Nada melhor do que uma vitória bem a seu estilo, tranqüila e praticamente sem combate de seus adversários, em pleno autódromo de Monza, um templo do automobilismo, para Schumacher anunciar sua despedida da F-1. E com a possibilidade cada vez mais real de sair por cima, depois de conquistar o oitavo título mundial e elevar a patamares até então considerados inatingíveis praticamente todos os recordes individuais da principal categoria do esporte a motor.
Polêmico, nem sempre limpo em suas condutas esportivas, o alemão queixudo é figura facilmente criticável por alguns de seus colegas e por grande parte da mídia ao redor do mundo, com especial afinco no Brasil, em que os órfãos de Senna vêm no multi-campeão um vilão que só conquistou a fama após a morte estúpida de seu ídolo.
Mas não há dúvida que Schumacher é muito mais do que isso. É, a exemplo de Senna, um daqueles gênios que o esporte consegue descobrir de tempos em tempos, que fica na história quase como um semideus, um ser iluminado e dono de um dom celestial para vencer e encantar.
Ao contrário de seus antecessores no posto de rei da F-1, Schumacher fez toda sua carreira em um tempo em que a eletrônica transformou um esporte até então meramente mecânico em uma corrida tecnológica em que softwares e hardwares tornaram-se peça chave para vencer, dividindo suas glórias com uma regulagem aerodinâmica cada vez mais apurada, a novos compostos de pneus e combustíveis e outros itens resultantes de pesquisas cada vez mais refinadas.
Os reclamões de plantão aproveitam estas características da nova F-1 para tachar o alemão de um piloto que só vence porque tem o melhor carro, porque não tem concorrentes realmente talentosos ou porque trapaça. Fingem desconhecer que as trapaças, ou como dizem os especialistas no automobilismo, as interpretações diversas dos regulamentos, existem desde os primórdios e fazem questão de esquecer que as equipes em que Schumacher foi campeão não eram hegemônicas no momento em que ele passou a integrá-las. A Benetton era uma equipe média e promissora, que já havia obtido algumas vitórias ocasionais mas jamais disputou um título antes de ter Schumacher defendendo as suas (várias) cores. Por ela o alemão conquistou os seus dois primeiros títulos e deixou o nome da empresa de roupas marcado para sempre no histórico da categoria.
De lá, Schumacher partiu para um grande desafio: reerguer a combalida Ferrari e fazer a tradicional escuderia do "Cavalino Rampante" voltar a ser campeã -- algo que não conseguia desde 83 entre as equipes e desde 79 entre os pilotos. Para lá levou uma equipe técnica de sua confiança, capitaneada pelo estrategista Ross Brawn. Depois de quatro anos desenvolvendo uma estrutura vencedora, em que chegou a disputar títulos sem obter sucesso, o "Barão Vermelho" iniciou em 2000 uma série de cinco títulos consecutivos, quebrando sucessivamente dois recordes do fantástico Juan Manuel Fangio: o de títulos mundiais (sete contra cinco) e o de títulos consecutivos (cinco a quatro).
Foi apenas mais um dos muitos recordes absolutos pulverizados por Schumacher, que incluem ainda números de pontos, voltas e quilômetros na liderança, e dois especiais: o de número de vitórias, por enquanto 90 contra as 51 de Alain Prost; e o número de poles, a mágica marca de 65 que pertencia ao rei dos treinos chamado Ayrton Senna. Quando bateu esta marca Schumacher deu uma de suas raras demonstrações de emoção, a exemplo do que fez em Monza ao anunciar o fim próximo da carreira. Só não tem alguns recordes de idade (não é o mais novo e nem o mais velho a vencer uma corrida ou campeonato) e nem alguns dos recordes proporcionais: Fangio, por exemplo, é insuperável nisso, vencendo quase 50% das provas que disputou -- 24 de 51 corridas.
Sua retirada marca o fim de uma era e deixa como legado um estilo de pilotagem que fez escola e não a toa caracteriza o seu provável sucessor no domínio da categoria, Fernando Alonso. Um estilo de pilotagem ao mesmo tempo agressivo e limpo, levando o carro ao limite sem desgastá-lo a toa. Estilo que já havia consagrado pilotos como Niki Lauda e Prost, mas ao qual Schumacher acrescentou o perfeccionismo de Senna e as variações táticas ao longo da prova de Nelson Piquet.
Em outubro, em Interlagos, os brasileiros terão a honra de ver o fim de uma carreira que pode ser comparável a de alguns dos gênios do automobilismo já citados e a outros esportistas como Pelé, Michael Jordan ou Carl Lewis, para citar alguns exemplos.
Rio da prata
O Furacão deixou de lado a vacilante campanha no Brasileirão e passou até com certa facilidade pelo Paraná -- que vive mal momento -- na Sul-Americana. Terá pela frente agora o River Plate, tentando reconquistar seu espaço na América.
Amarelão
Já o Coxa parece ter perdido o rumo, talvez mordido pela mosca azul da liderança, nas derrotas para Guarani e Brasiliense, e no empate com a Portuguesa. Hora de botar os pés no chão e recordar que o caminho para a Primeira Divisão não é um passeio por um bosque florido.
Nota 10
Para as mulheres do Vôlei, hexa-campeões do Grand Prix, confirmando a hegemonia brasileira no esporte.
Nota 0
Para Rubens Barrichello (e seu cotovelo inchado), que disse que Schumacher só será lembrado por seus atos anti-desportivos.