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Chutando o pau da barraca

Zeca Corrêa Leite - Folha do Paraná
26 jan 2001 às 11:49

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O diretor Sérgio Lerrer, sentiu o sabor do sucesso quando há 20 anos lançou "Verdes Anos", produzido e rodado no Rio Grande do Sul. De lá saiu para a mídia nacional. "De Cara Limpa", seu último trabalho em fase de lançamento - teve avant-premiére terça-feira passada na Cinemateca, em Curitiba - vem amealhando mais críticas que elogios da crônica especializada.

"O filme é um pouco insolente, debochado", avalia. Esse seria um dos principais motivos para tanto descontentamento, ele acredita, pois "De Cara Limpa" vai contra a estética do cinema brasileiro reinante nos últimos anos. A moda é a realização de filmes pretensamente culturais, com imagens limpas, dentro de uma linguagem quase publicitária. Lerrer argumenta que a superficialidade teria ligação direta com as leis de incentivo.

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Ele parte do princípio de que as verbas destinadas à arte chegam das grandes corporações, que não estão nem um pouco interessadas em questionamentos ou polêmicas, muito menos em apoiar a criatividade, a busca por novos caminhos. Unicamente a preocupação dela é com a imagem simpática que possa transmitir para a comunidade.

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Dentro dessa norma houve um esvaziamento do tipo de produções que eram feitas no passado. "Por muito tempo o nosso cinema foi polêmico, e hoje não existe mais isso. Ocorreu um acomodamento dentro do gueto cultural por onde ele transita". Sérgio Lerrer dá um perfil dessa modernidade:

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- O cinema brasileiro tem procurado abordar personagens de grande destaque. Você então tem bons trabalhos como sobre Villa-Lobos, sobre Mauá, mas nosso caminho é buscar personagens médios, anônimos. Não o sujeito de projeção que pode servir de lição de moral para as pessoas. A idéia é pegar personagens comuns e trabalhar com atores não necessariamente muito conhecidos para que possa criar atmofera diferente. Por outro lado procuramos uma estética mais coloquial que o cinema brasileiro popular tinha, como o Mazzaropi, o Teixeirinha. Mesmo as grandes comédias de costumes tinham linguagem de rua. Agora ela é mais correta, cuidadinha.


"De Cara Limpa" usa e abusa dos palavrões, e como reconhece o diretor "radicaliza na parte de sexualidade e da escatologia". É proposital a irrevência, considerando-se que no momento "tudo é bem-comportado, ninguém quer polemizar".

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Soa estranho esse desabafo vindo de uma pessoa que fez o lírico "Verdes Anos", com elenco gaúcho e atores desconhecidos. Lerrer defende-se: "Tudo tem o seu tempo. Naquele momento "Verdes Anos" era uma crônica encantadora, singela, verdadeira, de emoções pequenas que retratava o País dos anos 70, em que a falta de perspectiva deixava as pessoas pequenas".


No entanto, ele continua, há certa coerência entre a obra adulcorada com esta mais recente. Ambos mostram jovens brasileiros "perdidos no meio do Brasil, tentando viver sua vida em meio a um ambiente desfavorável".

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Sob esse aspecto nada mudou, pelo contrário, piorou. Se antes havia uma marca divisória onde as pessoas se situavam, agora ninguém mais sabe quem é o bandido e o mocinho, o certo e o errado. Em suma, o meio de campo embolou. Dissecar esse amontoado de ética e anti-ética é desagradável, daí a razão de temas afins não chegarem às telas, acredita o cineasta. A tendência é a obra palatável, de amenos sabores.


"Nosso cinema está de terno e gravata", decreta Lerrer que não economiza nas críticas à plástica que as produções perseguem. "Você vai fazer uma obra e quer até colocar uma estética publicitária para ficar mais aceitável". Esse é o lado escancaradamente visível da necessidade de ser aceito; a vontade de mostrar que está capacitado a fazer igual ao cinema de outros países.


Enquanto se esmera no bem feito, perde em autenticidade e esbarra no "pedantismo cultural". "Às vezes parece que ele está acometido de complexo de inferioridade cultural", observa o diretor. Isto porque "você só tem que falar de coisas mais elevadas culturalmente, senão será mal julgado. Mas o cinema não tem a missão educativa como as escolas têm".

Por essas e outras é que sua atitude é clara: ir contra a corrente. "Nós estamos chutando o pau da barraca, mas sentimos que dentro da comunidade acabamos sofrendo um isolamento. Afinal, o que trazemos é inconveniente e estamos na hora errada, do jeito errado, com a estética errada do ponto de vista dos outros".


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