Janeiro é considerado o mês de conscientização e de prevenção da saúde mental. Transtornos psíquicos, como a depressão, a bipolaridade e a esquizofrenia, podem estar relacionados a problemas digestivos, como a obesidade, doença que afeta 23,2% dos brasileiros, segundo a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Para especialistas, políticas públicas e conscientização devem enfocar a prevenção e o tratamento adequado.
"A obesidade - quando a divisão do peso do indivíduo pelo quadro de sua altura é igual ou superior a 30 - é um fator de risco para diversas doenças, como hipertensão, diabetes e diversos tipos de câncer, e tem ligação com transtornos psíquicos, como a depressão”, explica Elaine Moreira, médica da FBG (Federação Brasileira de Gastroenterologia).
Segundo Adriano Segal, médico psiquiatra da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica), a relação entre os transtornos psíquicos e os problemas digestivos é complexa, envolvendo características não apenas de saúde, mas morais, simbólicas, históricas, sociais e políticas.
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"Hoje podemos dizer que, em alguns casos, há aspectos causadores comuns, como estados inflamatórios e problemas de microbiota intestinal. Mas, em outros casos, há quadros mais associados ao excesso de peso, como os transtornos alimentares, e ao tratá-los, existe uma melhora psiquiátrica”, detalha Segal.
Para a médica gastroenterologista, ter bons hábitos de vida e gerenciar o estresse é fundamental. "Desde a gestação se pode prevenir a obesidade. Há pesquisas que mostram que quando tem um familiar obeso a chance de a criança se tornar obesa é de 40%. E quando ela tem dois familiares, aumenta para 80%. Por isso, é importante prestar atenção nos alimentos que se leva para dentro de casa e na forma como se relaciona com a comida”, afirma a especialista.
"Quando for necessário, vale procurar tratamento, pelo qual se busca uma redução racional do peso. A modificação dos hábitos de vida, como a mudança na alimentação e a prática de atividades físicas, não beber em excesso e não fumar são modos de prevenir a obesidade e as doenças relacionadas”, complementa o médico da Abeso.
Saúde pública - O excesso de peso e os transtornos psíquicos acometem cada vez mais indivíduos no mundo. Segundo dados de 2019 do Ministério da Saúde, apenas no Brasil, quase 56% da população estava com excesso de peso em 2018, sendo que a taxa de obesidade entre pessoas acima de 18 anos passou de cerca de 12%, em 2006, para próximo a 20%, em 2018, porcentagem próxima a da OCDE.
A obesidade é mais frequente na faixa etária de 18 a 24 anos e prevalece, pela primeira vez, nas mulheres (20,7%) em relação aos homens (18,7%). "As mulheres têm a questão hormonal e, atualmente, exercem diversas funções, fazendo com que o nível de estresse e a ansiedade sejam maiores”, explica Elaine.
A OMS (Organização Mundial da Saúde) considerava, em 2019, que, no Brasil, as mulheres eram as que mais sofriam com a ansiedade e depressão: perto de 8% eram ansiosas e 5%, deprimidas. Entre os homens, os números caiam para quase 4% nos dois problemas psíquicos. O país também era o mais ansioso – perto de 9% da população - da América Latina. Além disso, o número de indivíduos com depressão era de quase 6%.
A OCDE sugere que o excesso de peso é uma "séria ameaça” para a economia dos países, pois doenças crônicas associadas (como as cardiovasculares e o diabetes) reduzem a expectativa de vida da população e aumentam os gastos com saúde. Apenas no Brasil, o órgão internacional estima que, entre 2020 e 2050, a obesidade será responsável por reduzir em 5,5% o PIB (Produto Interno Bruto).
Dos 52 países avaliados pela OCDE, 50 possuem programas de saúde para combater a obesidade, mas o órgão recomenda que sejam ampliados os esforços. A médica Elaine reitera que "são necessárias políticas públicas em todos os níveis governamentais para conter a epidemia e ter mais acesso à informação de qualidade”.
"As políticas de combate à obesidade também precisam considerar mais as questões mentais. É fundamental, ainda, a atuação de outros atores sociais, especialmente a mídia, a indústria e as entidades científicas, para conscientizar a população e orientar sobre o tratamento adequado”, salienta o psiquiatra da Abeso.