser problemática. "Cortes em áreas sociais diante de um aumento dos índices de desemprego e de pobreza, provoca uma verdadeira tragédia, afinal, estamos tratando pessoas e não de simples índices. Mexer em gastos sociais num país como o nosso, é virar as costas para a realidade numa patológica perda de empatia e de sensibilidade diante da dor do outro", ressalta.
Legado
O legado de Temer, segundo Caldarelli, é no sentido de trazer à tona temas relevantes, entretanto, ele ressalta que no aspecto econômico, o impacto é pequeno. "Em termos de "legado" do governo Temer, esses serão nulos ou quase nulos, visto que o ambiente conturbado e os questionamentos acerca da legitimidade do governo paralisam as ações propostas ou mesmo as postergam. Em relação ao ambiente de crise que vivenciamos, o governo tomou algumas medidas que contribuíram para estancar a queda do produto", afirma o professor.
Já Luzio, vê aspectos positivos em algumas mudanças. "O controle da inflação que vinha se elevando perigosamente e a diminuição das taxas de juros, serão seus principais legados positivos, ainda que tenhamos um recorte de tempo muito curto para avaliar a consistência e sustentabilidade dessas ações. Por outro lado, o governo Temer fez emergir as forças mais retrógradas da nação, aquilo que parecia ter se superado em prol de um país mais justo, democrático e participativo, regrediu com força e sem constrangimento, sendo negociadas a céu aberto pautas inimagináveis. Mas não se pode esquecer que o governo anterior, apesar dos avanços sociais inegáveis, cometeu atrocidades que contribuíram decisivamente para o atual estado de coisas, numa perversa ideia de que os fins justificam os meios, defende o professor.