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Viagem de trem

24 out 2009 às 18:51
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VIAGEM DE TREM


Resolvi ir de trem. Pesquisei o caminho que faria, a pé, do hotel até a estação de Osasco, onde embarcaria, e da estação Júlio Prestes, em São Paulo, onde desembarcaria, até a Praça da Luz, defronte à qual se encontra o Museu da Língua Portuguesa, aonde eu iria à caça de um pouco mais de sabedoria, e lá fui eu para o meu passeio.
No trem, acomodei-me próximo a duas senhoras que, sentadas, conversavam sobre seus padecimentos físicos e espirituais, consequência de uma vida repleta de dissabores e insatisfações. Uma falava à outra de seus problemas, como se quisessem mostrar que seu sofrimento é mais aflitivo que o da outra: alcoolismo na família; filhos que não se mostram reconhecidos aos pais; extravio de R$75,00 no cartão de crédito, que tinha sido clonado; gravidez precoce de uma sobrinha de catorze anos.

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Tudo isso falado com muita naturalidade, sem demonstração de sofrimento de fato, tanto que dos dissabores passavam a outros assuntos triviais, como a chuva da noite anterior, a greve dos ferroviários prometida para a madrugada seguinte e o programa de rádio que apresenta os casos policiais, e disso para os dissabores, num constante vaivém. Foram cerca de quarenta minutos de conversa sobre dificuldades pessoais entremeadas de assuntos mais amenos. (Não me tome como curioso; eu não tentava ouvir a conversa delas, mas eu estava tão próximo, que era impossível não as ouvir). No fim da conversa, quando uma delas teve de desembarcar, ouvi um "prazer em te conhecer". Eram, portanto, desconhecidas, e assim continuarão, pois é improvável que se encontrem novamente. Acredito que seja difícil que ocorra novamente a circunstância de tomarem o mesmo trem, no mesmo horário, entrarem no mesmo vagão e se sentarem próximas o suficiente para mais uma conversa dessas.
É interessante como nós, seres humanos, tratamos nossos sentimentos de tristeza e de infelicidade. Alguns (eu me incluo neste grupo) se fecham quanto a eles e não os confidenciam nem ao amigo mais íntimo; têm dificuldade de falar sobre isso até com o psicólogo. Já outros sentem a necessidade de os compartilhar com as pessoas ao redor, mesmo que não as conheçam suficientemente. Em uma ocasião, ouvi de um taxista, em Natal, RN, os seus problemas com a seguradora de seu automóvel, com o gerente do banco, a quem ele ofendeu por não o ter tratado convenientemente, com a sua esposa, que foi a responsável pelos estragos no automóvel, enfim, na viagem de quase uma hora, conheci seus problemas como se fosse um amigo íntimo. Ao chegar ao aeroporto, ele inclusive me pediu desculpas por ter falado tanto de sua vida. Eu deveria ter-lhe cobrado uma sessão de análise em vez de lhe pagar a corrida.


A RAZÃO NOS LEVA À VIRTUDE ÉTICA

O que é o melhor? Fechar-se ou abrir-se? Acredito que nem um nem outro. O ideal seria seguir os ensinamentos de Aristóteles, filósofo grego que viveu em meados dos anos de 300 a.C.: "Nada deve ser em falta ou em excesso; tudo no meio termo, ou moderadamente". Ensina ele que a razão nos leva à virtude ética, que deveria ser o ideal de vida de cada um. Se não houver controle, pode haver o excesso ou a falta de sentimentos e de ações. Com o controle chega-se à virtude ética: a coragem é a virtude ética entre a temeridade (coragem em excesso) e a covardia (a falta de coragem).
Quanto ao nosso assunto, Aristóteles dizia que a verecúndia é a virtude ética entre a imprudência e a timidez. Verecúndia é um vocábulo que proveio do Latim, cujo significado é "respeito, modéstia, sentimento de vergonha e de pudor". Esmiuçando mais esse vocábulo, chegamos ao significado de "discrição, qualidade de quem é reservado, comedido". Esse é o meio termo quanto ao que falamos sobre nossa vida aos outros. Temos de ser comedidos, ou seja, temos de pensar muito antes de falar. Não podemos ser imprudentes e expor nossa vida a qualquer pessoa, pois podemos nos tornar inconvenientes ou podemos falar aquilo que não deveríamos. Por outro lado, não podemos ser tímidos a ponto de nada falar sobre nossa vida, mesmo aos amigos ou ao cônjuge, pois podemos não ter estrutura psicológica para suportar o enclausuramento de nossos sentimentos e emoções e, nalgum dia, esses podem vir à tona todos de uma vez, causando-nos um problema maior ainda.
O comedimento é uma virtude que deve ser buscada com afinco, não somente quanto ao assunto tratado, mas em todas as nossas ações. Se houver moderação em nossas ações, mais tranquilidade haverá em nossa vida.


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