Coluna do Eloi Zanetti

Acontece nas linhas de frente e você nem fica sabendo

01 abr 2003 às 10:59

Quantas vezes, nestes últimos meses, você deixou a sua sala de trabalho e foi às linhas de frente visitar lojas, pontos de vendas ou acompanhar seus representantes nas cansativas visitas a compradores, para ver de perto como o seu pessoal atende ou vende os serviços e produtos da sua empresa? Ou procurou perceber no próprio local de venda como os clientes compram ou deixam de comprar os seus produtos? Quantas vezes, durante o mês, você sai do seu gabinete e circula pela fábrica, sozinho, sem comitiva, para verificar como estão as linhas de montagem e aproveitar para conversar com aqueles colaboradores que não vê há muito tempo e que nem se lembra mais dos seus nomes? São pessoas que conhecem muito mais do que você, seus engenheiros ou diretores, como fazer produtos. Ou você é daqueles semi-deuses que estaciona o carro na vaga privativa da empresa e corre para sua sala, não se dando ao luxo de se misturar aos simples mortais? Daqueles que não gostam mais do cheiro da graxa, nem da poeira, porque irão sujar o terno Armani e o sapato em cromo alemão, feito a mão, sob encomenda?

Conheci um velho militar, ainda do tempo de II Guerra Mundial. Ele havia servido na Itália junto com o Marechal Castelo Branco. Ele me contou que, ao contrário de outros graduados, o Marechal Castelo Branco era um dos poucos a ir todos os dias nas trincheiras, visitar e conversar com os seus soldados. Ia direto para as linhas de frente, muitas vezes sob fogo inimigo. Verificava o estado da tropa, ajudava em alguma coisa e se colocava à disposição. Os soldados o adoravam e tinham por ele o maior respeito, estando dispostos a seguir sua liderança a qualquer lugar que fosse preciso. Outro militar, em outro tempo, Alexandre Magno, fazia questão de se misturar com seus guerreiros percorrendo as frentes de batalha, conversando e lutando junto com seus homens. E de cada incursão às linhas de frente, sempre vinha com novas idéias para suas estratégias de conquista. Pois é lá que as coisas acontecem de fato. E olha que Alexandre Magno tinha um negócio bem maior do que o seu.


As linhas de frente, para uma empresa, são o lugar onde as vendas acontecem. E se você não estiver disposto a estar lá, observando, não vai poder sentir o mercado na sua plenitude. Imagine o quanto poderá aprender sobre sua empresa se estiver disposto a visitar lojas, percorrer bairros, visitar clientes, conversar com vendedores, compradores e clientes. Ver como os seus produtos estão sendo expostos, comprados e usados.


O que está acontecendo nas linhas de frente tem a ver com o seu trabalho, por isso, é preciso manter presença, sempre. Visitar o campo de batalha é a melhor forma de não ser pego de surpresa, por negócios que não estão dando certo ou por ações da concorrência. É receita certa para consertar pequenos detalhes de produtos e serviços que precisam ser melhorados.


Se você trabalhar com distribuição de gasolina, vá conversar com os frentistas dos postos. Se você vende produtos de beleza, vá conversar com cabeleireiros. Se o seu negócio é uma frota de caminhões, converse com seus motoristas. Vai ficar surpreso em saber o quanto eles sabem mais do que você sobre o seu próprio negócio.


O experiente Avelino Vieira, fundador do Banco Bamerindus, quando ia visitar uma agência bancária no interior, viajava sem ninguém saber. Chegava na região, conversava com alguns comerciantes e clientes, auscultava sobre os negócios, sobre o atendimento do seu banco, o trabalho da gerência, e só depois se apresentava na agência. Já sabia tudo sobre todos e se alguma coisa estivesse errada, não punia ninguém, só orientava.


Tenho um amigo, especialista em endocomunicação e, um dos melhores profissionais em comunicação empresarial deste país que, para aprender mais sobre o seu negócio e atender à uma empresa a qual estava trabalhando, ficou por contra própria, incógnito, como operário nas linhas de produção da fábrica. Aprendeu em pouco tempo, com o pessoal das linhas de frente, o que levaria anos lendo relatórios, pesquisas ou conversando com gente errada. Isto não quer dizer que devemos fazer como ele. Mas observando o seu trabalho poderemos perceber o quanto nos ofuscamos quando achamos que já sabemos de tudo e que percorrer fábricas ou canais de distribuição é perda de tempo.


Ficar ligado nos relatórios ou nas pesquisas encomendadas é bom, mas só a presença física no local vai nos garantir enxergar o essencial. Mas para isto, além de percorrer as linhas de frente, é preciso ter olhos para ver, ouvidos para escutar e coração para sentir.

Fazer negócios é isto - humanos versus humanos. O resto é puro plug-and-play.


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