Na véspera da chegada à França dos 104 restos mortais de vítimas do voo AF 447, uma reunião em Paris nesta quarta-feira entre familiares dos mortos foi marcada por divergências deles em relação à identificação e restituição dos corpos.
Enquanto as famílias brasileiras desejam que eles sejam identificados e entregues aos parentes, diz Nelson Marinho, presidente da AFVV447 - que participou da reunião -, representantes alemães estão divididos, e alguns franceses também afirmam não desejar que os restos mortais sejam identificados, apurou a BBC Brasil.
"É algo muito emocional. Estamos divididos. Metade quer que a identificação seja feita e a outra metade não deseja isso", disse à BBC Brasil Bernd Grans, presidente da associação alemã HIOP AF447.
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No acidente, ocorrido em 31 de maio de 2009, faleceram 26 alemães, a terceira nacionalidade em número de vítimas. A bordo do avião havia 72 franceses e 59 brasileiros, além de passageiros de 30 outros países.
Os restos chegam nesta quinta-feira à França, e o processo de identificação deverá começar na sexta-feira ou no sábado e "pode levar meses", disse à BBC Brasil o coronel François Daoust, diretor do Instituto de Pesquisas Criminas da Polícia Militar francesa, que coordenará esses trabalhos.
O coronel lembra que a identificação dos 50 corpos resgatados pouco após a catástrofe, em 2009, demorou dois meses.
Determinação da Justiça
Segundo Marinho, apenas uma família brasileira havia declarado não desejar o resgate dos corpos, mas não se pronunciou mais a respeito.
A decisão de identificar os restos mortais não cabe, no entanto, aos familiares. Na reunião em Paris, entre autoridades francesas e representantes das associações, o secretário dos Transportes, Thierry Mariani, declarou que a identificação dos corpos é uma determinação da Justiça francesa e que ela será cumprida.
O representante da HIOP AF 447 afirma estar consciente disso, mas diz que alguns familiares alemães podem não desejar receber os corpos após a identificação.
Na França, alguns parentes também têm declarado que não desejam que a identificação seja realizada e afirmam não querer que os corpos sejam restituídos.
Corinne Soulas, que perdeu sua filha e seu genro na tragédia, ocorrida em 31 de maio de 2009, havia afirmado várias vezes preferir que eles ficassem no fundo do mar, que seria a sepultura de ambos.
Mas agora ela disse à BBC Brasil, após a reunião desta quarta, que "está mudando de ideia" e que gostaria de recuperar o corpo de sua filha e de seu genro.
Uma outra divergência também pode ocorrer em relação ao local do sepultamento. Segundo Marinho, os representantes das famílias francesas defendem a ideia de um monumento internacional, onde todos os corpos resgatados em maio passado e no início deste mês seriam enterrados.
"Os brasileiros não querem um monumento internacional. Cada um quer enterrar seu familiar no local que deseja", afirma Marinho.
Segundo ele, o governo francês teria aceitado o pedido das associações para que o anúncio das identificações seja feito a todos os familiares envolvidos na mesma data, ao término do processo, para evitar sentimentos diários de angústia.
A reunião em Paris contou ainda com a presença do diretor do Escritório de Investigações e Análises (BEA, na sigla em francês), que apura as causas do acidente, e de representantes da polícia militar e da Air France.
Marinho afirma que tentou discutir no encontro aspectos sobre as investigações do acidente e a análise das caixas-pretas, mas diz que ouviu das autoridades francesas que o assunto não fazia parte da pauta da reunião.